Modelo avalia qualidade do processo de conversão de energia no corpo humano

Pesquisa poderá contribuir, no futuro, com diagnósticos médicos e na análise do desempenho esportivo.

Valéria Dias / Agência USP de Notícias

Pesquisa da Escola Politécnica (Poli) da USP resultou em um modelo para avaliar a qualidade do processo de conversão de energia no corpo humano e seus subsistemas, assim como nos processos bioquímicos do metabolismo. O trabalho foi realizado pelo engenheiro mecânico Carlos Eduardo Keutenedjian Mady em seu doutorado direto, sob a orientação do professor Silvio de Oliveira Junior, do Departamento de Engenharia Mecânica da Poli, e co-orientação do professor Paulo Saldiva, da Faculdade de Medicina (FMUSP) da USP. A pesquisa poderá auxiliar nos diagnósticos médicos e na análise do desempenho esportivo.

“Esta pesquisa parte da ideia de entender o corpo humano como uma máquina térmica, algo semelhante a uma turbina, um motor ou uma termelétrica”, explica Mady, lembrando que o corpo humano, assim como uma turbina, um motor ou uma termelétrica apresenta um determinado desempenho durante a produção de energia.

O pesquisador desenvolveu um modelo computacional do corpo humano que leva em conta diversos fatores como metabolismo celular, reação de nutrientes, hidrólise, formação de ATP (trifosfato de adenosina, combustível para todas as atividades realizadas pelo corpo humano), trocas de energia com o ambiente, suor na pele, radiação, convecção (troca de energia entre uma superfície e um meio externo), troca de energia na respiração e cálculo do trabalho executado durante a corrida. Para construir o modelo, Mady levou em conta os parâmetros encontrados em 11 corredores que participaram da pesquisa.

O modelo desenvolvido por Carlos Mady foi aplicado em um outro modelo computacional, ligado ao sistema térmico do corpo humano, desenvolvido pelos professores do departamento de Engenharia Mecânica da Poli, Maurício Silva Ferreira e Jurandir Itizo Yanagihara. “Este modelo mostra a distribuição de temperatura do corpo humano de acordo com as condições do ambiente, como temperatura e umidade”, explica Mady.

Conforto térmico e hipotermia

Com a combinação dos dois modelos, foi possível propor um indicador de conforto térmico, condição que pode ser entendida como “o estado de espírito individual que reflete a satisfação com o ambiente térmico que envolve a pessoa”. Mady explica que, de acordo com a literatura científica, o conforto térmico é algo subjetivo, pois cada pessoa apresenta uma resposta diferente a uma mesma temperatura e umidade. Com a junção dos dois modelos computacionais, é possível “individualizar” o conceito de conforto térmico.

O engenheiro explica que, durante a realização de procedimentos cirúrgicos, muitas vezes é preciso utilizar o recurso de hipotermia (quando a temperatura do corpo humano fica inferior a 37 graus Celsius) como mecanismo de neuroproteção. “Nós simulamos, no modelo computacional, três técnicas distintas utilizadas em Medicina para a indução de hipotermia. Ao aplicarmos os indicadores que levam em conta a qualidade da energia, obtivemos os melhores parâmetros para utilização de cada técnica”, esclarece. Este resultado poderá contribuir com os protocolos médicos utilizados para a indução de hipotermia.

Testes práticos

Participaram da pesquisa 11 corredores, desde aqueles que corriam 2 vezes por semana, até os que corriam 5 vezes na semana. Esta etapa foi realizada com o Grupo de Medicina Esportiva da Faculdade de Medicina da USP (FMUSP) com participação do pesquisador Cyro Albuquerque, do Centro Universitário da FEI. Carlos Mady realizou vários testes ergoespirométricos, para avaliar o nível de performance dos atletas, como frequência cardíaca, produção de gás carbônico, limiar de lactato e VO2 máximo (capacidade máxima do corpo em transportar e metabolizar oxigênio durante um exercício físico). Os atletas foram avaliados antes e depois das corridas. O engenheiro mediu a temperatura interna desses corredores, além das costas, do antebraço e da panturrilha, verificou o peso corporal antes e depois dos treinos, e as condições ambientais de temperatura e umidade do local onde ocorriam os treinos.

O engenheiro explica que os carboidratos, lipídios e proteínas presentes nos alimentos que ingerimos são oxidados pelo organismo e transformados em ATP. Os resultados dos testes práticos mostraram que os corredores mais bem treinados usam com maior eficiência a energia disponível no ATP em forma de trabalho. “Os corredores mais bem treinados apresentaram maior eficiência térmica pois tiveram um maior VO2 máximo e um limiar de lactato maior”, diz.

Os dados das medições e dos testes nos corredores serviram de base para a construção do modelo computacional proposto por Mady. Na comparação entre os resultados obtidos nos testes práticos e os resultados fornecidos pelo modelo computacional, foi constatada uma similaridade. “Mas ainda é preciso testar o modelo computacional em um número maior de corredores para considerá-lo como um elemento que mostra, com precisão, o desempenho esportivo de atletas”, adverte o pesquisador, lembrando que este será o próximo passo da pesquisa.

A tese Desempenho termodinâmico do corpo humano e seus subsistemas. Aplicações à medicina, desempenho esportivo e conforto térmico foi defendida em dezembro de 2013 e recebeu Menção Honrosa na última edição do Prêmio Tese Destaque USP. O trabalho foi premiado também com duas outras Menções Honrosas: a do Prêmio da Associação Brasileira de Ciências e Engenharia Mecânica (ABCM/Embraer) e no Prêmio Capes de Teses 2014.

Mais informações: email cadumady@gmail.com, com Carlos Eduardo Mady

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