Genoma de cianobactéria que produz toxina é sequenciado por pesquisadores do Cena

Sequenciamento feito no Cena identificou regiões do genoma ligadas a produção de hepatotoxinas.

Júlio Bernardes / Agência USP de Notícias

O genoma da cianobactéria Microcystis aeruginosa, responsável pela produção de toxinas prejudiciais à saúde humana, foi sequenciado em pesquisa realizada no Centro de Energia Nuclear da Agricultura (Cena) da USP, em Piracicaba. Essa cianobactéria foi encontrada na represa Billings, em São Bernardo do Campo (Grande São Paulo) e isolada pelo Instituto de Botânica do Estado de São Paulo. A análise identificou regiões do genoma associadas a hepatotoxinas e genes que podem estar ligados à produção de moléculas com potencial para o desenvolvimento de fármacos, como a aeruginosina e a bacteriocina.

“O estudo do genoma procurou conhecer as sequências de nucleotídeos que codificam o funcionamento e a produção das hepatotoxinas, substâncias tóxicas presentes nas cianobactérias”, afirma a professora Marli Fiore, do Cena, que coordenou o trabalho de sequenciamento. A pesquisa contou com auxílio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).

O DNA total da Microcystis aeruginosa foi extraído a partir da cianobactéria isolada e cultivada em laboratório. “Após a extração, esse DNA é purificado por meio de um preparo químico e colocado em um aparelho sequenciador”, descreve a professora. “O equipamento fornece milhões de fragmentos do genoma na forma de sequências de nucleotídeos. Por meio de técnicas de bioinformática, eles são montados de modo que fiquem ordenados como ocorrem no genoma”.

A partir do genoma sequenciado, foi possível observar o conjunto dos genes existentes na cianobactéria e quais deles estão associados à produção da hepatotoxina. “Análises bioquímicas já haviam apontado a presença da toxina e agora foi identifcada a sequência de genes responsável pela síntese da substância”. As conclusões do estudo são descritas no artigo Draft Genome Sequence of the Brazilian Toxic Bloom-Forming Cyanobacterium Microcystis aeruginosa Strain SPC777, publicado em 1o de agosto na revista Genome Announcements.

Aplicações biotecnológicas

Os resultados preliminares do trabalho de anotação genômica, que procura identificar as potenciais substâncias que os genes codificam, apontaram genes associados à síntese de moléculas com possíveis aplicações biotecnológicas. “Entre elas estão a aeruginosina e microviridina, inibidoras de proteases, a microvirina, com atividade anti-HIV, e a bacteriocina, que inibe o crescimento de outras bactérias, todas com potencial para aplicação em fármacos”, conta a professora. “Para confirmar a existência dessas substâncias serão necessárias novas análises bioquímicas, como a espectrometria de massas”.

Marli ressalta a importância da pesquisa na ampliação dos conhecimentos sobre a cianobactéria, suas funções e exigências. “Ao se conhecer o genoma do micro-organismo, descobre-se o que é necessário para o seu crescimento e desenvolvimento, além das moléculas que produz, possibilitando criar formas de manipulação para impedir que as cianobactérias se desenvolvam de maneira tão agressiva, como acontece nas florações”, conclui.

A coleta e o isolamento da Microcystis aeruginosa foi feita pelos pesquisadores da Seção de Ficologia do Instituto de Botânica do Estado de São Paulo, a partir de amostra de floração ocorrida em Riacho Grande, um braço da represa Billings localizado no município de São Bernardo do Campo. “A linhagem isolada da cianobactéria foi cultivada para a realização de estudos de toxicidade, por meio da técnica de espectometria de massas”, afirma a professora do Cena.

A análise identificou duas substâncias tóxicas, a microcistina (hepatotoxina) e a saxitoxina (neurotoxina). Os resultados são descritos no artigo Highly Toxic Microcystis aeruginosa Strain, Isolated from São Paulo – Brazil, Produce Hepatotoxins and Paralytic Shellfish Poison Neurotoxins, publicado na revista Neurotoxicity Research, em 2011. “As florações dessa espécie de cianobactéria são muito comuns em represas no Brasil”, ressalta Marli. “Essas duas toxinas estão associadas a problemas hepáticos e neurológicos em seres humanos”.

Mais informações: email fiore@cena.usp.br, com a professora Marli Fiore

Scroll to top