Extrato inibe enzima ligada a reprodução da Leishmania, revela pesquisa da FZEA

Uma pesquisa da Faculdade de Zootecnia e Engenharia de Alimentos da USP produziu um extrato cítrico que barra a ação de uma enzima envolvida no metabolismo e reprodução do protozoário da leishmaniose.

Júlio Bernardes / Agência USP de Notícias

Na Faculdade de Zootecnia e Engenharia de Alimentos (FZEA) da USP, em Pirassununga, pesquisa mostra que o extrato supercrítico da semente de pitanga (obtido com adição de solvente em condições críticas de temperatura e pressão, formando um gás, depois convertido em líquido)  inibe a atividade da enzima arginase, associada ao metabolismo e a reprodução da Leishmania amazonensis, protozoário causador da leishmaniose. As sementes são um resíduo não aproveitado pela indústria de alimentos e correspondem a 31% do peso total da fruta. O extrato poderá ser utilizado na produção de fármacos contra a leishmaniose, doença que atinge a população de países tropicais e subtropicais.

A arginase permite a Leishmania produzir uma substância antioxidante (tripanotiona)  que neutraliza o óxido nítrico e outros radicais livres produzidos pelos macrófagos, células de defesa do organismo de animais e seres humanos. “Os protozoários, na forma promastigota (etapa do ciclo evolutivo), invadem os macrófagos para se reproduzirem”, diz a tecnóloga de alimentos Débora Nascimento e Santos, que realizou a pesquisa. “Os macrófagos, como defesa, produzem substâncias que eliminam a Leishmania, as quais são neutralizadas indiretamente pela atividade da arginase”.

Na pesquisa, para a obtenção da enzima no protozoário, o gene responsável pela produção da arginase foi isolado e amplificado em reação em cadeia de polimerase (PCR), adicionado a um organismo vetor, neste caso, a E. coli BL21 como plasmídio (micro-organismo que carrega o gene). “A enzima proveniente da Leishmania foi purificada por técnicas de cromatografia e o composto obtido foi então usado para teste de inibição da arginase”, conta o professor Edson Roberto da Silva, da FZEA, responsável pelo desenvolvimento da metodologia.

O experimento consistiu em adicionar em meio de reação enzimática quantidades definidas do extrato supercrítico de semente de pitanga, de arginase e arginina (substrato da enzima arginase). “Quando um composto presente no extrato inativa a arginase, menor será a metabolização da arginina”, aponta o professor. “A inibição da arginase é medida por espetrofotometria em comparação com um experimento de controle sem a presença do extrato”.

Ação antimicrobiana

A pesquisa também verificou no extrato a ação antioxidante e antimicrobiana, além de fazer a identificação de compostos voláteis e dos compostos fenólicos totais, entre outros. “A atividade antimicrobiana também apresentou excelentes resultados”, ressalta Débora. “Com esses resultados em mãos, agora é possível caminhar no sentido de chegar ao grupo de substâncias que exercem bioatividade no extrato supercrítico”.

Para obter o extrato da semente de pitanga foram utilizados dois processos não convencionais de extração. O primeiro, realizado na França, utilizou solvente pressurizado (etanol), que permite maior rendimento de extrato em um menor período de tempo. O segundo, adotado nos experimentos feitos no Brasil, utilizou fluído supercrítico, com temperatura e pressão acima do nível crítico. “A substância utilizada foi o dióxido de carbono (CO2), que tem a vantagem de ser ambientalmente disponível, reconhecido como seguro e ter baixa toxicidade”, diz a tecnóloga. “Ele não requer etapas posteriores de separação do extrato e possui baixos níveis de temperatura e pressão crítica, facilitando o processo e reduzindo os custos de extração”.

Quanto a possível utilização do extrato na produção de fármacos, Débora aponta que é cada vez mais frequente o lançamento de medicamentos a partir de produtos naturais, mas entraves como custo elevado e dificuldade de purificação ainda são fatores que limitam essa alternativa em relação aos fármacos sintéticos. “Partindo de um extrato natural sem solvente como é o caso do extrato supercrítico até o medicamento final, testes de letalidade, toxicidade aguda e crônica, estabilidade e vida útil deveriam ser realizados”, ressalta. “Tudo isso em parceria com pesquisadores dessas áreas de estudo”.

A coordenadora do projeto é a professora Alessandra Lopes de Oliveira, da FZEA, que montou o equipamento de extração com CO2 supercrítico. A pesquisa tem apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp). O experimento com o extrato foi realizado no Laboratório de Imunologia e Parasitologia da FZEA, sob a supervisão do professor Edson Roberto da Silva. “O grupo de pesquisa do professor desenvolveu e padronizou a metodologia, sendo o primeiro a caracterizar a arginase presente na Leishmania”, conclui a tecnóloga.

Mais informações: (11) 3561-4280; email tecnologadebora@gmail.com, com Debora Nascimento e Santos

  

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