Linhagem transgênica auxilia a combater mosquito da dengue

Modificações em genes específicos dos mosquitos fazem com que ovos postos no meio ambiente, gerados do cruzamento entre os transgênicos e fêmeas selvagens, herdem um gene letal que impede seu desenvolvimento até a fase adulta.

Bruna Romão / Agência USP de Notícias

A liberação de machos do mosquito Aedes aegypti geneticamente modificados é uma técnica eficiente para o combate ao inseto selvagem, transmissor da dengue. Entre outubro 2011 e setembro 2012, o Projeto Aedes Transgênico (PAT), realizado em convênio entre o Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) da USP e a biofábrica Moscamed Brasil, soltou cerca de 17 milhões de mosquitos transgênicos em dois bairros do município de Juazeiro, Bahia, levando a população selvagem do inseto à supressão. “A ideia é que, se conseguimos diminuir a população do mosquito, consequentemente se conseguirá diminuir a transmissão da doença”, conta a pesquisadora do ICB Margareth de Lara Capurro, coordenadora do PAT.

Este ano foi iniciada uma nova etapa do projeto, agora na cidade baiana de Jacobina, onde serão liberados aproximadamente 4 milhões de mosquitos por semana, durante os próximos três anos, para o combate à dengue. “Esse é um projeto pioneiro no mundo. Em nenhum outro lugar foi feita uma liberação de mosquitos transgênicos desse tamanho”, relata Margareth. A linhagem de insetos utilizada foi desenvolvida por cientistas britânicos da empresa Oxitec, parceira do projeto, e é prouzida na Unidade de Produção de Aedes Transgênico da Moscamed, em Juazeiro, hoje com uma produção semanal de aproximadamente 1 milhão de machos.

Gene letal

Devido a modificações em genes específicos dos mosquitos, os ovos postos no meio ambiente, gerados do cruzamento entre os transgênicos e fêmeas selvagens, herdam um gene letal que os impede de se desenvolver até a fase adulta. Segundo o biólogo Danilo de Oliveira Carvalho, que também participa do projeto e cujo mestrado integrou o trabalho, o gene responsável pela mortalidade das larvas e pupas tem seu funcionamento condicionado à presença ou ausência de um tipo de antibiótico chamado tetraciclina.

Na ausência da substância o gene é ativado e produz uma proteína que modifica as taxas de síntese proteica (a transcrição seguida da tradução) das células da larva, acumulando-se e levando-a à morte. Por sua vez, quando há a tetraciclina esse processo é bloqueado. “A larva deixa de acumular o ativador e se desenvolve”, diz Carvalho. É o que acontece quando essa linhagem de mosquitos é produzida de forma controlada em laboratório.

Juazeiro

A primeira etapa do PAT, em Juazeiro, aconteceu nas comunidades de Itaberaba, Mandacaru, Campo dos Cavalos, Maniçoba e Carnaíba do Sertão, por aconselhamento da Secretaria da Saúde da cidade. A escolha foi feita em função do tamanho das populações selvagens do Aedes aegypti nesses locais, além de questões geográficas, como certo isolamento, para que não houvesse interferências como migrações dos insetos, o que poderia prejudicar as medições dos resultados das liberações.

Após um período de esclarecimento da população local sobre a ação e de testes iniciais para verificar a dispersão e capacidade de reprodução dos transgênicos, passaram a ser liberados cerca de 500 mil machos por semana. Antes da liberação, a média do índice populacional do mosquito selvagem era de 40%, medido a partir de armadilhas, chamadas ovitrampas, que atraem o inseto. Após seis meses de liberação, a taxa caiu para 6%. No entanto, Danilo conta que após o término das liberações a população selvagem voltou a subir, embora o novo índice ainda não tenha sido calculado. “Isso indica que temos que manter liberações em níveis basais para manter a população baixa”, diz.

Jacobina

Por indicação da Secretaria da Saúde do Estado da Bahia, Jacobina foi escolhida para a segunda fase do PAT. Com cerca de 49 mil habitantes na área urbana, a cidade teve um grande surto de dengue em 2011 com 2 mortes e mais de 1.600 casos identificados da doença. A primeira liberação de mosquitos transgênicos no município de Jacobina aconteceu no dia 18 de junho deste ano. Segundo Margareth, as liberações serão divididas em áreas. Diferentemente da experiência anterior em Juazeiro, as etapas iniciais acontecerão em áreas com menores populações selvagens do Aedes aegypti, criando-se uma espécie de barreira, para depois expandir para as demais áreas. “Como desta vez a liberação acontecerá na cidade toda, também tentaremos observar como será a interferência na transmissão da dengue”, prevê a professora.

Mais informações: emails carvalhodanilo85@gmail.com mcapurro@icb.usp.br 

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