Angelina Martha, e a boa fama do funcionário público

Angelina é uma das muitas pessoas que fazem parte da memória viva da universidade, além de ser exemplo de eficiência e gentileza na pró-reitoria de graduação.

Ao passar a porta de vidro da sala da Pró-reitoria de Graduação, a equipe do USP Online é convidada por Sueli Cacilda de Oliveira, secretária da pró-reitora, a entrar.

Sentada em seu computador, a Assistente Técnica de Direção, Angelina Martha Chopard Gerhard, 65 anos, demonstra timidez com a chegada do fotógrafo. “Olha o que vocês me arrumam”, diz, aos risos, para as companheiras de trabalho – que indicaram seu nome para entrevista ao Gente da USP.

A indicação, porém, não foi aleatória. Com 28 anos de trabalho na USP – 17 só na PRG – Angelina é uma das muitas pessoas que fazem parte da memória viva da Universidade. “Já passei por muitos reitores, muitos pró-reitores e trabalhei em muitos projetos”, declara a jornalista de formação, que é a idealizadora do projeto Embaixadores da USP.

Formada pela Cásper Líbero, a funcionária conta que sempre teve um fascínio pela USP. “Fiz algumas matérias para a Folhinha, enfocando as profissões e já fui conhecendo muito da Universidade na década de 80, pouco antes de vir para cá. Sempre achei que seria muito bom trabalhar aqui”, declara.

A oportunidade de fazer parte da USP veio de forma inesperada, no Instituto de Matemática e Estatística (IME). “O IME tinha um convênio com a França, e eu falo francês, então o professor Caio Dantas, que na época era o diretor e já conhecia o meu trabalho, me chamou para trabalhar na secretaria da diretoria do IME ”.

Em 1995, com a escolha de Dantas para ocupar o cargo de pró-reitor de graduação, veio a oportunidade de trabalhar na reitoria. “No começo eu fiquei um pouco assustada. Quando trabalhamos em uma unidade, é só aquela unidade, conhecemos aquelas pessoas, aqueles colegas, o trabalho, os departamentos, nos envolvemos só com aquilo. Na Pró-reitoria não, é preciso se envolver com todas as unidades. Aqui é o ‘todo’ ” declara. Ainda assim, Angelina aceitou o convite. “Foi um desafio enorme, mas eu fiquei”.

“Se eu posso ajudar, eu ajudo. Se dá para fazer, eu vou atrás. O funcionário público em geral tem má fama. Dizem que nós trabalhamos pouco, atendemos mal, temos preguiça… Mas aqui sei que nós trabalhamos muito e procuramos fazer o nosso melhor sempre.” – Angelina Gerhard

O momento mais complicado para ela, porém, foi a incerteza após o final do mandato do professor Dantas na Pró-reitoria. “Eu não sabia se ia ser convidada para continuar”. Mas quando a pró-reitora Ada Grinover assumiu o cargo, a equipe não foi mudada “Agora já passaram vários [pró-reitores] e eu continuo aqui. Gosto do meu trabalho e sei que ele é importante para o todo que é a USP. Mas o mais importante é saber que a minha experiência, o meu trabalho e o que eu posso contribuir é valorizado”, declara contente.

Outro ponto destacado por Angelina no trabalho realizado na USP é a possibilidade de sempre aprender coisas novas. “Quando eu cheguei nem se falava em computador, a gente fazia o trabalho com máquina IBM elétrica. Quando nós recebemos os computadores, fomos atrás de cursos para aprender. A universidade nos contagia com as tecnologias novas, nós acompanhamos e nos atualizamos sempre”.

Envolvimento

Angelina é conhecida por conta do projeto Embaixadores, criado e coordenado por ela na PRG. Em 2006, com o início do InclUSP, sistema da USP que visa maior inclusão social, Angelina iniciou o programa no qual alunos da universidade que estudaram em escolas públicas vão até as escolas em que estudaram para dar palestras.

“Eu tenho muito orgulho dessa ideia. Ajuda a mostrar para alunos que às vezes nem sabem o que é a USP o que é a universidade e que eles também podem vir para cá”.

A próxima fase do projeto, já iniciada, é a expansão. “Nós estamos chamando todos os alunos e tivemos uma adesão de 1500 pessoas para visitar as escolas.” Além disso, os docentes já são convidados há dois anos, e neste ano também os alunos de pós-graduação. Angelina ressalta, porém, que os louros do sucesso do programa não devem ser conferidos apenas a ela.

“Você nunca faz sozinho, sempre tem uma equipe, e nós estamos sempre juntos”.

O programa de recepção dos calouros, que conta com campanhas propostas pelos próprios alunos, é segundo Angelina, outra ação gratificante de coordenar na pró-reitoria. “Temos muito contato com os alunos. Eles vêm até aqui trazer as idéias e as sugestões e também trabalhar no disque-trote para denunciar os trotes violentos”. Segundo ela, o programa de denúncias contra o trote violento, que funciona desde 1999 na USP, gera confusão entre os alunos de outras universidades no período de recepção aos calouros. “Quando sai na mídia, nós recebemos ligações de todo o país denunciando os trotes, e somos obrigados a dizer que é um serviço só da USP”, diz Angelina, que atesta que o número de ligações denunciando trotes violentos na Universidade têm caído continuamente.

“Criamos a cultura de que quem quer brincar, brinca, quem não quer, não brinca, e acho que isso se deve justamente à Semana de Recepção”.

Outro destaque do trabalho realizado por Angelina é o envolvimento com os problemas dos alunos e sua solicitude na resolução. “Se eu posso ajudar, eu ajudo. Se dá para fazer, eu vou atrás. O funcionário público em geral tem má fama. Dizem que nós trabalhamos pouco, atendemos mal, temos preguiça… Mas aqui sei que nós trabalhamos muito e procuramos fazer o nosso melhor sempre”, atesta.

No início dos anos 2000, quando uma mulher, vinda do oeste do Paraná para fazer a revalidação do diploma, trouxe no último dia a documentação necessária para a secretaria geral esquecendo de um histórico escolar do ensino fundamental. Na Secretaria Geral o pedido foi negado, e o caso veio para as mãos de Angelina.

“Emprestei um telefone para a moça e ela conseguiu através de um telefonema mobilizar a cidade inteira: ligou na farmácia para chamar a diretora do colégio, a diretora abriu a escola para pegar o comprovante e mandou por fax”, conta a servidora, que conseguiu que a Secretaria Geral desse andamento ao pedido apesar do prazo terminado.

Outro caso emblemático contado pela funcionária envolveu uma mãe superprotetora que foi até a Pró-reitoria de graduação saber de seu filho. “Ela chegou dizendo que no colegial ela sabia de tudo do filho dela: onde ele estava, o que ele fazia, e agora ela não sabia de nada e estava desesperada. Ela chegou a me contar que pulou o muro do Cepeusp para ver se o filho dela realmente estava jogando futebol”, conta aos risos Angelina. “Eu falei para ela que a USP é uma universidade séria, a maior do país, e que ela deveria ficar tranquila com o filho”.

Entre os hobbies da funcionária, estão passear a pé pela Rua do Matão, seu local preferido da Cidade Universitária, e visitar os museus do campus. Mas os maiores são ler e escrever. Ela escreveu um livro sobre a história de vida de sua mãe. “Ela era uma pessoa muito culta, achava que nós tínhamos que estudar, que só através do estudo nós poderíamos alcançar as coisas,”, conta Angelina, e diz que o livro, apesar de estar à venda, foi feito apenas para a memória da família. “Foi maravilhoso escrever sabendo que vou deixar para os meus netos. Hoje fala-se muito pouco no passado das coisas. Acho que devemos deixar as nossas histórias registradas”.

Que pelo menos parte da história desta boa servidora da USP fique, então, registrada aqui.

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Angelina  é Gente da USP, e por isso aparece na editoria do USP Online que apresenta quinzenalmente personagens  interessantes que transitam pela Cidade Universitária e campi do interior. Mande sua sugestão de entrevistas para usponline@usp.br. 

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