Estudo da FMVZ avalia insensibilização de bovinos antes do abate

Pesquisa da FMVZ acompanhou o abate de 2.150 animais, a fim de verificar o nível de sucesso na insensibilização do animal, ou seja, impedir que ele sinta dor na hora do abate.

Valéria Dias / Agência USP de Notícias

Pesquisadores da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia (FMVZ) da USP realizaram o acompanhamento do abate de 2.150 bovinos em um frigorífico brasileiro de grande porte com o objetivo de analisar como era realizada a insensibilização desses animais. No processo de insensibilização utilizado, uma pistola hidráulica de dardo cativo penetrante é direcionada para um local na testa do animal e solta um dardo que penetra o crânio e dilacera uma região do cérebro. O estudo apurou que 4,8% dos 2.150 animais acompanhados continuaram apresentando sinais de sensibilidade mesmo após terem passado pelo processo que deveria insensibilizá-los.

Se aplicado no local correto, o método provoca morte cerebral instantânea e o boi fica insensibilizado, ou seja, não sente dor ao ser abatido. A pesquisa aponta que a calibragem correta da pistola e a o raio de distância do tiro em relação ao local recomendado para o disparo são os dois fatores que podem interferir neste processo.

“A pistola precisa estar muito bem calibrada e o funcionário que faz a aplicação precisa acertar o alvo, localizado no meio da testa do animal”, explica o professor Augusto Hauber Gameiro, do Departamento de Nutrição e Produção Animal (VNP) da FMVZ, em Pirassununga. “Quanto mais próximo do alvo o tiro for dado, maior é a chance de insensibilização; ao mesmo tempo em que, quanto mais distante do alvo, maior será a chance de o animal não ser insensibilizado, sendo necessário um novo tiro, o que causará sofrimento ao boi”, descreve.

Gameiro foi o orientador do projeto de iniciação científica da aluna Bianca Gonçalves da Costa, do curso de Medicina Veterinária da FMVZ. O trabalho contou com a participação de Beatriz Temponi e Claudia Pignatta de Macedo Ferreira, ambas graduandas em medicina veterinária. “O ineditismo desta pesquisa está no fato de ser o primeiro trabalho do gênero que buscou mensurar dados relativos à insensibilização de bovinos antes do abate”, conta. O Brasil é o maior exportador mundial de carne bovina e o segundo maior produtor de bovinos.

Os pesquisadores constataram que a calibragem correta da pistola hidráulica deve estar entre 160 e 190 psi (libra por polegada quadrada). E a distância do alvo deve ser próxima do zero. Se o tiro for dado a 1 centímetro do alvo, a probabilidade de o animal não ser insensibilizado é de, aproximadamente, 3%; se tiro for dado a 8 centímetros do alvo, a chance de não haver insensibilização é de 12%. “Porém, nem sempre é fácil calibrar a pistola corretamente, além de ela ser pesada, chegando a quase quinze quilos”, conta o professor, lembrando que “também é preciso levar em conta que o animal pode conseguir se mexer durante a aplicação do disparo”.

STEPS

A Sociedade Mundial de Proteção Animal (WSPA) confere treinamentos especiais para profissionais do setor, visando ao abate humanitário. O Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) mantêm um acordo de cooperação com a WSPA por meio do Programa Nacional de Abate Humanitário (STEPS), um programa de treinamento que visa ao bem-estar animal, “e que envolve as áreas de abate de bovinos, suínos e aves, com ênfase na aplicação das boas práticas de manejo pré e pós abate”. O abate humanitário é definido pela WSPA como “um conjunto de procedimentos que garantem o mínimo de estresse aos animais desde o manejo de embarque na propriedade rural até a operação de sangria no frigorífico, evitando o sofrimento”.

Entre esses procedimentos, estão o transporte correto, o desembarque tranquilo e um ambiente calmo para evitar que o animal fique estressado. Após o desembarque, o animal entra numa espécie de túnel estreito e uma esteira o leva até o local onde ele será imobilizado para a insensibilização. Neste momento, o funcionário responsável leva a pistola hidráulica até a região central da testa do boi, a fim de dar o disparo que vai insensibilizá-lo. O dardo perfura o crânio e volta para a pistola.

Segundo o professor Gameiro, “alguns frigoríficos de grande porte chegam a ter departamentos específicos e técnicos de equipes dedicadas ao treinamento de funcionários para a aplicação dos conceitos de bem-estar animal da WSPA”.

As pesquisadoras se basearam em parâmetros preconizados pela STEPS para avaliar se os animais haviam sido insensibilizados ou não, em, no máximo, 60 segundos após o disparo: reflexos oculares e palpebrais por pressão digital; presença de respiração rítmica; reação a dor por pressão da língua e do septo nasal; rigidez de mandíbula; movimento de orelhas; e vocalização.

Segundo o professor Gameiro, as orientações do programa de treinamento da STEPS geralmente são utilizadas pelos grandes frigoríficos, mas ainda não são seguidas pelas médias e pequenas empresas. O frigorífico onde foi realizado o acompanhamento dos animais tem certificação do Sistema de Inspeção Federal (SIF) e realiza comércio de carne bovina para os mercados interno e externo. A coleta de dados foi realizada em abril de 2011.

Mais informações: (19) 3565-4224, com o professor Augusto Hauber Gameiro

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