História literária e literatura histórica convergem na obra de Alfredo Bosi

Em seu novo livro, Entre a Literatura e a História, o autor reúne uma série de ensaios feitos ao longo de sua carreira, muitos deles inéditos.

Sofia Calabria / Jornal da USP

Foto: Cecília Bastos/Jornal da USP  O ensaísta, analista, crítico, professor da USP, editor, historiador e membro da Academia Brasileira de Letras, Alfredo Bosi
Foto: Cecília Bastos/Jornal da USP

O ensaísta, analista, crítico, professor da USP, editor, historiador e membro da Academia Brasileira de Letras, Alfredo Bosi

Luigi Pirandello, com todo seu existencialismo, disse na voz de Vitangelo Moscarda (Um, Nenhum e Cem Mil) que “o drama está todo na consciência que se tem de cada um de nós ser ‘um’, ao mesmo tempo que é ‘cem’ e que é ‘mil’, que é ‘tantas vezes um’ quantas possibilidades há nele”. O excerto do autor do realismo italiano pode se aplicar quase por completo à obra de Alfredo Bosi, com a exceção de que as mil atribuições a ele relacionadas não devem ser nenhum drama, de fato. Ensaísta, analista, crítico, professor universitário, editor, historiador e membro da Academia Brasileira de Letras, Bosi, aos 77 anos, continua ativo no ensino, no estudo e na difusão da literatura. No último dia 26, o professor lançou Entre a Literatura e a História, seu mais novo livro, na Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin da USP.

O título, que a princípio parece remeter a um grande ensaio sobre a relação de ambos os assuntos, traz um compilado de 42 textos e passa por várias vertentes dos mais de mil Bosi, desde críticas literárias e pensamentos tanto sobre literatura quanto sobre questões que permeiam a sociedade, até entrevistas concedidas pelo autor. A obra elege, dentre tantos escritos, aqueles que representam um pouco de cada um dos assuntos aos quais Bosi tem se dedicado em sua carreira, além de ter contribuído de forma significativa no meio acadêmico brasileiro.

Foto: Reprodução
Foto: Reprodução

Poesia, ficção e pensamento – “A poesia seria hoje particularmente bem-vinda  porque o mundo onde ela precisa subsistir tornou-se atravancado de objetos,  atulhado de imagens, aturdido de informações, submerso em palavras, sinais e  ruídos de toda parte.” O argumento vem ao encontro do questionamento da  necessidade da poesia hoje, sobre o qual Bosi faz uma análise aprofundada.  Cecília Meirelles, João Cabral de Melo Neto e Ferreira Gullar são alguns dos  alicerces do autor para mostrar que, sim, ela ainda é necessária para que o  “muito barulho por nada” do mundo tenha algo de sensível. Na ficção,  Memórias Póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis, Infância, do  modernista Graciliano Ramos, um conto de Mário de Andrade e os de Lygia  Fagundes Telles são desmembrados, interpretados e analisados na visão do  especialista em literatura brasileira.

História, ideologia e intervenção – “Chegou um momento em que, estimulado    pelo conhecimento do outro, o artista latino-americano olhou para si mesmo e  surpreendeu um rosto humano, logo universal, nos seus cantos e mitos, nas  paixões do cotidiano e nas figuras da memória.” Nos artigos “Imagens do  Romantismo no Brasil”, “As parábolas da literatura latino-americana” e “As  fronteiras da literatura”, a faceta literária de Bosi tange ainda mais a sua de  historiador. O autor faz suas as palavras do cubano Alejo Carpentier quando  este  diz que “temos que pegar nossas coisas, os nossos homens e projetá-los  nos  acontecimentos universais para que o cenário americano deixe de ser  algo  exótico”.

No capítulo “Intervenções”, Bosi discorre sobre teologia, educação, violência,  fome e o tempo, ligados sempre ao indivíduo e suas ações. Bosi define em  poucas  linhas o que tanto angustia o homem: “Todos os momentos da  existência que os  mortais chamam de felicidade têm em comum precisamente  essa disposição  generosa de aceitar a passagem das horas”. Seus textos são alguns dos motivos  que as fazem passar depressa, dada a maneira clara e fluida com que o escritor  discorre sobre temas tão complexos.

Nas palavras de Bosi, em seu discurso de Professor Emérito da Universidade de  São Paulo, “as tristezas podem chegar a qualquer hora, e quando menos se  espera, mas a leitura depende do nosso desejo, e felizmente, como para tantos  de nós, esse desejo veio cedo”. Felizmente não só para Bosi, mas certamente  para todos que apreciam a literatura brasileira e que encontram em seus estudos  posições para refletir e entender melhor a extensa produção do País.

Entre a Literatura e a História é uma publicação da Editora 34, e já pode ser encontrado nas livrarias.

Scroll to top