Efeito rebote ajuda a entender cura homeopática, aponta estudo da FMUSP

Cientista da Faculdade de Medicina descreve o efeito em fármacos para fundamentar cientificamente homeopatia.

Valéria Dias / Agência USP de Notícias

O efeito rebote de alguns medicamentos ‘alopáticos’ pode explicar o princípio de cura utilizado na homeopatia. É o que garante o médico e pesquisador Marcus Zulian Teixeira, da Faculdade de Medicina da USP (FMUSP), em seu artigo Immunomodulatory drugs (natalizumab), worsening of multiple sclerosis, rebound effect and similitude, publicado no final de julho no periódico britânico Homeopathy e disponível neste link.

“O artigo traz dados para a fundamentação científica do princípio de cura homeopático perante a farmacologia moderna. O fenômeno que a farmacologia clássica chama de ‘efeito rebote’ é o que a homeopatia utiliza como resposta terapêutica, uma ação secundária do organismo. Buscando despertá-la, é realizada a prescrição dos medicamentos homeopáticos. E as doses são ínfimas, pois têm o objetivo de estimular uma reação do organismo sem causar efeitos adversos”, explica Zulian Teixeira.

Medicamentos ‘alopáticos’ atuam a partir do “princípio dos contrários” — de forma contrária ou paliativa aos sintomas das doenças: anti-inflamatórios, antitérmicos, antidepressivos, antiácidos. Efeito rebote é o agravamento dos sintomas clínicos ocasionado pela suspensão abrupta desses medicamentos. É também chamada de “reação paradoxal ou secundária”: uma reação contrária do organismo, numa tentativa de manter a homeostase (equilíbrio fisiológico interno) alterada pelo fármaco, e que pode ocorrer com medicamentos que atuam contrariamente aos sintomas das doenças.

Na homeopatia, os medicamentos atuam a partir do “princípio da similitude”: toda droga capaz de despertar determinados sintomas em pessoas sadias pode ser utilizada para despertar uma reação curativa em pessoas doentes com os mesmos sintomas. “O tratamento utiliza substâncias que causam sintomas semelhantes aos das doenças, a fim de estimular uma reação do organismo contra os próprios sintomas”, esclarece. “O café, que causa insônia, é utilizado homeopaticamente para tratar a insônia; a camomila, que causa cólica, é utilizada homeopaticamente para tratar a cólica; a beladona, que causa febre, é utilizada homeopaticamente para tratar a febre, etc.”, esclarece. “Essa ação homeostática, vital ou secundária do organismo é cientificamente explicada pelo efeito rebote das drogas alopáticas”, defende.

Citando como exemplo a endometriose, que consiste na presença de células do endométrio (que revestem o útero) fora deste órgão, Zulian explica que a doença é estrogênio-dependente. “Os medicamentos alopáticos receitados para tratá-la inibem a produção deste hormônio, mas um dos efeitos colaterais é a masculinização das pacientes. Segundo a concepção homeopática, poderíamos pensar em receitar o estrogênio ultradiluído ou dinamizado, em doses infinitesimais para não causar agravamento da doença, com o intuito de despertar a reação curativa do próprio organismo”, explica.

Segundo o pesquisador, remédio homeopático pode ser qualquer substância (sintética ou natural) que cause sintomas em uma pessoa e seja empregado em conformidade com o princípio da similitude. O médico homeopata leva em conta os aspectos emocionais e psíquicos do paciente e o tratamento é individualizado.

Natalizumabe

Zulian realizou uma revisão de literatura a partir da análise de artigos científicos sobre o efeito rebote do natalizumabe, droga usada para tratar esclerose múltipla (EM). A doença auto-imune ataca o sistema nervoso central (SNC): os linfócitos T (anticorpos do organismo) se proliferam e ultrapassam a barreira hemato-encefálica, entram no SNC e destroem a bainha de mielina, a camada protetora dos neurônios. Sem a bainha de mielina, o neurônio pode ser comparado a um “fio desencapado” que não consegue transportar eficientemente os impulsos elétricos aos outros neurônios. Sem poder transmitir esses sinais elétricos, o SNC vai se degenerando, levando, progressivamente, à deficiência motora e consequente paralisia, podendo causar a morte. “Cerca de 2,5 milhões de pessoas em todo o mundo sofrem da doença”, diz o médico.

A esclerose múltipla não tem cura, mas o natalizumabe é um medicamento que reduz com eficácia a intensidade e a frequência das crises. A droga impede a migração dos linfócitos T até o encéfalo. Mas quando interrompida abruptamente, pode causar o efeito rebote em torno de 10% dos pacientes. “Estudos observacionais indicam que, em 2012, cerca de 100 mil pacientes utilizavam o natalizumabe; assim sendo, 10 mil deles poderiam estar suscetíveis ao efeito rebote”, aponta.

Efeito rebote

Antidepressivos, como a fluoxetina, são outro exemplo. Num primeiro momento, a droga diminui os sintomas, mas se a medicação é suspensa de forma abrupta, pode piorar os sintomas da depressão, e até levar à ocorrência de suicidalidade, que são pensamentos ou tentativas de suicídio. “Os antidepressivos causam 5 efeitos rebote de suicidalidade em cada mil adolescentes por ano / uso, acometendo em 2007, apenas nos EUA, cerca de 16.500 jovens”, alerta.

Para o pesquisador, é preciso informar os profissionais de saúde e a população sobre os problemas de saúde que o efeito rebote pode causar. “Uma maneira de evitá-lo é retirar a droga lentamente, pois a interrupção abrupta pode estimular essa reação secundária”, finaliza.

Mais informações: email mzulian@usp.br, com Marcus Zulian Teixeira ou sites www.ncbi.nlm.nih.govwww.homeozulian.med.br e www.novosmedicamentoshomeopaticos.com

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