Observatório da ECA mapeará censura e liberdade de expressão na mídia

Objetivo é mapear o que está sendo noticiado a respeito de liberdade de expressão e de censura no mundo e pautar um fórum de discussão sobre esses temas na sociedade.

A Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP inaugurou em agosto, com o apoio da Pró-Reitoria de Pesquisa (PRP), o Observatório em Comunicação, Liberdade de Expressão e Censura (Obcom).

Resultado de 10 anos de pesquisa do antigo Núcleo de Pesquisa em Comunicação e Censura (Npcc), o Obcom surgiu com o objetivo de mapear, através de noticias, entrevistas, debates e depoimentos, o que está sendo noticiado a respeito de liberdade de expressão e de censura no mundo.

O antigo núcleo já tinha em sua disposição o Arquivo Miroel Silveira, sob guarda da biblioteca da ECA, com mais de 6 mil processos de censura prévia ao teatro de 1930 a 1970. Agora, ele será incorporado ao Obcom, que pretende criar um banco de dados mais amplo que reúna notícias do mundo inteiro, em português, inglês e espanhol, além de pautar um fórum de discussão sobre esses temas na sociedade.

“Durantes esses anos de pesquisa, houve uma mudança muito grande no cenário dos meios de comunicação. Então decidimos que era a hora de trabalhar a censura hoje, como, aonde e de que forma está ocorrendo, focando também na questão da liberdade de expressão”, conta a professora Maria Cristina Costa, coordenadora do Obcom.

Censura indireta

Após longos anos da imposição da censura prévia no Brasil, a promulgação da Constituição Brasileira de 1988 extinguiu a censura oficial do governo, tornando a expressão intelectual, artística, científica e de comunicação um direito fundamental de todos os cidadãos.

Mas o que essa extinção significou realmente para a sociedade? Ainda existe censura hoje? Para a professora Maria Cristina, “com o fim da censura oficial, o que houve foi o aparecimento de outras formas de controle da comunicação e da produção artística, que são controles indiretos e mais distantes do Estado”. Ela cita como exemplo os interesses comerciais das grandes empresas, os patrocinadores e anunciantes e as leis de incentivo à área sociocultural.

Segundo ela, é esse controle indireto que motivou a criação do Observatório, juntamente com a falta de registros sobre essa “censura moderna”. Atualmente, com novos atores participando desse controle, a censura não está sendo registrada em nenhum lugar. “Acreditamos que não tem havido um ambiente adequado para esse debate, e a universidade é um espaço legítimo para isso justamente porque ela não é uma instância do poder”, afirma Maria Cristina.

Com o fim da censura oficial, o que houve
foi o aparecimento de outras formas de
controle, indiretos e mais distantes do Estado.

Para Mateus Marcel Netzel, um dos graduandos do núcleo de pesquisa, “a pesquisa sobre censura oferece uma divulgação de informações sobre obras culturais a que não se tinha acesso, um maior conhecimento sobre as diferentes formas de censura que já ocorreram, como o Estado trabalhava para cercear a produção cultural e quais são as manifestações atuais da censura no Brasil, ajudando a entender os valores morais da sociedade brasileira ao longo do tempo”.

Liberdade de expressão

A inexistência de orgãos regulatórios também estimulou a discussão sobre a liberdade de expressão nas últimas décadas, trazendo um questionamento sobre seus limites e condições. Para Cristina, “se por um lado as pessoas hoje não admitiriam um orgão de censura, por outro acham que os meios de comunicação tem liberdade demais”.

Ela argumenta que hoje vivemos uma época muito ambígua, em que a direita se apropriou do conceito de liberdade de expressão como livre mercado da informação, e não o direito à informação e a pluralidade de pontos de vista. Ao mesmo tempo, os partidos e pensadores de esquerda consideram necessário que haja um marco regulatório, uma agência que não pertence ao Estado e possa regular os meios de comunicação. “Imediatamente isso é chamado de censura, quando em muitos países esses orgãos funcionam muito bem, evitam o monopólio e defendem o jornalista”, diz.

Imediatamente isso é chamado de censura, quando
em muitos países esses orgãos funcionam muito bem,
evitam o monopólio e defendem o jornalista.

Essas e outras questões serão pesquisadas e debatidas com o intuito de criar um local propício para o debate. “Queremos colocar isso em discussão, defender o pluralismo e o direito à informação, que consideramos um bem público”, afirma ela.

Hemeroteca

O Obcom agrega alunos da gradução e da pós graduação que realizam pesquisas sobre comunicação e censura no Brasil, e é composto também por um comitê científico. Os graduandos, além de suas pesquisas, terão a tarefa de buscar as notícias que tratem de censura e liberdade de expressão na mídia, enquanto os pós-doutorandos irão fazer uma seleção atribuindo notas de relevância.

O comitê científico é formado por professores de várias unidades da USP, que farão análises das notícias divididos entre os campos das artes, literatura, gênero, feminismo, opinião pública, humor, infância e direitos humanos, negros, processos judiciais, classificação etária, mundo do trabalho e América Latina.

“Temos uma visão multidisciplinar e pretendemos pautar a discussão a respeito da liberdade de expressão e censura na sociedade. Não pensamos na ciência apenas como atividade acadêmica, mas como uma responsabilidade social”, completa Cristina.

Os dados ficarão disponíveis em uma hemeroteca, no endereço www.eca.usp.br/npcc, com previsão de funcionamento para o ano que vem. Serão realizadas também parcerias com outras instituições para que elas possam contribuir com o site.

Posteriormente, pretende-se realizar um Simpósio para apresentar essas análises e produzir um Caderno sobre liberdade de expressão e censura.

Mais informações: www.cca.eca.usp.br

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