Economias de aglomeração podem ampliar desigualdade espacial

Estudo apontou que as economias de aglomeração geram incentivos para ampliar a desigualdade espacial.

Um dos principais fatores que determinam como a renda se altera é o mercado de trabalho. Partindo desse pressuposto, a pesquisadora do programa de pós-graduação em economia da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade (FEA) da USP, Ana Barufi, procurou entender, em sua tese de doutorado, como o mercado de trabalho se relaciona com o desenvolvimento local. Barufi estudou de que maneira o tamanho da cidade afeta a produtividade local, e a relação do mercado de trabalho nos municípios, considerando as dinâmicas entre cidades maiores e menores. O estudo apontou que as economias de aglomeração geram incentivos para ampliar a desigualdade espacial.

Na primeira parte da pesquisa, foram analisados quais setores se beneficiam por estarem localizados em um centro maior ou menor. Em cidades maiores, existem vantagens, como mais oferta de mão de obra e a possibilidade de interação com outras empresas, mas também custos maiores, denominados “custos de congestionamento”, decorrentes do trânsito nas grandes cidades ou dos preços mais elevados dos imóveis, por exemplo. “As vantagens precisam se sobrepor aos custos. Setores que exigem mão de obra mais qualificada, como os de alta tecnologia, têm mais vantagem ao estar em grandes centros”, explica Ana Barufi. “Para determinado setor, é bom estar em uma aglomeração em que existam diversas empresas parecidas, enquanto para outros setores é melhor ser o único a produzir determinado produto”. Para chegar a essas conclusões, Ana comparou a produtividade — que, segundo diz, tem como medida indireta os salários — dos setores quando localizados em municípios maiores ou menores, usando dados do painel da Rais.

Em seguida, a pesquisa acompanhou a trajetória dos trabalhadores, observando quem migrou, os fatores que os fizeram decidir migrar, e o que aconteceu depois dessa primeira migração — se houve retorno, permanência ou nova migração para outro centro. Ana percebeu um processo de seleção positiva de trabalhadores mais qualificados para migrar: “Quem decide migrar geralmente são as pessoas que estão mais propensas a correr riscos, mais empreendedoras; você vê isso pela posição que elas tinham anteriormente no mercado de trabalho e por sua qualificação”, afirma a pesquisadora. “Das cidades menores para as maiores, você tem um fluxo de gente mais qualificada”. De acordo com Ana, no segundo movimento de migração, quem decide voltar são as pessoas menos qualificadas, que podem ter tido uma experiência negativa.

Ganhos no futuro

Analisando a experiência de trabalhadores em cidades maiores ou menores, a pesquisadora verificou ainda qual seria seu ganho salarial no futuro. “Em ganho salarial, geralmente, se beneficiou quem mudou para uma cidade com, pelo menos, o mesmo tamanho da cidade onde ela morava anteriormente”, resume Ana Barufi.

Na última parte da pesquisa, ela se dedicou a demonstrar como o tamanho da cidade afeta a relação de barganha entre trabalhadores e empresas, e criou uma curva de salários (wage curve) detalhada para o Brasil. A curva de salários relaciona taxa de desemprego com nível de salários. Ela explica que, se a taxa de desemprego sobe, os salários tendem a cair.

Ana Barufi destaca que o Brasil tem algumas particularidades que afetam esse poder de barganha, tal como a existência de um forte setor informal e os diferentes níveis de urbanização. “No setor informal, como é de se esperar, é mais fácil ajustar os salários. Em centros menores, as firmas têm maior poder sobre os salários, o que também geraria mais flexibilidade”, segundo Ana. Ela diz que as economias de aglomeração, ou seja, os grandes centros, geram custos mais altos para as firmas, sendo que parte deles se devem ao fato de que os trabalhadores conseguem barganhar melhor seus salários..

“Dado que, em cidades maiores, se concentram empresas de setores mais tecnológicos — que exigem maior qualificação dos trabalhadores — e de que os trabalhadores se auto selecionam para esses centros, onde conseguem barganhar maiores salários, as economias de aglomeração geram incentivos para ampliar a desigualdade espacial”, conclui a pesquisadora. Ela entende que nesses centros há incentivos, senão para crescer em tamanho, pelo menos para se tornarem cada vez mais qualificados em relação ao restante do País, e com salários mais elevados. “Se você deixar o mercado atuar da maneira que bem lhe aprouver, sem impor limites, você tem indicativo de crescimento de desigualdade regional”, pontua.

Para combater essa desigualdade, Ana destaca a necessidade de iniciativas para desenvolvimento local, com o intuito de atrair trabalhadores mais qualificados e, principalmente, para reter a mão de obra em centros menores. A criação de focos de alta tecnologia, como o Porto Digital em Recife, e de Universidades dispersas dos grandes centros, seriam algumas delas. Além disso, ela cita a importância da criação de centros consumidores: “Isso não vai atrair as empresas maiores, mas pode começar a gerar centros um pouco maiores em oportunidades”.

O estudo Economias de aglomeração e mercados de trabalho no Brasil foi orientado pelo professor Eduardo Amaral Haddad. Durante o doutorado, Ana Barufi fez parte dos estudos na Arizona State University e na Vrije Universiteit Amsterdam, onde teve extensa orientação do professor Peter Nijkamp, que é coautor dos três papers da pesquisa. O professor veio à FEA para participar da banca, no dia 24 de novembro. Além disso, realizou encontros com alunos e apresentou palestras junto ao Núcleo de Economia Regional e Urbana da Universidade de São Paulo (NEREUS). O período em que Barufi ficou na Holanda ainda lhe rendeu um convite para participar da recém fundada Regional Science Academy.

Letícia Paiva / Assessoria de Comunicação da FEA

Mais informações: email ana.barufi@gmail.com

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