Lei de Migração é discutida por especialistas em Audiência Pública

Em continuidade às discussões acerca do anteprojeto de lei para as imigrações, aconteceu na Casa de Cultura Japonesa uma Audiência Pública para a apresentação e discussão da proposta
Foto: Marcos Santos / USP Imagens
Foto: Marcos Santos / USP Imagens

Os olhares do mundo estão voltados ao Brasil que, em ano de Copa e com as Olimpíadas cada vez mais próximas, torna-se atrativo às imigrações internacionais. Desde 2010, recebemos em nossas fronteiras ondas imigratórias de haitianos que se aproximam dos grandes centros em busca de oportunidades e trabalho, mas se deparam – assim como tantos outros imigrantes que compõem o cenário social brasileiro hoje – com os mais diversos entraves, resultado do despreparo dos serviços públicos para recebê-los e assisti-los. O Estatuto do Estrangeiro vigente hoje os vê como ameaça, reflexo do período em que foi escrito, durante a Ditadura Militar.

Para repensar esta lei, que trata dos assuntos referentes aos imigrantes no Brasil, e tornar a relação entre Estado e estrangeiros mais acolhedora, uma Comissão de Especialistas foi organizada pelo Ministério da Justiça. O grupo é formado por pesquisadores e membros de universidades brasileiras, e a USP está presente com os professores Deisy Ventura, Pedro Dallari, André de Carvalho Ramos e Rossana Rocha Reis.

Dando continuidade às discussões acerca do anteprojeto de lei que trata das imigrações, aconteceu no dia 6 de maio, na Casa de Cultura Japonesa da USP uma Audiência Pública para apresentação e discussão da proposta, onde os acadêmicos puderam ouvir sugestões e críticas de membros de coletivos, ONGs e grupos que atuam diretamente com os imigrantes.

Estrangeiro e Imigrante

Foto: Pedro Bolle / USP Imagens
Foto: Pedro Bolle / USP Imagens

O próprio nome da lei vigente já revela seu anacronismo. Os especialistas explicam que, ao tratar o imigrante como um estrangeiro, distante e perigoso, o estatuto dá voz ao preconceito que os cerca.  O diretor do Departamento de Estrangeiros do Ministério da Justiça, João Guilherme Xavier, conta que a história das políticas para os estrangeiros é bastante ostensiva. Reforça também que a formação desta comissão busca discutir o desenvolvimento do anteprojeto a partir de uma perspectiva mais plural.

O anteprojeto surge como um paradigma que busca se assemelhar às movimentações latino-americanas neste sentido – como as leis argentina e uruguaia – em oposição às referências americanas e europeias que são excludentes e protecionistas. Xavier garante que, além desta discussão acadêmica acerca da lei, ela será levada posteriormente às casas legislativas e assume que “vamos ter que estar preparados para um debate bastante longo e profundo”.

Para Xavier, a lei discutida pela comissão não quer, de forma alguma, domar os fluxos migratórios, mas legalizá-los. Rossana Reis, professora do Departamento de Ciência Política da Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas (FFLCH) e do Instituto de Relações Internacionais (IRI) da USP, integra a comissão ao lado da porta voz da mesa, Deisy Ventura (IRI). Sobre a proposta, Rossana acredita que o grupo conseguiu alterar a lógica dos dispositivos legais de forma a simplificar e desburocratizar o sistema de imigração. A proposta prevê, para este fim, a criação de uma Autoridade Nacional Migratória subordinada ao Ministério da Justiça.

O que vai mudar?

Foto: Pedro Bolle / USP Imagens
Foto: Pedro Bolle / USP Imagens

Um dos pontos levantados pela professora, é a criação do capítulo de introdução da lei. Nele, explica Rossana, estão presentes os princípios que norteiam todo o anteprojeto: a criação de uma lei que preze pelos direitos humanos em oposição ao Estatuto vigente, instaurado durante a Ditadura militar, que apresenta o estrangeiro como um inimigo que oferece riscos à nação. “Nosso trabalho tenta acrescentar à lei características presentes na Constituição de 1988”, explica, mas os direitos políticos – como o direito ao voto – não são abordados neste anteprojeto, por requerer uma emenda constitucional.

A proposta, ressalta Rossana, é inovadora ao reconhecer os direitos dos povos originários – indígenas – que encaram as questões fronteiriças de uma maneira diferente, além de dar direitos aos povos de regiões de fronteira sem a necessidade da naturalização para a utilização dos serviços públicos brasileiros. O anteprojeto abre os olhos, também, para a possibilidade de que imigrantes possam buscar empregos no país.

Atualmente, os pedidos de residência são concedidos apenas aos estrangeiros que já tenham emprego confirmado ou que venham ao país para estudos. Com a nova resolução, será concedida ao imigrante a possibilidade de entrar no país e permanecer aqui legalmente, por um ano, sem a comprovação de vínculo empregatício.

Por se tratar de uma audiência pública, todos os cidadãos foram convidados a participar da produção do anteprojeto. Para quem não pôde participar presencialmente da sessão, foi aberto um canal em que todos os interessados em colaborar com comentários e ressalvas à lei possam enviar suas sugestões. Até o dia 23 de maio, o email anteprojeto.migracoes@gmail.com recebe colaborações.

Após este período, espera-se que o texto possa estar mais amadurecido e que consiga ser apresentado na primeira Conferência Nacional sobre Migrações e Refúgio (Comigrar), entre os dias 30 de maio e 1º de junho, para depois ser entregue ao Ministério da Justiça, que encaminhará a proposta ao Legislativo.

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