Grupo da FAU investiga meios de amenizar impactos de enchentes

O Núcleo Habitat Sem Fronteiras (Noah) une graduandos e mestrandos da FAU e do IGc em estudos no Vale do Ribeira.

Entra ano, sai ano e cidades do sudeste brasileiro enfrentam o mesmo problema: as enchentes. Este é o caso de Eldorado, a 250 quilômetros a sudoeste de São Paulo. Por ser banhada pelo rio Ribeira do Iguape e contar com pouca infraestrutura, seus cerca de 15 mil habitantes sofrem com as cheias do rio. A última aconteceu em agosto do ano passado, quando cerca de 70% da cidade ficou embaixo d’água, causando um prejuízo de R$ 30 milhões.

Na tentativa de suprir a falta de infraestrutura e pessoal, a prefeitura de Eldorado firmou uma parceria com pesquisadores da USP. O projeto tem como objetivos mapear as áreas de risco de enchentes, desenvolver um protótipo de abrigo ou mobília que auxiliem a população quando a próxima enchente acontecer e, por fim, expandir o modelo às cidades da região.

O Noah

Lara Leite Barbosa é uma jovem professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) da USP – seu doutorado tem apenas três anos. Mas ainda no mestrado, no Instituto de Arquitetura e Urbanismo (IAU) da USP, em São Carlos, a pesquisadora já tinha como foco de estudo as situações de desastre. “A ênfase era a reconstrução com madeira de reflorestamento, tinha um aspecto de sustentabilidade já associado à pesquisa, que era sobre o mobiliário [móveis e utensílios], associado aos problemas da sustentabilidade, preocupações ambientais”, conta.

Quando veio para São Paulo iniciar o doutorado, Lara Barbosa criou o Núcleo Habitat Sem Fronteiras, o Noah. A sigla que dá nome ao grupo é cheia de significados, vem de Noé, personagem bíblico que salva do dilúvio um casal de cada espécie de animais. Além disso, em alusão às tribos nômades, a sigla não representa o nome literalmente. O símbolo, um H vermelho, remete à Cruz Vermelha e a pessoas abraçadas.

O grupo reúne graduandos e pesquisadores da FAU mas, para o desenvolvimento do projeto em Eldorado, conta com parcerias da prefeitura e do Instituto de Geociências (IGc) da USP.

A pesquisa desenvolvida engloba desde o mapeamento de áreas de risco de desastres até o projeto e construção de abrigos temporários. De acordo com Arlei Macedo, professor do IGc e parceiro do grupo, “este plano é um projeto-piloto, que será usado como modelo para a elaboração dos planos para os outros 22 municípios do Vale do Ribeira e Litoral Sul”.

Precariedade

Ainda que as enchentes sejam recorrentes, a infraestrutura de Eldorado é precária. Lara Barbosa relata que  uma única assistente social que estava começando o levantamento da população – quem mora em qual casa, para onde vai quando fica desabrigado – pediu demissão. “A Defesa Civil, que imaginamos ser uma instituição, em Eldorado é [formada por] uma pessoa, o Edson, que por sinal é bastante solícito. Uma palavra que resume tudo é o despreparo”, lamenta.

Wagner Isaguirre do Amaral, formado pela FAU e atualmente mestrando do IGc, faz parte da equipe do Noah. Em apresentação no terceiro Seminário de Pesquisas Sobre Projetos Para Situações de Enchentes do Grupo de Pesquisa NOAH, ocorrido no último dia 14 na FAU, o pesquisador relatou que até 20,5 metros de cheia é uma situação em que o grupo consegue trabalhar, indicando as áreas que serão atingidas. “Depois disso é o caos”, ou seja, é possível que toda a cidade seja afetada. As informações colhidas podem ser acessadas no site do Sistemas de Informações Geográficas da Bacia do Ribeira de Iguape e Litoral Sul (SIG-RB).

Welington Matias dos Santos, também mestrando do IGc, tem como objeto de estudo a logística. Segundo dados da prefeitura trazidos por ele ao seminário, das 1.787 vagas disponíveis, 140 são precárias e estão suscetíveis a grandes enchentes, como a que aconteceu em 2011.

As enchentes em Eldorado

O ciclo de uma enchente em Eldorado demora em média 10 dias. Logo nos primeiros dias os habitantes atingidos vão para abrigos levando consigo seus móveis, que utilizam como divisórias – o que acaba gerando má utilização do espaço. Nos dias que se seguem, os habitantes esperam a água baixar e vão limpando suas casas. Ao final do ciclo, retornam seus pertences às casas e voltam a morar nelas como antes. “A questão principal é essa resposta urgente que já deveria estar acontecendo e ainda não existe, de acomodar, pelo menos durante esse período de frequente desabrigamento, essa população. Estamos fazendo esse levantamento porque nem isso existe – ainda não é claro detectar quais famílias são afetadas sempre”, relata Lara Barbosa.

No início de dezembro do ano passado, Cintia Sawada e Carla Takushi, graduandas bolsistas do Noah, desenvolveram um dia de atividades em Eldorado para fazer uma aproximação com a população e mapear os problemas enfrentados. Constataram que os principais desafios enfrentados pela cidade em situações de enchente são a falta de comunicação, transporte, energia, água potável e privacidade.

O futuro do projeto

Com estas questões levantadas e com o mapeamento das áreas feito, o próximo passo é desenvolver o produto da pesquisa, passo chamado de prototipagem. “Vamos determinar ainda se vai ser uma construção para ser o abrigo temporário ou se serão protótipos do mobiliário mesmo[mobília e divisórias projetadas para os abrigos já utilizados]. Enfim, alguma parte do projeto nós devemos prototipar e testar na cidade de Eldorado para que fique com a população”, conta Lara Barbosa.

Nesta fase do projeto, um financiamento deve ser solicitado. De acordo com a pesquisadora, o mais provável é que ele venha do Programa de Apoio à Pesquisa em Parceria para Inovação Tecnológica (PITE), da Fapesp. Este programa permite parcerias entre os institutos de pesquisa e empresas que atuem na área. 

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