Pesquisador da FFLCH analisa atuação da CNBB nos anos 50

Entre as proposições da CNBB, destacavam-se a reforma agrária e o crédito rural.

Paloma Rodrigues / Agência USP

A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), fundada em 1952, iniciou um período de forte atuação junto a Igreja Católica no cenário político brasileiro entre 1952 e 1964. Dentre as proposições do grupo estavam a reforma agrária e crédito rural. O pesquisador Christian Jecov Schallenmueller buscou documentos do primeiro e segundo Encontro dos Bispos do Nordeste, além das proposições que resultaram deles para montar uma análise do período de maior apelo político da Igreja no Brasil, que contava com o reforço dos ativismo social dos movimentos leigos para engrossar o coro de sua voz.

“Esse foi um período marcado pela participação crítica da Igreja. Eram críticas diferentes das atuais: elas vinham com novas propostas, reivindicando mudanças”, diz Schallenmueller. Segundo ele, hoje a Igreja se pauta por aquilo que discorda do Estado: é contra o aborto e as campanhas pela utilização de métodos contraceptivos pela população, mas não apresenta um engajamento comparável ao da época estudada pelo pesquisador no que se refere às questões sociais.

A dissertação de mestrado Tradição e Profecia: o pensamento político da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e seu contexto social e intelectual (1952-1964) fez parte do Projeto Temático Linhagens do pensamento político-social brasileiro, fomentado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) e com apoio institucional do Centro de Estudos de Cultura Contemporânea, da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP, orientado pelo professor Gildo Marçal Brandão e, posteriormente, pelo professor Bernardo Ricupero.

Desenvolvimentismo

A partir da década de 1950 e a ascensão de Juscelino Kubitschek, o sistema político brasileiro tendeu para o desenvolvimentismo. Ele buscava o avanço industrial e o aumento da infraestrutura do País. Isso se deu de maneira a abrir o Brasil para o capital estrangeiro, como no avanço das empresas automobilísticas e farmacêuticas. Ainda assim, o sistema previa uma forte participação estatal nesse desenvolvimento, dando suporte para o crescimento dessa economia.

“Ao olhar da Igreja, o desenvolvimentismo era um meio termo. Ele ia contra o socialismo e ao mesmo tempo contra o liberalismo econômico”, explica o pesquisador dizendo ainda que, para apoiar o desenvolvimentismo, a Igreja não precisava se aliar a nenhum de seus inimigos, o que deu mais força para a corrente na época.

Políticas públicas

A grande preocupação da Igreja naquele período era cobrar do Estado a realização de políticas públicas, principalmente na região do nordeste. Segundo Schallenmueller, eles reprovavam a atuação do Departamento Nacional de Obras Contra a Seca (DNOCS), por exemplo, por não ser efetiva e não resolver os problemas da região.

As propostas partiam dos bispos, que formaram vários grupos de estudos com especialistas nas áreas reivindicadas para elaborar as propostas. Depois disso, os assessores da presidência formalizavam essas questões, transcrevendo os pedidos dos bispos de maneira a oficializá-los.

Todas as proposições feitas no Primeiro Encontro dos Bispos do Nordeste, realizado em 1956, por exemplo, foram incorporadas pelo governo federal. “Todas eram bastante propositivas e pontuais, isso facilitou a aceitação das propostas, dentre elas a produção de alimentos para o abastecimento das cidades, a expansão do potencial hidrelétrico do rio São Francisco e crédito rural, entre outras.”

A questão da reforma agrária

Um dos pontos mais surpreendentes da pesquisa está na questão da Reforma Agrária. A Igreja foi uma das principais defensoras e uma grande força política na luta pela reforma no Brasil. A partir de meados dos anos 1960, a CNBB passou a defender a desapropriação por interesse público como o principal instrumento da Reforma Agrária. Essa postura foi ainda mais progressista do que o previsto atualmente pela Constituição Federal, pois a indenização aos latifundiários não seria paga antes da desapropriação, mas resgatada em títulos da dívida pública.

A Igreja usou como explicação o fato de que terrasque não tinham função social deveriam ser retidas pelo Estado e utilizadas na aplicação da Reforma Agrária. “Desde fins do século 19, a Igreja Católica passou a elaborar uma teoria acerca da função social desempenhada pelas suas próprias propriedades”, diz.

Os termos ‘tradição’ e ‘profecia’, do título da pesquisa, referem-se à qualificação do engajamento político da CNBB no período de 1952 a 1964. Segundo o autor, a maioria das propostas de políticas públicas se equilibravam entre uma visão prospectiva da história e das transformações sociais — a profecia — e uma visão baseada ainda em antigas crenças católicas — a tradição.

Mais informações: email christian.jecov@yahoo.com.br

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