Ninguém via Alexandre Vannucchi Leme desde a manhã da sexta-feira. No sábado, veteranos e calouros confraternizavam nas festas organizadas para recepção dos alunos que chegavam à USP naquele 1973 em que muitas unidades ainda funcionavam nos chamados barracões da Cidade Universitária.
A alegria começa a acabar quando chega a notícia:
– O Minhoca caiu.
O verbo, todos entendem, significa ser preso pela repressão.
Os colegas percorrem os barracões atrás de notícias. Ninguém sabe do Minhoca.
Preso no dia 16 de março, o estudante é levado à sede do Destacamento de Operações de Informações – Comando de Operações de Defesa Interna (DOI-Codi), na rua Tomás Carvalhal, quase esquina com a rua Tutoia, onde passa por várias sessões de “interrogatório” – eufemismo para espancamento e tortura.
No sábado 17, por volta do meio-dia, os colegas de cárcere veem Alexandre voltar de uma sessão, carregado pelos carcereiros, mas ainda assim gritando seu nome para que todos ouvissem. Também o ouvem dar gritos altos no início da tarde, mas eles vão diminuindo de intensidade com o passar do tempo.
Mais ou menos às cinco da tarde, um carcereiro abre o cubículo em que o estudante jaz para levá-lo a novo suplício.
O agente toma um susto.
Alexandre está morto.
Os outros presos recebem ordem de ficar no fundo das celas para não ver o que se segue. Cinco policiais são chamados. Um deles usa uma lâmina para cortar o pescoço de Alexandre de orelha a orelha. O corpo é arrastado pelo chão, deixando sangue por todo o caminho, e é levado ao Instituto Médico Legal.
Final da tarde do dia 17 de março de 1973. O estudante de Geologia da USP Alexandre Vannucchi Leme, de 22 anos, aprovado em primeiro lugar em sua turma no vestibular de 1970 – o Lê, nascido filho de seu José e dona Egle numa tradicional família católica de Sorocaba; o Minhoca, apelido dado pelos amigos a ele, que tanto gostava de colocar apelidos nos outros –, acaba de ser assassinado pela ditadura militar brasileira.