As inter-faces de Martin Grossmann, o novo diretor do IEA

O recém-nomeado diretor do Instituto de Estudos Avançados da USP fala sobre sua carreira no meio artístico, envolvimento com a plataforma virtual e planos e projetos inovadores no campo da cultura e do conhecimento.

Martin Grossmann, professor da Escola de Comunicação e Artes (ECA), é o novo diretor do Instituto de Estudos Avançados (IEA) da USP, empossado em março. Com uma carreira voltada para as artes, em particular para a ação e a mediação cultural, Grossmann é idealizador de diversos projetos dentro e fora da Universidade. Pós-modernista, usa e abusa da internet em prol do acesso, da divulgação e da troca de conhecimento. Espera-se que a nova liderança acentue no Instituto este perfil agregador, que lá já é presente, estimulando os debates interdisciplinares e a construção interativa do conhecimento.

USP Online: O que espera da sua gestão no IEA, tendo em vista sua carreira voltada para as artes?
Martin Grossmann: O grande privilégio de estar no IEA é que ele foi criado para ser interdisciplinar. Não ter graduação, pós nem áreas específicas do conhecimento. A especialidade passa um pouquinho longe, ela é importante desde que contribua para uma conformação interdisciplinar.

O desafio aqui, agora, é fazer ações e mediações científicas e culturais. Ou, mais interessante, do conhecimento. Sou o primeiro do mundo das artes [na direção], e entendo que existe uma equivalência entre artes e ciência na ampliação do conhecimento, que juntas têm mudado mentalidades e quebrado paradigmas. E o IEA lida com conhecimento de ponta, por isso prefiro falar em conhecimento do que em ciência. É a universidade que traz esse encontro dos diferentes conhecimentos, e que o IEA seja essa plataforma para discutir o que é e o que será o mais avançado.

Sua linha de pesquisa/trabalho é bem voltada para divulgação cultural, promover o acesso à cultura e à informação. Como é isso?
Sou muito voltado à ideia do espaço comum, da esfera pública. É uma discussão muito importante para mim, ainda mais em uma universidade pública. O que é o comum para todos? Minha área de pesquisa é a ação cultural, que vem da preocupação do que é comum, ou seja, pertencente à todos.

Fale mais sobre a importância da ação cultural.
O que é interessante nela é lidar com a experiência, ou seja, boa parte da teorias vêm da prática. Filosoficamente, o marco é a Revolução Francesa, que trouxe a ideia de que o conhecimento e os bens culturais pertencem à comunidade. Agora, quem faz parte dessa comunidade? E como se dá a relação do saber, do conhecimento e da propriedade – intelectual ou patrimonial – com  a maioria? O que mais importa é entender o sistema de produção [artística], sua a genealogia, as condições socioeconômicas e culturais, de modo interdisciplinar.

De que maneira sua trajetória se insere em tudo isso? Como começou?
Minha formação é em artes visuais, de vanguarda: pensar a arte como um espaço libertário e de ampliação do conhecimento, um campo político, muito próximo à própria missão da ciência. A primeira experiência profissional foi de monitor da Bienal de São Paulo, em 1983. Foi legal porque eu era jovem, ainda cursando a faculdade, e tive contato com diferentes públicos, tendo que adequar meu discurso a eles.

Na licenciatura fiz parte de um grupo que elaborou como TCC um projeto educativo para o MAC. Um ano e meio depois fui convidado por Aracy Amaral para implementar o projeto no Museu. O mestrado, aqui na ECA,  foi um relato crítico da experiência do MAC. Fui então fazer doutorado na Inglaterra, pensar o museu em um parâmetro mais complexo e filosófico. Fazendo uma mediação entre questão social, arquitetônica, e a produção da arte. Questionar a função do museu na contemporaneidade, na passagem da cultura material para a virtualidade.

E o Fórum Permanente*?
Veio do interesse em desenvolver interfaces, no doutorado. Surgiu em 2003, sempre com uma relação internacional e interdisciplinar muito forte. Pensando a crise dos museus no Brasil, e o fato de eles estarem em crise permanente, queríamos criar uma plataforma de debate, de crítica, de ação e principalmente mediação cultural acessível a todos pela internet.

Ele é ao mesmo tempo um museu na virtualidade, um arquivo de referência, uma ágora. Pós-modernista também, o intuito é trabalhar em rede. Mais do que centralidade, ser uma plataforma de referência. Só a internet não é suficiente – o sucesso se dá no trabalho em parceria com organismos culturais nacionais e estrangeiros mais o uso de equipamentos culturais.

*Fórum Permanente: Museus de Arte; entre o público e o privado

O senhor foi idealizador do USP Online!
Quando começamos o USP Online, em 1995, ele não pertencia à nenhuma coordenação da USP, a nossa ideia naquele momento era que fosse uma coisa independente. Era uma liberdade interessante, essa nova linguagem, no sentido da plataforma e de dispositivo. A internet é uma nova estrutura, uma nova forma de produção e divulgação de informação.

O legal era que a gente considerava o USP Online como um laboratório, experimental. Ninguém entendia direito como funcionava essa coisa da internet, pouquíssima gente tinha acesso. A premissa era a de que não se podia copiar nada da rede e que a metáfora do portal da USP fosse espacial, e não bidimensional.

Ele foi feito com a ideia de ser um site representativo da USP ou foi um projeto diferente?
Foi feito com a ideia de ser inovador, representativo do conhecimento e da diversidade da USP. Aquela frase gravada na Praça do Relógio – “No universo da cultura o centro está em toda parte” – influenciava muito. Era uma interface que buscava  ser o encontro das culturas acadêmicas. Pensar que tipo de representação essa universidade tão peculiar, única no Brasil que abarca todo o conhecimento,  tem quatro museus de grande porte, e inclusive um IEA, teria na virtualidade. Enfim, que fosse interdisciplinar, que trouxesse essas diversas áreas do conhecimento para o mesmo espaço-tempo, um lugar de encontro. 

Scroll to top