Núcleo quer publicar dicionário etimológico da língua portuguesa

De acordo com os pesquisadores do NEHiL, o português é a única língua europeia que não tem um dicionário etimológico nos padrões exigidos pela linguística moderna.
Foto: Marcos Santos / USP Imagens
Foto: Marcos Santos / USP Imagens
Retrodatação e Metaplasmador são projetos de programação que estão sendo usados na elaboração do DELPo, o dicionário

Proposto em 2012, e ativo desde 2013, o Núcleo de Apoio à Pesquisa (NAP) em Etimologia e História da Língua Portuguesa (NEHiLP), ligado à Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP, tem uma missão ambiciosa: capitanear a construção do primeiro dicionário etimológico da língua portuguesa com metodologia científica.

Se para Fernando Pessoa, o português era sua pátria, para os nove países que adotam o idioma como oficial, a afirmação poética também é uma verdade. Com origens no século 12, o português evoluiu agregando diferentes sons e sentidos a cada uma de suas palavras através do tempo e das distâncias. É papel da etimologia estudar a história e origem das palavras, assim como a explicação de seus significados por meio da análise dos elementos que as constituem.

À frente do Núcleo desde sua criação, o professor Mario Eduardo Viaro, do Departamento de Letras Clássicas e Vernáculas da FFLCH, é responsável por coordenar um grande grupo de pesquisadores que não estão apenas ligados aos departamentos de Letras, como também a outras faculdades dentro e fora da USP. “Nossa abordagem é histórica”, explica ele, “mas nosso núcleo é interinstitucional. Temos pesquisadores da EACH [Escola de Artes, Ciências e Humanidades] e até mesmo do Museu de Zoologia. Um dos nossos projetos principais é um programa criado pelos especialistas do IME [Instituto de Matemática e Estatística]”.

Especialistas em história antiga e moderna, em estruturas linguísticas e em teorias de reconstrução linguística são alguns dos principais membros do NEHiLP, e eles surgem de várias partes do planeta. “Há pouca gente do mundo que trabalha com questões de etimologia. Então todos conhecem todo mundo”, conta o professor. “Temos pessoas da Espanha, Portugal e Alemanha. O único especialista em etimologia árabe do mundo também faz parte do nosso grupo”.

Objetos de estudo

Foto: Arquivo Pessoal
Foto: Arquivo Pessoal
Professor Mario Viaro: abordagem histórica das palavras

Para se analisar a etimologia de um idioma são utilizados documentos antigos e atuais. O processo envolve organizar a informação linguística que permite gerar dados de qualidade para a consulta tanto de especialistas em linguística como de outros setores da sociedade que se interessem por etimologia. Entre eles estão jornalistas e cientistas das mais variadas áreas.

Dentre os muitos projetos do Núcleo, o professor destaca o maior deles, a construção do DELPo. “O português é a única língua europeia que não tem um dicionário etimológico nos padrões exigidos pela linguística moderna”, argumenta. De acordo com Viaro, “só é possível fazer etimologia sabendo quando a palavra surgiu e por isso criamos um programa que, quando alimentado, vai retrodatando as palavras”. O processo, sempre comandado por um especialista, envolve a elaboração de fichas e a criação de verbetes.

Para elaborar o dicionário, o Núcleo conta com dois projetos principais de programação. O primeiro faz a chamada Retrodatação, que investiga a datação mais antiga de uma palavra à busca do seu étimo e o de suas acepções. O segundo é o Metaplasmador, que, nas palavras do docente, “é um programa que vai testar se a etimologia é compatível com as chamadas leis fonéticas ou requer explicação extra”. O programa foi criado para ser utilizado por iniciantes da área que precisam basear suas pesquisas em regras hoje pouco conhecidas (as chamadas leis fonéticas), que formam o primeiro passo para a investigação de uma etimologia científica. O programa funcionará com a inserção de uma palavra em Latim e será capaz de prever o caminho “regular” da evolução dessa palavra. “Quando o caminho não é regular, a palavra precisa de uma explicação e é aí que entra nosso trabalho”.

Quando o caminho não é regular, a palavra precisa de uma explicação e é aí que entra nosso trabalho.

No momento, apenas pesquisadores possuem acesso ao programa, mas os planos do Núcleo envolvem a criação de duas versões, uma delas acessível a qualquer pessoa que seja um interessado no assunto. O NEHiLP contará com a ajuda de voluntários que não são credenciados como especialistas, mas têm grande interesse na área. “Qualquer um que gosta desse assunto pode entrar em contato. E não necessariamente precisam ser do mundo acadêmico. Eles podem vir a fazer parte do grupo, mas necessitarão fazer um curso e serão avaliados antes”, esclarece Viaro. “O assunto atrai muita gente, mas temos a preocupação com a etimologia científica”.

A previsão para que o programa seja disponibilizado para todos é até o final deste ano. Os interessados podem obter informações sobre seu funcionamento no manual dentro do site oficial do Núcleo.

Resultados no papel

Foto: Marcos Santos / USP Imagens
Foto: Marcos Santos / USP Imagens

Já existem quatro publicações oficiais produzidas pelo Arquivo do NEHiLP. “É uma série bibliográfica. Até o final do ano haverá mais três publicações”, pontua o professor. No site é possível encontrar também informações sobre livros elaborados por membros do Núcleo que discorrem sobre diversos assuntos referentes ao estudo etimológico.

Além delas, o Núcleo promove eventos em parceria com o Grupo de Morfologia Histórica do Português. “A Morfologia Histórica é um estudo especifico, toda língua tem uma morfologia, isto é, classes gramaticais, substantivos, artigos etc. O grupo até agora tem estudado sobretudo a história dos sufixos”, esclarece.

“No grupo de Morfologia Histórica sentimos a necessidade de nos aprofundar na história das palavras e uma etimologia bem feita seria a solução. O Núcleo nasceu inicialmente para suprir essa necessidade”, finaliza Viaro.

Mais informações: email nehilp@usp.br

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