Pesquisadora da ECA busca na música do século 20 novas formas de ensino para a área

Com a meta de colaborar para o crescimento deste campo de conhecimento, a professora da ECA tem se dedicado aos estudos da obra do francês Olivier Messiaen (1908-1992) que, por sua vez, foi professor de José Antônio Rezende de Almeida Prado (1943-2010), compositor brasileiro estudado pela pesquisadora em seu mestrado.

Por Silvio Augusto Junior / Laboratório Agência de Comunicação (LAC) da ECA

Estudos contemporâneos da área de análise musical são os responsáveis por alimentar o debate teórico em torno do repertório do século 20. Além disso, novas técnicas têm sido criadas para melhorar a compreensão sobre o que foi composto nesse período, as quais permitem não apenas o aprimoramento teórico-musical, mas também a melhora da prática de instrumentistas que buscam referências sobre o assunto.

Com a meta de colaborar para o crescimento deste campo de conhecimento, a professora Adriana Lopes da Cunha Moreira, do Departamento de Música (CMU) da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP, tem se dedicado aos estudos da obra do francês Olivier Messiaen (1908-1992) que, por sua vez, foi professor de José Antônio Rezende de Almeida Prado (1943-2010), compositor brasileiro estudado pela pesquisadora em seu mestrado, cuja dissertação, intitulada A poética nos 16 Poesilúdios para piano de Almeida Prado: análise musical. Este trabalho foi agraciado com o primeiro lugar do I Prêmio José Maria Neves, instituído pela Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Música (ANPPOM) em 2003. “Por que Messiaen? Porque eu sou apaixonada pela obra do Almeida Prado. Messiaen foi professor de Almeida Prado, então eu queria entender a obra de Messiaen, porque foi a paixão de Almeida Prado, e aí eu precisava descobrir o que tinha de tão interessante nessa obra que conquistou o meu compositor.”

Responsável pelas disciplinas Percepção e Análise Musical, Adriana explica que estudar Messiaen foi decisivo para sua compreensão sobre o período da música chamado de pós-tonal, ao mesmo tempo em que constatou que suas pesquisas precisavam caminhar para o desenvolvimento de novas técnicas de análise, voltadas para o entendimento de outros repertórios, representantes das diversas tendências do século 20: “Meu doutorado me serviu para perceber que ainda tenho muito para aprender sobre análise musical, para que consiga interagir com um leque maior de tendências musicais do século 20. Assim guiei o fio condutor do que hoje é a minha linha de pesquisa.”

A harmonia pós-tonal é caracterizada pela formação de um discurso baseado em novas estruturas melódicas e harmônicas, somado a ritmos, texturas, dinâmicas e timbres. Diferente da harmonia tonal, onde os acordes são estruturados em intervalos relacionados entre si e que convergem para um mesmo ponto ou centro, na pós-tonal os acordes são independentes e variados e o tecido musical traz superposições de fragmentos, o que dá à música uma riqueza de detalhes.

Além de compositor, Olivier Messiaen foi organista da Igreja Trinité, de Paris, e professor de harmonia e composição no Conservatório da mesma cidade. Sua vasta produção inclui obras para serem executadas em diversos instrumentos, boa parte delas de inspiração mística com elementos exóticos.

José Antônio Rezende de Almeida Prado foi um dos alunos mais conhecidos de Messiaen. Professor de música na Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), compôs as Cartas Celestes n°8 para violino e orquestra, em homenagem aos 500 anos do Descobrimento do Brasil, entre outras obras importantes para a música brasileira do século 20. Além disso, também apresentou, durante anos, na Rádio Cultura FM, o programa de música contemporânea, Kaleidoscópio.

De acordo com Adriana, seu trabalho como orientadora também serviu e serve de apoio para aprimorar cada vez mais suas percepções sobre a música do século passado: “Não é possível colocar tudo no Currículo Lattes [documento onde os pesquisadores brasileiros registram sua produção], mas continuo estudando e aprendendo com as orientações. Descobri, por exemplo, que ainda preciso voltar ao Almeida Prado para continuar aprendendo com a obra dele.”

Pesquisa e ensino

Coordenadora científica do congresso geral da ANPPOM e editora de suas publicações, para prestar o concurso para professora da ECA Adriana fez um levantamento sobre todos os materiais sobre o ensino de percepção até então disponíveis no Brasil e no exterior. Nessa busca, descobriu dois pontos importantes: há pouca quantidade e pouco material com qualidade.

Em 2005, a ECA organizou uma comissão que fez um levantamento de todos os periódicos que eram lançados pelos departamentos que compõem a unidade. Plínio Martins, editor da EDUSP, na época era o presidente dessa comissão. Segundo a professora, havia periódicos científicos, mas não materiais que fossem didáticos, o que a deixava inquieta em relação ao seu trabalho em sala de aula.

Passado algum tempo, Adriana aceitou o convite para ser presidente da comissão de elaboração e realização da prova de aptidão em música de São Paulo do vestibular da FUVEST. Junto com o professor Marcos Lacerda, também do CMU, levou a ideia de traduzir o material que os professores do próprio Departamento de Música estavam utilizando em sala de aula – no caso, os seis volumes da obra Percepção Musical, do especialista em ensino, Bruce Benward – para a produção de um livro que tivesse o menor custo possível, como um incentivo para que os alunos do curso passassem a comprar os originais.

Foi quando Plinio Martins entrou em contato com a Editora Unicamp e fechou um acordo para a tradução e publicação no Brasil da obra de Benward. “Traduzi os dois primeiros, sobre percepção, e no terceiro farei a revisão com o Marcos Lacerda. Esses três serão lançados pela EDUSP. Os outros três livros ficarão a cargo da Editora Unicamp. Nós, que somos proponentes da série, participaremos até o final, mas a partir do quarto volume a responsabilidade será da Editora Unicamp”, explica.

A docente conta que tem recebido mensagens de professores de várias universidades brasileiras sobre a tradução feita da obra de Benward. Mas, para Adriana, as melhores notícias chegam quando professores de nível pré-acadêmico relatam suas experiências utilizando os livros já traduzidos. “Em países da Europa, por exemplo, esse conhecimento básico sobre percepção, harmonia e análise musical é ensinado ainda quando o músico é criança. Trazendo essa formação de base para a graduação, poderíamos empreender um trabalho de continuidade.”

Sobre a metodologia de ensino de música escolhida para ser traduzida e publicada pela EDUSP e Editora Unicamp, a professora ressalta os motivos de ter escolhido uma obra norte-americana: “Por que os métodos americanos? Porque nos Estados Unidos eles têm um problema que lembra um pouco o nosso. Eles recebem alunos do mundo todo, então precisam começar de um nível bastante fundamental para conseguir entregar o aluno para o mestrado com um conhecimento melhor consolidado.”

Com informações do Laboratório Agência de Comunicação da ECA 

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