Letícia Sakata / Laboratório Agência de Comunicação da ECA
Com o objetivo de identificar as estratégias de atuação utilizadas por gravadoras e artistas independentes no cenário britânico, o professor Eduardo Vicente, do Departamento de Cinema, Rádio e Televisão (CTR) da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP, realizou um estudo em Birmingham, no Reino Unido, entre os meses de outubro de 2013 e fevereiro de 2014. Neste período, pesquisou o cenário musical independente de Birmingham e Londres através da School of Media da Birmingham City University (BCU).
Os resultados e desenvolvimentos desse período sabático, que foi supervisionado pelo professor inglês Andrew Dubber, foram apresentados no primeiro Seminário de Difusão de Produção Científica da ECA.
O universo do mercado da música não é um objeto inédito para Vicente. Em 2002, defendeu sua tese de doutorado sobre a indústria fonográfica brasileira da década de 1990, utilizando como exemplos os artistas da Lira Paulistana.
Uma das primeiras constatações feitas pelo professor foi a mudança de rumo sofrida pela pesquisa. As estratégias de gravadoras e artistas deixaram de ser seu principal foco de pesquisa, dando maior espaço para as condições do mercado musical independente. Ademais, ele conta que procurou entender como foi feita a transição do CD para a música digital (MP3), buscando estabelecer comparações entre o mercado brasileiro e o britânico.
Para ele, o Brasil destoa do cenário internacional em vários aspectos. Por exemplo, aqui a mudança foi mais brusca e acarretou em consequências maiores no mundo da música nacional, enquanto no Reino Unido, a transição foi suavizada. Através de seu estudo, Vicente pôde levantar algumas hipóteses para esse grande contraste.
A partir dos anos 1990, a indústria musical brasileira passou a ser mais seletiva quanto a quais gêneros musicais seriam colocados no mercado. Selos independentes tiveram seu espaço reduzidos, enquanto gêneros de maior vendagem, como funk, axé e sertanejo, cresciam cada vez mais no mercado. No Reino Unido, isso nunca aconteceu, garantindo a constante renovação do mercado através do que ele chama de “sistema aberto”, na qual um artista surge no cenário independente e, aos poucos, consegue maior visibilidade mercadológica.
Por conta disso, o mercado de música independente brasileira passou a ser visto como de oposição, enquanto no exterior, o setor independente continuava forte mantendo relações com as grandes gravadoras, o que lhe dava maior legitimidade. Essa diversidade musical também transparecia na crítica musical britânica, conta Vicente. A própria BBC, além da revista NME e o jornal The Guardian, possuem uma crítica especializada que abrange todos os gêneros musicais, inclusive aqueles que estão florescendo no setor independente, enquanto a mídia brasileira se atém ao que é lançado pelos grandes selos.
Além disso, ele conta que “há algumas teses falando do fim da indústria e, ao mesmo tempo e talvez pelo contexto nacional, um discurso sobre o distanciamento do mercado. Como determinados setores da produção musical não são mais atendidos pelo mercado formal de música e estão buscando outras vias, como apoio governamental, editais e coletivos”.
Ou seja, no Brasil, as grandes gravadoras continuam dominando o mercado, mesmo que haja uma queda considerável na venda de discos em comparação à década de 1990. Vicente conta que há um foco maior no mercado de shows dos gêneros que mais agradam ao público, e que isso compensa a queda de vendas de álbuns físicos.