Mapear efeitos da cocaína no cérebro pode ajudar dependentes, mostra estudo do ICB

Pesquisa realizada no ICB, por Maria Cristina V.R. Maluf, procura entender as diferenças do efeito das drogas no cérebro de adultos e adolescentes para se obter um melhor tratamento.

Thiago Minami, especial para a Agência USP

O tratamento da dependência química em adolescentes pode requerer artifícios diferentes dos utilizados em adultos. Os cérebros deles, mais suscetíveis aos efeitos da droga, sofrem danos distintos nas vias neuroquímicas. Para entender como isso funciona, uma pesquisa do Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) da USP mapeou a ação de duas proteínas no sistema nervoso de camundongos adultos e adolescentes submetidos a injeções de cocaína. “Sabendo os efeitos que são provocados, podemos pensar em formas de bloquear e reverter o processo”, explica a autora, Maria Cristina V.R. Maluf, graduada em farmácia-bioquímica pela mesma Universidade.

O trabalho integra as pesquisas desenvolvidas no Laboratório de Neuroquimica e Farmacologia Comportamental, liderado pela professora Rosana Camarini, que tem entre os objetivos entender os efeitos das drogas nas funções neuroquímicas dos adolescentes. Por enquanto, as pesquisas restringem-se a álcool (etanol) e cocaína.

Em sua pesquisa, Maria Cristina separou diferentes grupos de camundongos. Um deles recebeu injeções diárias de cocaína por oito dias. Passaram depois por um período de abstinência de dez dias, para então receber uma nova injeção. “Esse procedimento é realizado para avaliar a sensibilização locomotora – ao final desse período, o animal passa a se movimentar mais, indicando que o sistema nervoso sofreu alterações induzidas pela droga. São essas alterações, aliás, que permeiam os mecanismos da dependência. Com a aplicação seguinte à abstinência, os roedores foram mais afetados que na primeira vez. E a análise bioquímica do cérebro mostrou que, entre eles, os adolescentes foram os que se mostraram mais suscetíveis.

“O período de abstinência é necessário para avaliar os esforços que o cérebro faz para se contrapor aos efeitos produzidos pela retirada da droga, na tentativa de restaurar o equilíbrio”, explica Maria Cristina. Ao usar drogas, o organismo encontra um equilíbrio fora do normal, influenciado pela ação das substâncias. Durante a abstinência, chega um terceiro estado de equilíbrio, que também é incomum. É aí que o ex-usuário, mesmo depois de passar anos sem drogas, encontra-se suscetível a buscá-las novamente mediante estímulos mínimos. “Nosso objetivo é entender o que se passa nessa etapa e tentar reverter o quadro”, diz Maria Cristina.

Condicionamento ao ambiente

Além de mais propensos à dependência, adolescentes também têm respostas mais expressivas ao chamado “condicionamento ao ambiente”. O cérebro associa os efeitos da droga a certas pistas – pode ser o local onde costumava-se fazer a aplicação ou mesmo a imagem de objetos usados para facilitar o consumo. Na pesquisa, os camundongos sofreram alterações no comportamento só de serem expostos ao ambiente em que haviam recebido as injeções de cocaína e, dentre eles, os adolescentes foram os mais suscetíveis. “É possível que o efeito esteja relacionado a uma maior expectativa desse grupo em receber a droga”, conta a pesquisadora.

Estudos do laboratório mostraram também que o estresse potencializa os efeitos negativos da droga. Animais submetidos a situações de pressão tiveram respostas parecidas ao receber álcool pela primeira vez em comparação aos que passaram por uma sequência de aplicações.

Outro tópico de estudo do laboratório, também voltado à recuperação de dependentes, é o enriquecimento ambiental. O animal, após receber injeção de álcool, é mantido na sua caixa padrão de moradia, um espaço sem estímulos. É então transferido a um ambiente com mais estímulos, como brinquedos e itens para exercício físico. Após um período de tempo, os pesquisadores verificaram a diminuição dos efeitos da droga tanto no comportamento quanto na parte neuroquímica.

Mais informações: email cris.valzachi@gmail.com, com Maria Cristina V. R. Maluf 

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