Despertar o interesse dos alunos por temáticas relacionadas à ciência é um trabalho que demanda instrumentos que vão além dos tradicionais giz e lousa. Os livros didáticos também não conseguem suprir a necessidade de vivenciar ou participar da produção de um experimento e, apesar das atividades empíricas serem muito importantes para o ensino de ciências, muitas escolas não têm laboratórios equipados para realizá-las.
Tendo em vista este panorama, na década de 90, o Centro de Divulgação Científica de São Carlos (CDCC) da USP iniciou o projeto Experimentoteca, com a proposta de disponibilizar kits didáticos da área de ciências para a realização de experiências em sala de aula. O material é acondicionado em caixas de madeira e contém um roteiro de auxílio para os professores. A atividade pode ser trabalhada com grupos de 10 alunos e abrange temas como corpo humano, seres vivos, matemática, biologia e química. Os empréstimos podem ser agendados por telefone ou email. Os educadores devem conferir os kits e devolvê-los nas condições encontradas. Em alguns casos ocorre a reposição de alguns materiais consumíveis.
Com o tempo, a Experimentoteca foi difundida e reproduzida em outros centros científicos. Um deles foi a Estação Ciência, porém com o seu fechamento para reestruturação, o projeto foi transferido para a Escola de Artes, Ciências e Humanidades (EACH) da USP.
Atualmente, a Experimentoteca é gerida por um grupo de pesquisadores sob coordenação dos professores Luís Paulo Piassi e Emerson Izidoro dos Santos. “[O Projeto]é uma maneira de suprir a falta de laboratórios e materiais experimentais em sala de aula” afirma Piassi.
Materiais lúdicos na sala de aula
Além da Experimentoteca, os professores também realizam na EACH um outro projeto que envolve a disponibilização de material, o Ludoteca. A ideia é trabalhar a ciência em um universo mais amplo e diversificado, com debates de questões científicas a partir de jogos, histórias em quadrinhos, revistas, livros de ficção científica e músicas.
Os kits estão em fase de cadastramento. Segundo Piassi, alguns materiais são comprados e outros são incorporados ao acervo depois de serem usados em pesquisas financiadas pela USP ou pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).
O grupo também realiza intervenções em escolas, trabalhando com alunos do ensino infantil. Nas atividades, as crianças são envolvidas, a partir do universo lúdico, em temas como raciocínio lógico, astronomia e ecologia. Conceitos como presa e predador, por exemplo, são explorados nas histórias dos livros infantis e, às vezes, transformadas em peças de teatro.
As atividades que trabalham com lógica também são muito aceitas pelos alunos. De acordo com o professor, as crianças estão muito acostumadas com brinquedos de consumo, com os quais a ação delas é muito pequena. Os jogos lógicos incentivam a reflexão crítica e proporcionam uma relação mais ativa dos alunos com as atividades.
Outro projeto desenvolvido pelos pesquisadores é o Ciência Móvel, um museu itinerante de ciência levado para grandes eventos, como a Feira de Profissões da USP. Os materiais são disponibilizados na banca e o público interage com os objetos e ainda pode tirar dúvidas com os monitores e especialistas presentes no evento.
A Ciência e a Mídia
No ensino fundamental, há um trabalho relacionando à ciência com conteúdos presentes na mídia. Uma das equipes que participam do projeto trabalha com literatura de ficção científica. Os alunos participam de clubes de leitura e são instigados a discutir questões referentes à ciência a partir de trechos de filmes e vídeos.
A música também é usada como instrumento para o aprendizado. Segundo o professor, na década de 60, muitas bandas de rock trabalharam em suas canções a temática da corrida espacial. Trazer esse material para a sala de aula é uma estratégia interessante para se discutir questões sociais e econômicas atreladas ao campo científico, mostrando que a ciência pode ultrapassar a esfera laboratorial.
Um dos pesquisadores participantes do grupo estuda a representação da cientista mulher nas histórias em quadrinhos. Assim, propõe aos alunos atividades que visem discutir essas questões, incentivando-os a olharem para o conteúdo midiático de maneira crítica. Piassi afirma que há diversos estereótipos presentes no campo científico. Um deles é a representação da mulher cientista que, na maioria das vezes, assume um papel de subordinação. Já o homem cientista carrega o estigma da excentricidade e esquisitice. A ideia do projeto é levar os alunos a refletirem sobre essas questões.
Formação dos professores
Para o professor, o diálogo da Universidade com as escolas proporciona um espaço interessante para a discussão de diferentes recursos, que auxiliam os educadores a experimentarem novas práticas didáticas. Na EACH, por exemplo, os pesquisadores ofereceram um curso de formação para professores do Ensino Fundamental II com objetivo de apresentar as diferentes temáticas que podem estar atreladas à ciência.
Ainda há muitos desafios para se trabalhar, de forma ampla, os conteúdos científicos nas escolas. Os alunos em seus primeiros anos de formação, em geral, não são familiarizados com assuntos relativos à ciência. Para o professor, é importante que os profissionais da educação percebam que é possível trabalhar a ciência sem ser no campo disciplinar, e articulá-la também com o processo de alfabetização.
Para o ensino dos alunos, que já trabalham com ciência na sala de aula, Piassi cita a importância de se desatrelar a imagem dogmática e formulística associada ao campo científico e de “tornar ciência um pouco mais viva e conectada com o mundo”.
Mais informações: email experimentoteca.each@gmail.com