7 – Um dia de festa

O caderno Filho da rua, encartado pelo diário Zero Hora, do Rio Grande do Sul, em sua edição do domingo 17 de junho de 2012, traz a história de um jovem viciado em drogas, acompanhada e narrada pela repórter Letícia Duarte.

Sempre houve pedras no caminho, mas há também lugar para festa. Em fevereiro, Felipe completou 15 anos de idade. “Durante os três anos de apuração da reportagem Filho da rua, a frase de uma conselheira tutelar me marcou: ‘Nesse ritmo, ele pode não chegar aos 15 anos’. Pois hoje chegou o dia. Felipe completou 15 anos! Uma data simbólica, celebrada com bolo, parabéns pra você e lágrimas de emoção na Vila do Esqueleto. Felizmente, Felipe estava em casa, perto da mãe. Ele continua vulnerável, exposto a riscos e ameaças. Mas hoje foi um dia muito feliz. Está sendo”, escreveu a jornalista em sua página no Facebook no dia da festa.

Foi Letícia quem levou o bolo e os salgadinhos à Vila do Esqueleto. Durante a apuração, ela se questionou muitas vezes sobre até que ponto poderia ir sua relação com o guri. “Uma matéria como essa coloca à prova os princípios de não-envolvimento, porque a gente não faz um trabalho assim se não tiver um vínculo”, argumenta.

Quando a repórter se encontrou com Felipe pela primeira vez depois da publicação do caderno, o guri a abraçou muito e disse que ela era uma das únicas pessoas a se importar com ele. “Eu era alguém que se interessava genuinamente em ouvir a história, sem julgar, e isso para ele já tinha muito valor. Psicólogos que trabalham com crianças de rua me disseram que, como elas têm poucos vínculos e eu já estava ali o acompanhando há três anos, virei uma pessoa de referência”, conta.

Talvez mais do que ninguém, ela sabe que Felipe continua no fio da navalha. “São muito frágeis os vínculos que o protegem”, reconhece a jornalista, a cidadã, a amiga que se importa. “Parece que ele está melhor do que já esteve, mais longe das ruas e das drogas. Mas isso tudo é tão precário que a impressão que eu tenho é que tudo pode recomeçar em breve”, lamenta. O que mais a preocupa é que no final do ano passado o guri teve uma nova briga feia com o padrasto, que o jurou de morte. Letícia avisou o pessoal da Ação Rua (da Prefeitura de Porto Alegre) e do governo do Estado, e ouviu promessas de que ele receberia medidas de segurança.

No dia da festa, antes que Felipe assoprasse as velas, Letícia lhe disse para fazer um pedido. Em silêncio, ele fez. Depois, chorou abraçado à mãe.

Primeira | Anterior | Próxima

Scroll to top