Estudo avalia saúde de baleias-jubarte na costa brasileira

Pesquisa realizada por Kátia Regina Groch na FMVZ analisou interação do animal com atividades humanas na região, com sua própria espécie, com animais predadores e qual o impacto na sua sanidade.

A partir de análises visuais, estudos de campo e autópsias, a pesquisadora Kátia Regina Groch estudou a saúde das baleias-jubarte (Megaptera novaeangliae) na costa brasileira. Em sua pesquisa realizada na Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia (FMVZ) da USP, ela analisou como se dá a interação do animal com as atividades humanas na região, com sua própria espécie, com animais predadores e qual o impacto na sua sanidade.

As baleias-jubarte são uma das 14 espécies de cetáceos da subordem dos Misticetos, os quais possuem barbatanas no lugar de dentes. Com até 16 metros de comprimento, sua grande nadadeira peitoral dá a elas o nome Megaptera— “grande asa”, em grego. Nascem no alargamento da plataforma continental brasileira, ao sul da Bahia e ao norte do Espírito Santo, onde se encontra o arquipélago de Abrolhos. Durante o verão, as baleias-jubarte, com um período de gestação de aproximadamente um ano, migram para a Antártida em busca de alimento e voltam ao Brasil no inverno, quando têm seus filhotes e se reproduzem.

Sob orientação do professor José Luiz Catão Dias no Laboratório de Patologia Comparada de Animais Selvagens (LAPCOM) da FMVZ, o estudo de Kátia identificou as baleias presentes na região entre 2008 e 2012 por meio de imagens do padrão de pigmentação branca na parte ventral da cauda, que difere de uma baleia para a outra. Dessa forma, a pesquisadora pôde acompanhar a evolução de cada um dos animais.

Em campo

Foram fotografados 622 animais em vida livre na primeira parte do estudo. A partir das imagens, Kátia observou lesões cutâneas superficiais e profundas, evidências de interações com artefatos de pesca e com animais de outras espécies, marcas de colisão com embarcações e até mesmo de interações entre as próprias baleias.

Um dos maiores índices foi de casos de bolhas, nódulos e manchas descoloridas na pele das baleias. Segundo a pesquisadora, tais lesões não são normais e possuem origem desconhecida. Elas podem indicar possíveis doenças e infecções, o que as torna bastante relevantes considerando que há ocorrência delas em mais de 53% das baleias estudadas.

“Vi muitos arranhões superficiais, que deixam a pele com riscos brancos, ou feridas na nadadeira dorsal e nas protuberâncias da cabeça das baleias. Provavelmente, são resultado de interação intraespecífica, que ocorre principalmente quando há a disputa entre os machos para acasalar com as fêmeas”, diz Kátia. Outros tipos de marcas, como riscos mais uniformes e de mesmo espaçamento ou pequenas mordidas em locais como a cauda, são indícios de interação com predadores como tubarões e orcas.

Contudo, talvez o fator mais alarmante seja a percentagem de 17,7% de animais com sinais de emalhe em artefatos de pesca. “Dependendo do tamanho da rede de pesca, pode ser pesada demais para o animal arrastar quando nada, fazendo ferimentos profundos em sua pele e extenuando-o de tal maneira que ele morre por não conseguir se deslocar e pela infecção da ferida”. Ela ainda revela que essas são apenas as baleias as quais sobreviveram e, portanto, esse número pode ser ainda maior, como é o caso daquelas com sinais de colisão com embarcações. “Muitas vezes, a interação delas com barcos e navios é fatal: uma hélice pode causar cortes profundos e até amputação”.

A pesquisadora também utilizou órgãos e ossos de baleias encalhadas por toda a costa brasileira. Por intermédio da autópsia desses animais, coletou e examinou amostras para identificar lesões e presença de bactérias ou vírus. Foram analisados os órgãos de 19 baleias, em sua grande maioria filhotes que encalharam ainda vivos.

Estudando os órgãos desses animais, Kátia concluiu que 73% deles possuía algum distúrbio relacionado ao nascimento, fazendo o filhote ter dificuldade respiratória. Foram encontradas, também, infecções bacterianas nas amostras, além de diversos sinais de trauma por choque com adultos, por predação e até estresse causado no momento em que o animal encalhou. Quando já em alto estágio de decomposição, Kátia analisou os ossos dessas baleias. A parceria com o Projeto Baleia Jubarte permitiu que pudesse incluir em seu estudo os esqueletos do acervo. Ela encontrou marcas de erosão nas articulações como as da artrite, desgaste de ossos, reação óssea por infecção ou por degeneração — como o caso da artrose — má formação óssea e fraturas.

Acompanhamento, manejo e monitoramento

A iniciativa de Kátia foi a primeira a levantar dados sobre a saúde das baleias-jubarte no Brasil, possibilitando o acompanhamento de cada uma delas. “Contudo, pesquisas ainda precisam ser feitas para elucidar algumas das lesões encontradas, as quais não possuem uma explicação”, disse Kátia.

Mais que isso, a pesquisadora acredita que os altos índices de sinais de interações entre o homem e as baleias devem servir de alerta. “É preciso que haja manejo e monitoramento das embarcações e animais na região para diminuirmos essas porcentagens de interações, prejudiciais às baleias e aos próprios pescadores”, completa.

Kátia já apresentou seu trabalho em conferências no Brasil, na África do Sul e na Nova Zelândia. Ela participa da 21st Biennial Conference on the Biology of Marine Mammals na cidade de São Fransisco, na Califórnia, em dezembro deste ano, no qual expõe seu estudo sobre as doenças encontradas nas baleias-jubarte encalhadas na costa brasileira.

Marília Fuller / Agência USP de Notícias

Mais informações: email katia.groch@gmail.com

 

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