As commodities agrícolas estão entre os principais itens de exportação do Brasil, com uma produção elevada que se estima, atualmente, corresponder a um quarto do PIB nacional. Um novo elemento, entretanto, vem sendo muito bem cotado no mercado internacional, em especial na China: a água.
O Brasil é hoje um dos maiores exportadores globais de água virtual, conceito criado para explicar a quantidade de água empregada para produzir um produto em um determinado local, ainda que destinado a outra localidade, criando, assim, um fluxo virtual de água entre os países.
A professora do Centro de Energia Nuclear na Agricultura (Cena) da USP, Maria Victoria Ramos Ballester explica que a China adotou uma política de aumentar as importações de culturas de elevado uso de água – como a soja -, o que reduz a demanda de água na Ásia. Porém a produção para exportação no Brasil aumenta a dependência de quem produz as mercadorias que necessitam de irrigação, com destaque para os agricultores do Mato Grosso.
Para países situados em regiões que sofrem com escassez hídrica, o comércio de água virtual é atraente e benéfico. “Por meio da importação de mercadorias que consomem muita água durante seu processo produtivo, nações, Estados e municípios podem aliviar as pressões que sofrem sobre suas próprias fontes”, esclarece a professora. “Quando um produto, seja ele qual for, é comercializado entre eles, entende-se que a água utilizada em seu processo fabril também foi exportada”, completa.
A pesquisa
Apoiado pela Fapesp no âmbito das pesquisas de colaboração internacional promovidas pelo Belmont Forum – conselho de agências de fomento à pesquisa de vários países do mundo – a equipe de trabalho do Cena atuará em uma das fronteiras agrícolas de mais rápida expansão e intensificação do mundo, a bacia hidrográfica do Alto Xingu, localizada ao sul da Amazônia brasileira.
“A região do Alto Xingu é globalmente conectada por meio de exportações agrícolas e, portanto, é um ponto chave na rede mundial de comércio de água virtual”, afirma Vicky Ballester, pesquisadora do projeto e membro do Programa Fapesp de Pesquisas sobre Mudanças Climáticas Globais.
Ao longo das últimas quatro décadas, o Alto Xingu sofreu um processo de desmatamento em larga escala, impulsionado pela intensificação das lavouras e da criação de gado. Nos últimos vinte anos, a crescente demanda mundial por carne tem alimentado a expansão das áreas de cultivo na região, especialmente da soja, para a alimentação animal. O destino da soja, cuja exportação aumentou, deixou de ser a Europa, por volta dos anos 2000, para se tornar a China, que é, hoje, o maior importador do Mato Grosso.
As tendências de crescimento populacional na Ásia indicam que esse comércio de água virtual se tornará ainda mais estratégico para a segurança hídrica dos países da região, mais uma vez com destaque para a China. Os pesquisadores do projeto do Cena propõem avaliar o consumo de água da cultura de soja e sua eficiência, já que os recursos hídricos subterrâneos no Alto Xingu estão entre os menos explorados do planeta, o que sugere que a futura intensificação da agricultura pode recorrer a essa região para explorar ainda mais seus recursos para irrigação.
“Enquanto a água virtual, relacionada com as exportações de soja do Mato Grosso está ajudando a subsidiar a segurança alimentar e hídrica na China, existem inúmeras demandas conflitantes de água dentro da bacia do Alto Xingu”, conclui a professora.
Com informações da Assessoria de Imprensa do Cena