Substância antianêmica pode ser usada contra infecções, afirma pesquisa da FMUSP

Tratamento da sepse grave com medicação semelhante à eritropoietina em ratos apresentou resultados positivos

Victor Francisco Ferreira / Agência USP de Notícias

A eritropoietina, hormônio produzido no rim e utilizado medicinalmente para tratar a anemia, pode ser usada para tratar a sepse, um grau avançado de infecção. “Atualmente o principal tratamento da sepse é feito com antibióticos e soro para manter a pressão arterial em caso de choque séptico, que é o pior tipo de sepse”, afirma a médica Camila Eleutério Rodrigues, do Laboratório de Investigação Médica (LIM 12) da Faculdade de Medicina da USP (FMUSP). Em sua pesquisa, Camila estudou a utilização do ativador contínuo do receptor da eritropoietina (CERA, sigla em inglês). O estudo mostra que a diferença do CERA para a eritropoietina é a capacidade de funcionar por um maior período no organismo.

“O paciente que usa a eritropoietina precisa de três doses semanais. Já com o CERA é possível tratar o paciente anêmico com uma dose por mês”, afirma. O trabalho de Camila realizado no LIM 12 segue a tendência internacional de buscar alternativas para o tratamento da sepse.

A substância também tem outro aspecto que incentivou o seu estudo como alternativa para o tratamento de infecções. A eritropoietina já é usada para tratar anemia em pessoas que têm doença renal crônica. “Ela tem como propriedades a capacidade de inibir a morte celular em alguns casos, além de ser capaz de aumentar a pressão arterial e modular o sistema imunológico, com possível ação de inibição de atividade inflamatória”, explica Camila. A vantagem de a eritropoietina ser uma substância utilizada em humanos em outros tratamentos é já serem conhecidos seus efeitos colaterais e saber-se que é uma substância segura.

Indução

Os estudos foram realizados a partir de induções de sepse em ratos de laboratório pela exposição do abdômen a bactérias. Segundo Camila, esse é o modelo animal que melhor mimetiza a sepse humana. “É o que acontece, por exemplo, quando uma pessoa tem uma úlcera perfurada”, afirma. Em um grupo de animais o CERA foi aplicado antes da indução da sepse e, em outro, chamado de grupo séptico, houve apenas a infecção. Além disso, os dois grupos receberam antibióticos e soros, tratamento padrão para a sepse em humanos.

A sepse é definida como uma síndrome de reação inflamatória sistêmica associada a um foco infeccioso. Frequentemente leva à disfunção de múltiplos órgãos, sendo que os mais afetados costumam ser os pulmões e os rins. Nos Estados Unidos, a sepse está associada a 11% das internações em unidade de terapia intensiva (UTI) e é responsável por cerca de 10% das mortes registradas anualmente.

Os animais sépticos apresentaram problemas como disfunção renal, hepática e de pequenos vasos sanguíneos. “Percebemos que eles também têm expressão aumentada de toll like receptors tipo 4 (TLR4), de fator nuclear kappa B (NF-kB) e citocinas inflamatórias. Há ainda a redução na expressão de receptores de eritropoietina no rim”, afirma Camila.

O TLR4 é um receptor presente nas células do sistema imunológico que, em contato com bactérias, inicia a inflamação pelo corpo. O NF-kB é uma substância presente no sangue que, quando estimulada, atua no núcleo das células produzindo citocinas, proteínas que atuam na ativação da resposta do sistema imunológico à infecção. Uma grande quantidade dessas substâncias no organismo indica a presença de uma infecção severa.

Os ratos tratados previamente com o CERA apresentaram melhora nas disfunções renal, hepática e microvascular, além de terem menor expressão de TLR4, NF-kB e citocinas. Eles também expressaram mais receptores de eritropoietina no rim que o grupo séptico.

A pesquisa foi desenvolvida por Camila, doutoranda do LIM 12, Talita Sanches, também doutoranda, Rildo Volpini e Maria Heloísa Shimizu, pesquisadores e orientadores e Lúcia Andrade e Antonio Carlos Seguro, coordenadores do laboratório. Também houve participação de Niels Camara, professor da Escola Paulista de Medicina, da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e do Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) da USP, e Patrícia Kuriki, pós-doutoranda da Unifesp.

Mais informações: email camila.eleuterio@usp.br  

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