Diretrizes ajudam jornalista a tratar do tema da alimentação, revela pesquisa da ECA

Estudo sugere maneiras de dar uma nova abordagem a matérias sobre dietas, denunciando práticas atuais.

Lara Deus / Agência USP de Notícias

Alimentos milagrosos, comidas proibidas e dietas mirabolantes fazem parte do conteúdo da produção midiática atual sobre alimentação. Diante disto, uma pesquisa de mestrado em Ciências da Comunicação (PPGCOM) realizada na Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP estabeleceu 32 diretrizes para profissionais da comunicação tratarem do tema, dando base para uma nova abordagem mais reflexiva da questão. As orientações foram elaboradas pela diretora de mídias sociais Tatiana Aoki, que pesquisou as práticas midiáticas e as políticas públicas no campo.

A cada edição, revistas e sites de dieta elegem um “vilão” e um “mocinho” da nutrição, promovendo alguns alimentos e proibindo outros. É o que constatou Tatiana, quando trabalhou em veículos deste segmento. Foi nesta época que começou a perceber também padrões nas matérias de alimentação, que sempre replicavam estudos científicos sem avaliar a veracidade e aplicabilidade dos mesmos. Pesquisando sobre o que levava os meios de comunicação a darem este tratamento ao tema, ela descobriu que há uma ideologia que guia a dieta ocidental e acaba beneficiando a indústria alimentícia: o nutricionismo.

O nutricionismo traz uma abordagem mais científica dos alimentos, afastando o público do entendimento real do que está comendo. O termo, que não é sinônimo de nutrição, aponta para a noção de que os alimentos são a soma de seus nutrientes. “Quando você separa um alimento em nutrientes, cada dia uma coisa pode mudar“, afirma Tatiana, referenciada por Michael Pollan, teórico que descreveu este pensamento. Nesse sentido, o nutricionismo depende de uma forma de dualismo, em que existe um nutriente mau para condenarem e um salvador para beatificarem.

Outro ponto marcante desta ideologia é a culpabilidade da pessoa por sua condição de saúde e alimentação. A pesquisadora aponta que, ao contrário, a saúde das pessoas é também influenciada por fatores externos, como a falta de espaços públicos destinados à prática de exercícios físicos e de acesso a alimentos naturais, sobretudo nas grandes cidades. Incentivar a implementação de políticas públicas em prol da saúde faz parte das orientações que a social media inseriu na conclusão de sua dissertação de mestrado.

As diretrizes

Tatiana, orientada por Alice Mitika Koshiyama, elaborou 32 diretrizes direcionadas àqueles que trabalham com informação sobre alimentação ou desejam fazer políticas públicas para o campo. Elas estão divididas em quatro partes. A primeira encoraja os profissionais a fazerem uma nova abordagem do assunto, desconfiando das pesquisas científicas, da validade dos alimentos e negando as dietas da moda e os ingredientes proibidos. A segunda parte fornece uma explicação a respeito das palavras usadas quando o assunto é dieta e saúde, como “integral” e “orgânico”. Isto porque, segundo ela, a indústria se apropriou destes termos e nem sempre utiliza o adequado quando anuncia seus produtos.

As conexões da comida com o meio ambiente são resgatadas no penúltimo tópico. Nele, há um grande incentivo à reflexão sobre a longa cadeia que a indústria alimentícia submete à comida. Com o nutricionismo, ingredientes naturais perdem valor. “Se a moda é o cálcio, um alimento artificial lotado de cálcio é melhor que do que o leite”, exemplifica a social media. Por último, são explicadas as questões políticas e econômicas que circundam um alimento e seu processo de produção. As diretrizes, na íntegra, podem ser conferidas aqui.

Projeto Educando com a Horta Escolar

A fonte midiática encontrada por Tatiana que contrastasse com o nutricionismo foi o Projeto Educando com a Horta Escolar, da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO), ligada à Organização das Nações Unidas (ONU) e ao Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE). Ele consiste na distribuição de cartilhas a professores de escolas com baixo IDH – o Índice de Desenvolvimento Humano. No material, a organização incentiva não só a produção do próprio alimento, bem como o questionamento do que a indústria oferece à população.

Além disso, o projeto também trata do tema da segurança alimentar, que Tatiana levantou em sua pesquisa. No Brasil, enquanto 49% da população está acima do peso, 27% vive em situação de insegurança alimentar e nutricional, ou seja, não tem garantia se fará as três refeições do dia. A pesquisadora conclui também que a “alimentação é só um reflexo desse grande problema, que é a desigualdade social”. Segundo a pesquisa, com programas governamentais como o Fome Zero, houve melhora na questão da segurança alimentar, mas ainda faltam políticas que regulamentem o setor alimentício e diminuam os males causados pelo excesso de peso.

Mais informações: email tati.aoki@gmail.com, site www.behance.net/tatiaoki

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