A capoeira, a musicalidade e o ritmo afrobrasileiros na USP

Núcleo de Artes Afro-brasileiras resgata a cultura e história do Brasil.

Uma expressão cultural que mistura dança, musicalidade e artes marciais. Esta é uma das maneiras de se referir à capoeira, luta que surgiu no Brasil como manifestação dos escravos africanos, no século 17, e hoje, além de ser praticada por todos os tipos de pessoas, é um valioso instrumento para a compreensão da história e costumes do povo brasileiro. Saber de tradição oral, passado pelos mais experientes aos jovens e crianças, a capoeira é o objeto de estudo e ensino do Núcleo de Artes Afro-brasileiras da USP.

Fundado em 1996 pelo Grupo de Capoeira Guerreiros da Senzala, o núcleo iniciou suas atividades no Instituto Butantan, e logo os alunos da USP se tornaram assíduos frequentadores das aulas. Em 1997, os alunos do curso de Ciências Sociais da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP conseguiram dispor de um local no Instituto de Química (IQ) da USP e os trabalhos do núcleo foram transferidos para lá. Após algum tempo o grupo perdeu o espaço no IQ e as aulas, bem como as demais atividades, passaram a acontecer nas ruas do campus.

Foto: Marcos Santos / Jornal da USP
Foto: Marcos Santos

 

Atualmente, o Núcleo de Artes Afro-brasileiras está nos barracões da USP. O espaço foi montado e organizado através do trabalho colaborativo entre os membros do Grupo de Capoeira Guerreiros da Senzala e os alunos da Universidade que acompanhavam as aulas. Reconhecido em 2007 pela Pró-Reitoria de Cultura e Extensão Universitária (PRCEU) da USP, o Núcleo de Artes Afro-brasileiras surgiu de maneira oposta aos demais, afirma o contramestre de capoeira Luiz Antonio Nascimento Cardoso, mais conhecido como mestre Pinguim: “a maioria dos núcleos são criados a partir de ideias e planos, nós criamos o Núcleo de Artes Afro-brasileiras com base em trabalhos que já eram realizados”.

O grupo mantém relações com o Núcleo de Antropologia, Performance e Drama (Napedra) da FFLCH, que é coordenado pelo professor John Cowart Dawsey, coordenador, também, do Núcleo de Artes Afro-brasileiras junto à PRCEU.

Ensinando arte e história

As atividades do núcleo acontecem durante toda a semana e são voltadas ao público geral. As aulas passam pela capoeira, percussão e dança afro – que inclui também o maculelê e o samba de roda. O foco dos ensinamentos é a experimentação corporal, que pretende resgatar, por meio dos movimentos do corpo, as memórias que a capoeira transporta. Além disso, há uma grande preocupação em dar suporte para que se desenvolvam pesquisas acadêmicas e artísticas.

“Através das pesquisas dos alunos, nós estamos costurando uma história que aconteceu há 300 anos. A cultura é a fusão desta história, e ela está conosco, em nossos genes, mas fica adormecida dentro de nós. Por meio da musicalidade trazida pelo berimbau, canto e vozes dos tambores nós a despertamos”, conta o mestre Pinguim.

A busca pelo aprender e por formas de ensinar é algo constante, garante Pinguim, pois a capoeira coloca-se como um aprendizado infinito, no qual sempre há novas coisas. “Nós trabalhamos com algo lúdico e interminável, uma espécie de universo paralelo, pois é da nossa natureza e acontece de dentro para fora. Quando praticamos capoeira estamos em contato com nossos antepassados e a cultura se torna um estado de espírito”, relata.

Nós trabalhamos com algo lúdico e interminável, uma espécie de universo paralelo, pois é da nossa natureza e acontece de dentro para fora.

Thiago Mendes, conselheiro do núcleo e ex-aluno do curso de Ciências Sociais, frisa a importância dos trabalhos desenvolvidos como opção para a comunidade uspiana, uma vez que não há um curso específico sobre dança ou ritmos afro-brasileiros. Além disso, o núcleo possui parcerias com grupos da cidade de Santo Amaro da Purificação, no Recôncavo Baiano, para onde os alunos vão duas vezes ao ano estudar a cultura afro-brasileira.

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Entre as realizações do grupo, o mestre Pinguim destaca um projeto que teve início em 2012, o espetáculo de dança Cacimba de Aruanda: uma narrativa do Recôncavo. “A narrativa conta a história das ‘Marias’: as parteiras, benzedeiras, lavadeiras, nossas mães e avós”, descreve. A produção foi feita em parceria com a Associação dos Sambadores e Sambadeiras do Estado da Bahia (ASSEBA) e contou com apoio da PRCEU.

Encontro Iê, viva meu mestre!

Entre os dias 26 e 28 de agosto, o núcleo organizou encontros abordando a atuação dos mestres da capoeira e da cultura popular em diferentes espaços ao longo de suas vidas. Foram prestadas homenagens aos mestres e mestras convidados, reconhecendo a dedicação e importância dessas lideranças no processo de formação e desenvolvimento educacional do país. Entre os homenageados estavam o mestre Pinguim e o precursor na criação do núcleo, José Luiz Gabriel, o mestre Gato Preto.

Foto: Marcos Santos / Jornal da USP
Foto: Marcos Santos

De acordo com Thiago Mendes, a contribuição passada pelos mestres de capoeira vem de um processo de formação que está além da escola. “O desafio é que através dos ensinamentos destas pessoas se enxergue mais tolerância e diversidade. Queremos aguçar a curiosidade, para que todos saibam que temos poder de intervenção e escolha, nossos ancestrais nos mostram isso”, afirma.

Durante o evento foram realizadas oficinas de capoeira, apresentações artísticas, atividades lúdicas para o público infantil e outras ações. Um dos destaques foi o lançamento do documentário 15 anos de Senzala, que reconstrói a trajetória do Grupo de Capoeira Guerreiros de Senzala na USP, passando por suas referências culturais na Bahia até a criação definitiva do núcleo.

Mais informações: https://pt-br.facebook.com/nucleoafrobrasilusp

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