Projeto da FMUSP traz perfil de crianças que não respiram sozinhas

Levantamento da FMUSP aponta os problemas e os desafios de pacientes internados em hospitais

Fernando Pivetti / Agência USP de Notícias

Um estudo desenvolvido na Faculdade de Medicina da USP (FMUSP) revelou que crianças que não têm capacidade de respirar sozinhas e, portanto, necessitam de um aparelho que as auxilie a respirar — ventiladores mecânicos — permanecem por longo tempo internadas. Segundo observações do médico pediatra Milton Hanashiro, autor da pesquisa, o tempo médio de internação atingiu a marca de 194 dias. “Dentre os pacientes analisados, havia uma criança que já estava há 10 anos internada”, salienta o médico, que também aponta o elevado grau de dependência dos pacientes para cuidados como alimentação, higiene, vestimenta e locomoção.

Milton também conclui que os pacientes que sofrem da dependência para respirar são afetados por uma variedade de enfermidades de base. “Verifiquei 30 diferentes doenças de base nestas crianças, com nítida predominância das doenças neurológicas, principalmente encefalopatia hipóxico-isquêmica, doenças neuromusculares”, afirma o pesquisador.

Durante os levantamentos, foram estudadas crianças internadas no Hospital Auxiliar de Suzano (HAS) — localizado em Suzano, na grande São Paulo, e que integra a Divisão do Hospital das Clínicas (HC) da FMUSP —,  no período de 2001 a 2010. Para as pesquisas, foram observados diagnósticos de doenças crônicas graves e a presença de limitações funcionais importantes, como a incapacidade de alimentar-se, higienizar-se, vestir-se e locomover-se. “Também observamos a utilização de recursos de saúde, como leitos hospitalares, e as necessidades extras de cada família de paciente”, completa Hanashiro.

Doenças-base

As doenças de base são aquelas que contribuem para a manifestação das dificuldades de respiração no paciente. Dentre elas, as mais comuns são as doenças neuromusculares, em que a criança vai perdendo a força dos músculos progressivamente, as doenças do sistema nervoso central, como a encefalopatia hipóxico-isquêmica, em que falta oxigênio ao cérebro, e a hidrocefalia e as doenças cardíacas congênitas, em que a criança nasce com malformação do coração ao nascimento, como na hipoplasia do coração esquerdo.

Completam a lista as doenças metabólicas, em que a incapacidade do organismo em fabricar uma enzima celular impede o desenvolvimento adequado do sistema nervoso e as neoplasias (cânceres) do sistema nervoso. “Essas crianças, pela necessidade de recursos tecnológicos, permanecem internadas nos hospitais por muito tempo, geralmente em UTIs pediátricas. Dependendo da doença, há crianças conscientes, e outras não”, completa o médico.

Tempo de internação

Os longos de períodos de internação das crianças para tratamento da doença foi um dos pontos mais enfatizados pelo pesquisador. Segundo ele, esse dado reflete a necessidade de recursos complexos que muitas vezes não estão disponíveis nas residências e nos hospitais regionais.

Para Hanashiro, o principal ponto de trabalho deve se concentrar na diminuição desse período dentro do hospital. “Do ponto de vista das crianças e suas famílias, o longo tempo de internação é algo que todos gostariam de evitar. O distanciamento do paciente de suas famílias enfraquece os vínculos afetivos”, afirma. “Quando um dos pais acompanha a criança, afasta-se do cônjuge e dos outros filhos, ocasionando fragmentação da família. Além disso, a qualidade de vida no hospital, por melhor que sejam os cuidados, é muito limitada”, completa.

Ele também ressalta as dificuldades dos hospitais mais estruturados em abrigar todos os pacientes que sofrem da doença. “Para os hospitais, o longo tempo de permanência ocasiona problemas. A diminuição na disponibilidade de leitos reduz a capacidade de internar novos pacientes, principalmente os mais graves, que precisam das UTIs”, constata. “Isto atinge diretamente a comunidade, que se vê com menor disponibilidade deste recurso concorrido, escasso e caro, que é o leito de UTI nos hospitais públicos”. Hanashiro ressalta ainda a necessidade de alternativas de internação, como a Unidade de Pediatria do HAS, e também o cuidado domiciliar, por intermédio de “serviços públicos que propiciem ventilação mecânica domiciliar, ainda pouco explorados no SUS”.

Mais informações: email mihanashiro@usp.br, com Milton Hanashiro

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