Padronizar tamanho de roupas é possível, mostra estudo

O estudo constatou que é possível implementar um sistema padronizado que ofereça mais possibilidades de medidas de circunferência do corpo e altura.

Atire a primeira fita métrica quem nunca ficou confuso dentro de um provador ao se deparar com os tamanhos nada padronizados das roupas: o 40 de uma loja equivale ao 38 — ou até mesmo o 42 ou 44 — em outra. Foi a partir dessa constatação que a professora e designer de moda Júlia Coelho Brandão decidiu pesquisar o tema em sua dissertação de mestrado pela Escola de Artes, Ciências e Humanidades (EACH) da USP.

O estudo constatou que é possível implementar um sistema padronizado que ofereça mais possibilidades de medidas de circunferência do corpo e altura. “Uma sugestão é que esse sistema contemple os diversos tipos físicos existentes, que abranja, por exemplo, alturas iguais para pesos diferentes e pesos iguais para alturas distintas, englobe todas as faixas etárias, e os públicos masculino e feminino. Seria uma tabela mais ampla, com mais variações em dimensões de altura e largura do que temos atualmente”, aponta a pesquisadora, lembrando que as confecções não precisariam produzir roupas para todos os tipos corporais.

No entanto, Júlia também constatou que, apesar de haver um interesse na padronização de medidas do vestuário, há uma variação no grau do quanto esse sistema padronizado de medidas é desejável pelas empresas: muitas consideram a iniciativa boa; outras, nem tanto.

A pesquisadora também defende a abolição do uso de etiquetas com letras ou números para determinar o tamanho das roupas (como P, M, G ou 38, 40, 42). Isso porque eles geram problemas práticos pois deixaram de representar as medidas corporais e podem levar até a problemas psicológicos ao vincular tamanhos, como o 38, a um padrão de beleza. “As mulheres, principalmente, são pressionadas a estarem dentro desse padrão, e ele é estabelecido de forma a influenciar o consumo de produtos para o corpo através da destruição da auto-estima, se preciso”, diz. Em substituição, ela sugere o uso de algum recurso alternativo de medição.

Os dados estão na pesquisa Sistematizações de medidas de vestuário no Brasil: percepções e perspectivas, apresentada na EACH em 2015, sob a orientação do professor Luis Cláudio Portugal do Nascimento, da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) da USP.

Entrevistas

Júlia realizou entrevistas com 3 grupos de pessoas ligadas ao setor: 3 representantes de institutos como a Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), o Instituto Nacional de Tecnologia (INT) e o Senai Cetiqt; 3 especialistas e pesquisadores em antropometria e em design de moda; e 20 designers de moda atuantes em empresas de confecção, principalmente da cidade de São Paulo.

De acordo com a pesquisadora, na ABNT, existe o CB-17, um comitê que realiza estudos sobre medidas corporais ligadas ao vestuário. O INT realizou alguns estudos sobre o tema na década de 1970 e recentemente adquiriu um scanner a laser para realizar medições em pessoas. Já o Senai Cetiqt também faz pesquisas na área e realiza a coleta de medidas corporais por meio de um aparelho chamado body scanner.

A partir das entrevistas, Júlia constatou que a maioria é favorável à possibilidade de criação de uma tabela de medidas corporais padronizada. Porém, há diferentes nuances no quão desejável é este interesse.

O “P” que vira “M” ou “G”

Alguns dos grandes magazines, por exemplo, ou não têm interesse ou não se importam, pois utilizam tabelas próprias e são consolidadas no mercado. “As empresas que terceirizam parte da produção passam as tabelas de medidas para as confecções que costuram as peças e elas obedecem a orientação. Para algumas empresas trata-se de um diferencial no mercado, pois o consumidor sabe que se comprar uma calça 40 hoje e voltar na loja daqui a um ano, encontrará a mesma medida da calça comprada anteriormente”, explica.

Nas pequenas confecções, muitas não se importam com o tamanho da roupa que vendem e preferem não discutir o assunto. “Algumas vendem no atacado. E quando as peças ‘P’ acabam, elas simplesmente remarcam as peças ‘M’ e ‘G’ como se fossem ‘P”, relata.

Outras utilizam as medidas dos modelos de prova (pessoas cujas medidas corporais servem como referencial para o teste de caimento de roupas). “Se o modelo muda, mudam também as medidas das roupas”, relata. Há ainda o caso de lojas em que os modelos de prova são as próprias donas das confecções. O problema é que há muitas mulheres coreanas neste segmento e as medidas corporais são totalmente distintas das medidas das brasileiras, tanto na circunferência como na altura corporal.

Normas não-obrigatórias

Segundo a pesquisadora, o grupo CB-17 da ABNT já publicou uma norma para o vestuário infanto-juvenil e de bebês (NBR15800) que traz, inclusive, parâmetros de altura em um público que cresce muito. “Muitos consumidores começam a pedir e algumas empresas já estão oferecendo isso. As trocas diminuíram e zeraram em algumas lojas.”

Para o público masculino, Júlia conta que a ABNT já lançou a norma técnica NBR16060 que abarca os tipos corporais atlético, normal e especial. Esse tipo de tabela já pode ser observada em algumas lojas do Japão e Estados Unidos. “Lá pode-se encontrar roupas femininas do tipo petit, woman e pluz size”, informa. Segundo a pesquisadora, a ABNT também está fazendo uma norma técnica para o público feminino.

“Mas como é uma norma referencial, não há como obrigar a empresa a utilizar”, ressalta. “Seria preciso o desenvolvimento de políticas públicas que estimulem a construção de um amplo sistema padronizado, assim como a implementação, por parte das empresas de confecção, na adoção de uma padronização. Além da realização de ações educativas e de comunicação em instituições de ensino e também para a população em geral”, finaliza.

Valéria Dias / Agência USP de Notícias

Mais informações: email juliacoelho@usp.br, com a pesquisadora Julia Coelho Brandão

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