Revelação da orientação sexual tem relação com violência

Segundo psicólogo a revelação é ainda mais difícil para aqueles que já sofrem algum outro tipo de preconceito na sociedade, como os negros.

Lara Deus / Agência USP de Notícias

Revelar a orientação sexual pode significar sofrer mais violência física, verbal e ameaças, no caso dos homens que fazem sexo com outros homens. Os locais em que eles mais se sentem discriminados são nos ambientes religiosos, na escola ou faculdade, nos círculos sociais próximos como amigos e vizinhos e no contexto familiar. Segundo o psicólogo Luiz Fabio Alves de Deus, autor da pesquisa na Faculdade de Saúde Pública (FSP) da USP que estudou o assunto, a revelação é ainda mais difícil para aqueles que já sofrem algum outro tipo de preconceito na sociedade, como os negros.

Quase três quartos dos entrevistados que tinham a orientação sexual revelada em vários contextos já vivenciaram agressões verbais em decorrência de sua sexualidade. Esta também foi motivo para que 21% destes homens que fazem sexo com homens terem sofrido violência física. Dos entrevistados, 42% receberam ameaças de agressão por não seguirem os padrões da heteronormatividade. A pesquisa ainda constatou que, assim como a violência, a discriminação era maior quanto mais assumida a sexualidade estava.

Dos círculos sociais frequentados, os amigos eram os que mais sabiam sobre a orientação sexual, seguidos pelos funcionários dos serviços de saúde. Logo após, a família é o terceiro ambiente em que mais assume-se a sexualidade e depois vêm o trabalho e a escola. O motivo talvez esteja na discriminação, que foi elevada também nestes dois últimos contextos. “Dos que se revelaram em todos eles, 17% sofreram discriminação no ambiente de trabalho, sendo que, de quem nunca explicitou a ninguém, o percentual de discriminação é nulo”, explica o psicólogo.

“Com estes resultados, não estamos propondo que as pessoas permaneçam no armário”, esclarece o pesquisador. “Estamos querendo chamar a atenção para o fato de que a discriminação e a violência estão amplamente naturalizadas e são vivenciadas cotidianamente pela população não heterossexual em todos os contextos sociais em que circulam. Gostaríamos que estes resultados pudessem sensibilizar, principalmente, os formuladores de políticas públicas, gestores, profissionais que atuam na ponta dos serviços, educadores, dentre outros, para as implicações da exclusão e das violências sistemáticas aos quais esta parcela da população está exposta, que em última instância impacta nas condições de saúde, na escolarização, na marginalização e na não cidadania destas pessoas”, observa.

Dados do estudo mostram que os jovens com até 30 anos têm mais tendência a revelar a orientação sexual. O pesquisador atribui isso ao fato de que os mais velhos amadureceram em uma época em que comportamentos sexuais diferentes da heterossexualidade eram menos aceitos. Além disto, ele também constatou que, proporcionalmente, os negros assumiam-se menos. “Para aquelas pessoas que já são discriminadas por outra característica, como a cor da pele, talvez seja muito mais difícil fazer a revelação da orientação sexual porque revelar-se gay ou lésbica é adicionar mais uma situação de discriminação àquelas que elas já vivenciam”, explica.

SampaCentro

Os dados da dissertação de mestrado eram parte daqueles coletados em um projeto chamado SampaCentro, do qual o psicólogo participou. A pesquisa buscava obter informações sobre o comportamento e práticas sexuais de gays e prevalência de infecção por HIV e outras DSTs entre homens que fazem sexo com homens. Ela foi realizada em 2012 pela Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo, em parceria com o Centro de Referência e Treinamento DST/AIDS, e apoiada pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp). Além dos números sobre a violência e a discriminação, o estudo constatou uma alta prevalência de HIV e outras doenças sexualmente transmissíveis na população estudada.

Depois da pesquisa, os organizadores estabeleceram diálogos com representantes da sociedade civil organizada, dos programas municipal e estadual de DST/Aids e também com pesquisadores da área, para discutir os resultados e pensar no impacto da divulgação. “Era, e é ainda, uma preocupação dos pesquisadores envolvidos no estudo, que os resultados orientem políticas públicas e ações das organizações da sociedade civil que possam melhorar as questões de saúde desta população”, conta o psicólogo.

Orientado pela professora do Instituto de Psicologia (IP) da USP Vera Paiva, a dissertação de mestrado Contextos de revelação da orientação sexual: no final do arco-íris tem um pote de ouro? foi defendida em março de 2013 na FSP.

Mais informações: email luiz.deus@usp.br

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