Estudo revela como molécula regula mudança de forma em bactérias

Pesquisa do IFSC descobriu como a molécula c-di-GMP regula um dos mecanismos utilizados para coordenar a transição entre a forma flagelar e biofilme em Pseudomonas aeruginosa.

As bactérias em geral se apresentam de duas formas diferentes, dependendo do ambiente no qual se instalam: em sua forma livre, elas assumem uma geometria flagelar que permite uma boa e rápida locomoção no meio; quando aderem a alguma superfície (biológica ou não), elas adquirem grande resistência graças a sua forma em biofilme. Esse aspecto funciona como um mecanismo de proteção, permitindo que a bactéria sobreviva a mudanças bruscas de temperatura, alterações no pH (índice que indica acidez, neutralidade ou alcalinidade) e, inclusive, à ação de antibióticos, quando instalada no organismo humano.

O professor Marcos Vicente Navarro, do Instituto de Física de São Carlos (IFSC) da USP, estuda as propriedades e mecanismos de formação do biofilme de bactérias. Navarro orientou a pesquisa do doutorando Bruno Matsuyama, que descobriu como a molécula c-di-GMP, presente nas bactérias, regula um dos mecanismos utilizados para coordenar a transição entre essas duas formas – flagelar e biofilme – em Pseudomonas aeruginosa, bactéria conhecida no meio hospitalar por se aproveitar de pacientes com baixa imunidade para causar infecções.

A c-di-GMP é uma molécula que regula a transição da forma livre da bactéria (flagelar) para sua forma de biofilme. “Baixas quantidades da c-di-GMP na bactéria fazem com que ela permaneça em sua forma livre, e altas concentrações dessa molécula fazem com que a bactéria fique na forma de biofilme”, explica Bruno.

O projeto de Bruno é mais diretamente voltado ao estudo da FleQ, principal proteína responsável por regular a transição da Pseudomonas aeruginosa da forma flagelar para biofilme. Mais especificamente, a FleQ regula a formação dos flagelos da bactéria, e a formação do próprio biofilme. “Descobrimos o sítio de ligação de c-di-GMP na FleQ e seu possível mecanismo de regulação. Isso é interessante, pois, até então, não se sabia como essa molécula e essa proteína interagiam, o que abre portas para identificar outros fatores de transcrição  regulados por essa molécula”, elucida o pesquisador.

Proteínas

Por meio de técnicas de cristalografia de macromoléculas, Bruno conseguiu identificar o local exato onde a FleQ se liga com a c-di-GMP, o que abre portas para se determinar mais proteínas que regulam a expressão gênica das bactérias em geral. Outra decorrência interessante do estudo foi a compreensão do mecanismo pelo qual a FleQ muda sua função. “Ao se ligar à c-di-GMP, a FleQ tem sua forma geométrica completamente alterada”, explica Bruno.

Todos os resultados descritos acima renderam uma publicação na Proceedings of the National Academy of Sciences of the United States (PNAS). Tendo agora descrito o mecanismo de interação entre a molécula c-di-GMP e a proteína FleQ, será possível identificar outras proteínas presentes tanto em Pseudomonas aeruginosa quanto em outras bactérias que se ligam à mesma molécula (c-di-GMP).

Possíveis candidatas já foram elencadas por Bruno e Navarro. “Essas proteínas podem não estar relacionadas com a formação de biofilme ou flagelos nas bactérias. Descobrir as funções que elas desempenham é uma nova possibilidade de estudos”, conta Bruno.

Além disso, por ter sido uma molécula recém-descoberta, poucas informações se tem a respeito da c-di-GMP. “O mecanismo que propusemos [como o c-di-GMP afeta a atividade da FleQ] é algo novo, e compreendê-lo é importante por diversos motivos, inclusive para se entender os fatores de transcrição de células de bactérias em geral, já que é um mecanismo não usual para regulação da transcrição“, explica o doutorando.

A transcrição é o processo de formação de uma molécula de RNA a partir de uma molécula molde de DNA. Neste processo, as fitas do DNA se separam e uma serve de molde para o RNA, enquanto a outra fica inativa. Ao fim da transcrição, as fitas que foram separadas voltam a se unir.

Por se tratar de um estudo básico, ainda é difícil dizer quais as possíveis aplicações que ele pode render. No entanto, entender melhor o processo de transição de formas das bactérias pode auxiliar na produção de novos fármacos que atuarão no combate às mais diversas doenças causadas por elas, além de auxiliar no emprego de bactérias em processos como biorremediação para tratamento de ambientes contaminados ou na produção de produtos naturais.

Da Assessoria de Comunicação do IFSC

Mais informações: emails brunomatsuyama@gmail.com, com Bruno Matsuyama, e mvasnavarro@ifsc.usp.br, com o professor Marcos Vicente Navarro

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