Pesquisadora da FD realiza estudo sobre leis de cotas afirmativas no Rio de Janeiro

A pesquisa envolveu a análise de três leis cariocas quanto à abrangência; o motivo da propositura de ações no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro e os argumentos utilizados nas decisões dos juízes.

Sandra O. Monteiro / Agência USP de Notícias

Cotas para negros fazem parte do que se denominam ações afirmativas, políticas públicas ou privadas que visam a acelerar a igualdade real entre os cidadãos. A advogada Estela Guerrini buscou entender como o poder judiciário do Rio de Janeiro (único Estado brasileiro com leis estaduais sobre cotas para negros), interpretou e decidiu sobre a questão no período entre 2001 e 2008. A pesquisa realizada na Faculdade de Direito (FD) da USP envolveu a análise de três leis cariocas quanto à abrangência; o motivo da propositura de ações no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro e os argumentos utilizados nas decisões dos juízes. A pesquisa concluiu que a discussão das ações solicitando cotas em juízo se concentrou muito em perda de prazos e ausência de documentos e pouco debateu questões sobre a  igualdade social.

A primeira lei (L.3254/2000) destinava 50% das vagas de Universidades Públicas Estaduais a alunos que houvessem cursado integralmente os ensinos fundamental e médio em Instituições da rede pública dos municípios e do estado do Rio de Janeiro. A segunda (L. 3708/2001) concedia 40% das vagas da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e da Universidade Estadual do Norte Fluminense (UENF) para ingressantes pardos e negros, independentemente da origem escolar. Já a Lei 4151/2003 disciplinou sobre todo o sistema de cotas, incluindo não só alunos secundaristas de rede pública, pardos e negros, mas também alunos carentes, pessoas com deficiências, minorias étnicas, filhos de policiais civis e militares, bombeiros, inspetores de segurança e administração penitenciária cujos pais estivessem mortos ou incapacitados por motivo de sua função no trabalho.

Para não deixar que 90% das vagas (a soma conjunta dos 50% da primeira lei com os 40% da segunda) da UFRJ e da UENF se destinassem somente a cotistas no período de 2001 a 2003, a solução encontrada foi o sistema de dedução. Primeiro verificava-se quantos candidatos haviam se autodeclarado pardos ou negros, logo, as vagas que restassem dos 40% seriam destinadas aos demais cotistas. Após 2003, este conflito desapareceu porque as duas leis deixaram de existir com a publicação da nova norma que pressupunha que todos esses grupos de pessoas (negros, rede pública etc.) fossem considerados antes de tudo carentes. E disciplinou 20% das cotas para pardos e negros, 20% para alunos de rede pública e 5% para os demais cotistas em relação a todas as Universidades Públicas do Rio de Janeiro.

Questionamentos

Segundo a pesquisadora, os autores das ações, em geral discordavam quanto à necessidade de existência de cotas para alunos de rede pública ou por se considerar prejudicados pelo edital do concurso, “principalmente vestibulandos que não estudaram integralmente em escola pública ou que estudaram em escolas particulares porque tinham bolsa de estudo”.

Entretanto, o volume de reclamações na justiça aumentou com o advento da segunda lei, desta vez o debate era a constitucionalidade da própria lei uma vez que beneficiava pardos e negros, os diferenciando dos demais cidadãos, “por ser contrária à ideia de que todos são iguais perante à lei”, declara Estela. Com a nova lei de 2003, bem mais abrangente, a discussão saiu da questão constitucionalidade e passou a examinar a definição de aluno carente. O problema maior era saber o limite máximo da renda para comprovação da carência, “porque R$ 300,00 e não R$ 350,00, por exemplo.”

Algumas ações as quais questionavam a inconstitucionalidade da L.3708/2001 tiveram seu pedido atendido por um órgão especial do Tribunal com poderes especiais para verificar a constitucionalidade ou não de uma lei. Mas, a decisão tomada por este órgão se refere apenas ao caso julgado, assim apenas se refere ao ingressante da ação e não a todos os candidatos.

Dos 108 processos estudados pela pesquisadora, a maioria não ia para frente por questões processuais como a perda de prazos tanto no ato da inscrição do vestibular quanto durante o processo. A forma como era pedido o benefício da cota em juízo também foi outro argumento muito encontrado como justificativa para negar a solicitação. Outras vezes recaia sobre questões formais como a ausência de documento que comprovasse a carência do aluno.

A autora revela que “pouquíssimas decisões do tribunal entraram em discussões mais aprofundadas em relação à sociedade, a igualdade entre as pessoas ou mesmo sobre a necessidade de ações afirmativas”.

Mais informações: email estela.guerrini@gmail.com, com Estela Guerrini  

Scroll to top