Estudo mostra que New York Times cobriu ditadura do Brasil de modo tendencioso

A dissertação de mestrado da filósofa Renata Fortes Itagyba revela que a cobertura que o jornal fez do período ditatorial brasileiro oscilou junto com as relações econômicas e diplomáticas entre EUA e Brasil.

Lara Deus/Agência USP de Notícias

A cobertura que o jornal New York Times fez do período ditatorial brasileiro oscilou junto com as relações econômicas e diplomáticas entre os Estados Unidos e o Brasil. A filósofa Renata Fortes Itagyba analisou matérias e estudou a história do jornal e as relações entre os países na época em sua pesquisa de mestrado na Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP.

“O tom do jornal muda junto com o tom do relacionamento entre os dois países”, explica Renata, que analisou os 21 anos de ditadura nas páginas do jornal norte-americano. Separando em períodos, ela pode perceber este movimento de aproximação e distanciamento tanto na política, como na imprensa, representada pelo NYT. Um exemplo disto é que, no dia em que o governo de João Goulart sofreu o golpe, em abril de 1964, o veículo não o chamou mais de “mister” (senhor), tratamento dado aos presidentes, ainda que não estivesse oficializado que Goulart não seria mais o presidente do país. É fato que os Estados Unidos também não estavam contentes com o rumo à esquerda tomado pela política de Jango.

Nos anos iniciais de governo militar, o jornal não dava o nome de “ditadura” em seus textos. Somente em 1977, quando o Milagre Econômico já havia ocorrido e o endividamento externo brasileiro era grande, o NYT classificou o governo brasileiro como uma “ditadura que se iniciou há 13 anos”. A filósofa também conta que, quando o relacionamento entre os países estava bom, o jornal referia-se aos militares como presidentes, mas quando as relações, principalmente econômicas, eram piores, apenas tratava como “chefes” ou “líderes”.

A publicação noticiava todas as violações aos direitos humanos promovidas pelo governo brasileiro, mas não citava o envolvimento norte-americano nestas questões. “Na hora que você está lendo, parece inofensivo, mas, de fato, mostra alguma tendência”, segundo Renata, que defendeu seu mestrado em novembro de 2013 na ECA.

Seleção dos textos

“Quando o jornal coloca na primeira página, representa a fala dele”, comenta Renata, justificando os critérios que usou para selecionar as reportagens e artigos analisados. De todas as matérias que incluíam o termo “Brazil”, de 1964 a 1985, ela selecionou apenas as que estavam na capa, abordavam as temáticas de política e cultura e tinham foco na interligação entre os dois países. Ao final da seleção no acervo online da publicação, sobraram 25 artigos.

Antes de fazer a análise, a filósofa estudou dois pensadores que tinham visões opostas sobre a atuação dos Estados Unidos na ditadura militar brasileira. Para Carlos Fico, essa interferência foi negativa, já que, entre outros motivos, o país colaborou com o golpe de Estado em 1964. Já James Green acredita que a intervenção positiva, representada pela ajuda no retorno à democracia empreendida pelo presidente Jimmy Carter, predominou. “Eu balanceei referências históricas positiva e negativa para ter uma base histórica neutra”, explica.

A pesquisa, de título O Brasil ditatorial nas páginas do New York Times (1964-1985), foi orientada pela professora Sandra Reimão. A dissertação, defendida em novembro de 2013, foi recomendada para publicação em livro pela banca avaliadora. O link para visualização completa da dissertação deve ser disponibilizado em breve pelo Banco de Teses da USP.

Mais informações: email renataitagyba@gmail.com

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