Programa Supernova propõe nova maneira de ensinar e pesquisar

Idealizado por professores do ICB e da Poli , programa busca estimular o empreendedorismo, produzir novos fármacos e aproximar a USP da sociedade.

Paulo Hebmüller / Jornal da USP

Foto: Marcos Santos / USP Imagens

Nos últimos sete anos, a plataforma Spark, da Faculdade de Medicina da Universidade de Stanford, nos Estados Unidos, transformou 59% de seus 49 projetos em produtos licenciados ou utilizados em clínica – ou ambos. A Spark é uma aceleradora tecnológica de projetos acadêmicos na área de biotecnologia que privilegia doenças raras e negligenciadas, atuando na chamada pesquisa translacional – ou seja, que leva em conta da pesquisa científica e clínica e do desenvolvimento tecnológico até o processo industrial, comercialização e os próprios sistemas de saúde.

“Temos que reduzir barreiras para maior aproximação da indústria de nossas ideias”, diz Daria Mochly-Rosen, professora do Departamento de Química e Biologia Sistêmica da faculdade norte-americana e uma das coordenadoras da Spark. Um dos objetivos da iniciativa é aumentar o número de novas drogas e produtos biológicos aprovados anualmente pela agência reguladora norte-americana, a FDA.

O modelo de Stanford é a inspiração do Programa Supernova, idealizado por professores do Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) e da Escola Politécnica (Poli) da USP, cujo lançamento teve no dia 8 de abril o primeiro de uma série de três debates no ICB, na Cidade Universitária. “Esse programa é uma tentativa de mudar a maneira como ensinamos e fazemos pesquisa na USP e de promover parcerias mais eficientes com outros setores da sociedade”, explica o professor Luís Carlos Souza Ferreira, vice-diretor do ICB. “A ideia é tentar seguir o modelo Spark, que tem se mostrado muito bem-sucedido nos Estados Unidos, mas adaptado à nossa realidade – a começar pela própria USP, que não é Stanford.”

Consultoria

Foto: Marcos Santos / USP Imagens
Professor Daria Mochly-Rosen

Os cenários de fato são bem diferentes nos dois países, mas há dificuldades comuns, como apontou a professora Daria em sua participação no debate. Uma delas é que a academia, na maior parte das vezes, treina profissionais para suas próprias fileiras, e não como força de trabalho para desenvolver produtos que cheguem às empresas e à sociedade. Outro problema, cita, é que o avanço da formação do aluno frequentemente não está alinhado com seu envolvimento na pesquisa aplicada. “É preciso fazer pesquisa básica em toda instituição acadêmica, mas ter em mente o quadro mais amplo”, diz. É nele que se introduz o trabalho translacional.

A Spark oferece financiamento, acesso a instalações, consultoria, cursos específicos e outros recursos aos alunos que queiram submeter seus projetos. Um dos aspectos mais importantes do programa é a presença de conselheiros e mentores voluntários, que discutem os casos, fazem avaliações e dão sugestões sobre cada etapa. Esses mentores são profissionais ligados a empresas, pesquisadores e professores de diversas instituições. Todas as quartas-feiras, os alunos apresentam as ideias e participam da discussão em grupo. “Por que os conselheiros fazem isso? Por altruísmo e também porque se divertem muito”, afirma Daria – que explica ainda que todos os participantes assinam acordos de confidencialidade para não vazar informações das ideias e pesquisas nascentes.

Para a professora, o envolvimento dos mentores é o maior diferencial da Spark. “Alguém pode argumentar que é fácil dispor deles porque estamos no Silicon Valley. Mas vocês também têm centenas de conselheiros ao redor, só não descobriram ainda quem eles são”, considera. Daria também defende que os pesquisadores devem se concentrar nos seus pontos fortes, não nas deficiências ou na solução de problemas que dependem de outras instâncias, como entraves burocráticos. A professora relata ter trabalhado em parceria com hospitais brasileiros “dez vezes melhores do que alguns que vi nos Estados Unidos”, mas que a obtenção de documentos ou a importação de componentes podia se transformar “numa loucura” cuja solução está além das atribuições dos acadêmicos.

Entre as vantagens dos alunos da USP na área, Daria cita o acesso a disciplinas de anatomia, fisiologia e farmacologia, o que não ocorre com muitos dos estudantes de cursos equivalentes em Stanford. E, mesmo que o foco seja nos pontos fortes, os integrantes da Spark se preocupam em estudar e conhecer bem as pesquisas cujo resultado não chegou ao esperado para identificar suas falhas.

Salto

Foto: Marcos Santos / USP Imagens
Foto: Marcos Santos / USP Imagens
Professor Luís Carlos Souza Ferreira

Luis Carlos Souza Ferreira, do ICB, defende que a Universidade precisa preparar melhor seus alunos para “dar o salto” e começar novos empreendimentos utilizando alta tecnologia e inovação para transformar pesquisas em produtos – o incentivo à atuação em projetos nos parques tecnológicos é um dos caminhos.

“As boas ideias e as pessoas estão aqui”, justifica. Daria Mochly-Rosen concorda: “A academia não é o lugar para sediar essas empresas. Nosso papel é preparar”, afirma. Os idealizadores definem o Supernova como a possibilidade de formação de uma cultura de inovação entre alunos e professores da USP – “uma plataforma pela qual os laços entre a pesquisa e o desenvolvimento conduzidos na USP encontrem aplicações práticas respaldadas pelo setor produtivo”. Além do ciclo de seminários que vai debater diferentes aspectos do programa no primeiro semestre, será realizado um curso para alunos, docentes e empresários no segundo semestre. Professores da USP e de outras instituições, pesquisadores e profissionais do Brasil e do exterior integrarão o corpo docente, com colaboração da equipe da Spark e de Stanford.

“Temos um momento singular na USP, com uma cúpula que apoia esse tipo de trabalho e percebe as dificuldades que temos e as etapas pelas quais não podemos deixar de passar”, diz o professor José Antonio Lerosa de Siqueira, da Escola Politécnica. Para o docente, mais importante do que colher resultados no curto prazo é propor modificações no ambiente da pesquisa e da inovação na Universidade, com um modelo que pode ser facilmente transplantado para outras unidades. “Tem tudo para dar certo”, acredita.

Seminários acontecem no ICB III

O segundo seminário do Programa Supernova será no dia 9 de maio, com o tema “Comercialização e Empreendedorismo”. Os convidados são José Antonio Lerosa de Siqueira, da Escola Politécnica da USP, Sérgio Risola, do Centro de Inovação, Empreendedorismo e Tecnologia (Cietec), Vanderlei Bagnato, da Agência USP de Inovação, e Patrícia Moreira, da Natura.

No dia 10 de junho, a discussão será sobre o desenvolvimento de remédios na academia, com análise do caso da Spark. Os convidados são Julio Cesar Batista Ferreira, do ICB, José Fernando Perez, da Recepta Biopharma, João Batista Calixto, da Universidade Federal de Santa Catarina, e Kevin Grimes, da Universidade de Stanford.

Os debates ocorrem no Anfiteatro Luiz Rachid Trabulsi, no ICB III, na Cidade Universitária, das 8h30 às 12h30, abertos ao público e realizados em inglês, sem tradução simultânea.

Mais informações sobre o Projeto Supernova podem ser obtidas na página eletrônica www.icb.usp.br/supernova

Scroll to top