Kátia Kishi
Neste mês de novembro, o Portal de Revistas da USP completa seus seis anos de acesso aberto das revistas científicas publicadas pela universidade. Referência internacional no modelo de publicação, o Portal está entre os três maiores repositórios da América Latina, como citado no artigo “Universidades y acceso abierto: hora de tomar protagonismo”, publicado em outubro na Revista Iberoamericana CTS pela coordenadora do Programa de Acesso Aberto do Conselho Latino Americano de Ciências Sociais (CLACSO), Dominique Babini. Até o fechamento desta matéria, o Portal contabilizou cerca de 5,7 milhões de downloads dos 129 periódicos da USP em 2014.
De acordo com Jorge Mancini Filho, atual presidente da Comissão de Credenciamento do Programa de Apoio às Publicações Científicas Periódicas da USP, o destaque do Portal é reconhecido pelo seu crescente número de acessos e revistas publicadas. Em 2013, por exemplo, 600 mil downloads foram registrados no sistema com 114 revistas publicadas no período; segundo a chefe técnica do Sistema Integrado de Bibliotecas (SIBi) da USP, Mariza do Coutto, “os números de acessos e downloads verificados apresentam crescimento contínuo e mesmo exponencial, devendo chegar até o final deste ano a um aumento de quase dez vezes quanto ao número de downloads em relação ao ano anterior”.
Entre os fatores que contribuíram para o crescimento do repositório nestes seis anos, Mancini Filho acredita ser importante a ideia de integrar em um mesmo site institucional as suas revistas: “Para o cidadão, a existência do Portal de Revistas da USP facilita enormemente a localização dos periódicos científicos editados pela Universidade”. O presidente também ressalta o progresso no relacionamento com os editores das revistas, pois a participação no Programa de Apoio às Publicações Científicas Periódicas da USP ocorre de forma voluntária.
Adalberto Pessoa Junior, presidente da Comissão de Credenciamento do Programa de Apoio às Publicações Científicas Periódicas da USP de 2010 a 2012, considera essa a principal vitória do portal nestes últimos anos. “De alguma forma o Portal de Revistas facilitou a identificação de inúmeras demandas e fomentou a revisão do escopo do Programa, além de oferecer uma grande visibilidade para as revistas, muitas das quais eram desconhecidas dentro da própria Universidade. Hoje o Portal é reconhecido no Brasil e no exterior como uma iniciativa de acesso aberto que deu certo”, complementa.
A revista Rumores, publicação da Escola de Comunicação e Artes (ECA) da USP, já estava inserida em outro portal, o Univerciência, também de acesso aberto, mas a editora Rosana Moraes confirma que o Portal facilita o acesso aos conteúdos e pesquisas. A Rumores saltou de 387 downloads em janeiro deste ano para 3.377 em novembro.
Segundo uma das idealizadoras do projeto que compunha a chefia técnica do SIBi-USP no período, Adriana Cybele Ferrari, o Portal surgiu como uma ampliação de apoio aos editores que sofrem pressão de integrarem o Portal SciELO (Scienficic Eletronic Library Online), um dos maiores repositórios de acesso aberto do mundo, mas, mesmo possuindo os requisitos exigidos para serem indexadas, não conseguiram o ingresso. Com base na filosofia do acesso aberto, foram formalizadas políticas para que a instituição estruturasse um modelo próprio e similar ao da SciELO para reunir o máximo de revistas da USP.
Helena Ribeiro, editora do periódico Saúde e Sociedade da Faculdade de Saúde Pública (FSP-USP) e Associação Paulista de Saúde Pública, considera importante a inserção das revistas no Portal institucional mesmo que já estejam indexadas no SciELO como sua revista: “Primeiramente, dá mais visibilidade e divulga resultados de pesquisa à sociedade, segundo, fomenta o desenvolvimento científico e tecnológico, terceiro, propicia desenvolvimento de diálogo científico e estabelecimento de parcerias nacionais e internacionais”. A revista, que tinha uma tiragem de 500 exemplares impressos passou a ter cerca de 20 mil downloads por mês só no Portal da USP, sendo o quinto periódico da universidade com mais acessos. “O Portal deve continuar a incluir os periódicos científicos da universidade, orientando-os previamente a atender critérios de boas práticas: periodicidade em dia, revisão por pareceristas externos, não endogenia, etc. Parabenizo muito a iniciativa”, defende.
Reestruturação
Em 2012, o Portal foi reestruturado com alterações em sua tecnologia, passando a integrar a rede de portais de revistas científicas que utilizam o Open Journal Systems, open source desenvolvido pela University of British Columbia, Stanford University e Simon Fraser University Library no âmbito do Public Knowledge Project para a construção e gestão de periódicos eletrônicos. Segundo Sueli Ferreira, Chefe Técnica do SIBi-USP desse período e atual Professora Titular da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto (FFCLRP), um dos principais motivos para a migração foram as falhas do sistema SciELO que não retornava análises bibliométricas dos artigos e citações. Assim, o novo Portal passou a ser interoperável com sistemas similares, por exemplo, com o Google Acadêmico. Entre outros benefícios da atual tecnologia empregada, Mancini Filho exemplifica que o Open Journal Systems “permite a automação de todo o processo editorial, permitindo-nos ter mais informações de como os periódicos são administrados e produzidos pelos editores em suas Unidades de origem”.
Outra mudança destacada por Sueli Ferreira, neste período de transição, foi a grande adesão dos periódicos (em 2011 o Portal tinha 64 revistas publicadas e terminou 2012 com 104) no Programa de Apoio às Publicações Científicas Periódicas da USP. A equipe passou a “trabalhar de maneira mais focada na qualificação e melhoria dos periódicos, observando suas características e peculiaridades conforme as áreas de atuação, o nível de cientificidade adotado, a abrangência e impacto nacional e internacional. A somatória desses itens, certamente, resulta em demandas e necessidades distintas entre elas”. Segundo ela, o orçamento do Programa mais do que duplicou de 2010 a 2013; em 2010 era de quase R$ 1 milhão e, a partir de 2013, passou a ser de R$6 milhões, sendo que em 2014 mais de R$3 milhões vieram de recursos do Programa de Apoio às Publicações Científicas Periódicas da USP, quase R$1,5 milhão de recursos da USP e o restante de outras fontes. Esse aumento orçamentário veio ao encontro das demandas dos editores, o que facilitou a oferta de inúmeros serviços necessários como a infraestrutura de informática, treinamentos, o apoio para participação em eventos internos ou externos, além do contrato com a CrossRef, associação que desenvolve infraestrutura em comunicação acadêmica, para a inclusão do registro DOI (Digital Object Identifier) para os artigos científicos.
Adalberto Pessoa Junior relembra que em 2008, o Portal não contava com uma equipe exclusivamente dedicada à gestão e atendimento aos editores, o que foi conquistado nos anos seguintes, bem como a participação da comunidade acadêmica. “Em uma universidade tão grande quanto a USP contar com o apoio da comunidade é fundamental para o sucesso de qualquer iniciativa de caráter institucional.
Felizmente também conseguimos avanços nesse aspecto”, afirma. Atualmente, integram no Portal de Revistas da USP 129 periódicos científicos, sendo 23 encerradas e 106 correntes, com um total de 4.025 fascículos e 62657 artigos. Em decorrência das políticas digitalização de acervos pelo SIBi-USP, também é possível ter acesso a várias coleções completas, como a Revista de Medicina, que nasceu em 1916 (antes do surgimento da USP em 1934) e circula também no formato impresso até hoje. Outro periódico que tem longa data de circulação e está incorporada no sistema da USP é a Revista da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo , que teve sua primeira edição no dia 15 de novembro de 1893, com o título de Revista da Faculdade de Direito de São Paulo. Ambas estão entre as revistas científicas com maior número de downloads do ano.
De acordo com Eliana de Azevedo Marques, uma das responsáveis pela implantação do projeto da USP de 2006 a 2009, o objetivo do portal é reunir, organizar e promover o acesso pleno às revistas da USP de modo a ampliar suas visibilidades. Maria Inês Campos, editora da revista Linha D’Água da Faculdade de Letras e Linguística da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) inserida no portal desde 2011, afirma que é notável o aumento crescente de acessos pelas revistas com essa parceria, em janeiro deste ano a revista teve 526 downloads em contraste com os 10.396 no mês de novembro, e que até os números anteriores são consultados constantemente. Mariza do Coutto considera importante e vitorioso a crescente adesão e acessos das revistas em acesso aberto: “lembro da preocupação de um editor, que oferecia assinaturas da revista em formato impresso, quanto à redução desse público. Por fim, sensibilizou-se e a revista está no Portal, com forte acesso e continua a circular no formato tradicional”.
Dificuldades
Segundo os editores entrevistados, o Portal trouxe benefícios para as revistas, mas ainda tem desafios para enfrentar e se aperfeiçoar. Maria Inês Campos aponta ser uma das maiores dificuldades o layout do portal que não é intuitivo para o editor publicar os fascículos das revistas e, apesar dos treinamentos que o Sistema Integrado de Bibliotecas oferece aos editores, o uso do sistema OJS “é uma adaptação contínua porque a equipe [das revistas] se modifica e o modelo não é amigável”.
Rosana Moraes, também destaca a importância de um investimento nos aprimoramentos do sistema para facilitar seu uso, além de considerar ser necessária a formação de parcerias entre o Portal de Revistas da USP com outros portais de periódicos científicos para favorecer mais a visibilidade das publicações da universidade. Mesma ideia é compartilhada pelo editor da JISTEM publicada pela Faculdade de Economia e Administração (FEA) da USP, Edson Riccio, que sugere ter nos sites das unidades links que direcionem para o Portal de Revistas.
Atualmente, o Portal inclui uma parceria com projeto “Os periódicos científicos brasileiros: estratégias para expandir e melhorar a comunicação com a sociedade”, do Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo da Universidade Estadual de Campinas (Labjor-Unicamp), financiado ela Fapesp, que pretende valorizar e dar maior visibilidade às revistas científicas brasileiras por meio da divulgação científica. Os press releases e notícias sobre artigos das revistas são publicados em diferentes veículos e compartilhados na página do Facebook “Divulga Ciência”. Além de ser um canal de expansão das divulgações dos periódicos, Sueli Ferreira também relembra que na reformulação do Portal em 2012, dentre os benefícios incorporados estão a análise sistemática e estatísticas dos fascículos, visitas e download.
Em 2014, em função de uma parceria com o projeto “Open Access indicators Assessing growth and use of OA resources from developing regions — the cases of Latin America and Africa”, com financiamento da Unesco e coordenado pela CLACSO, PKP e FLACSO Brasil, o sistema instalou aplicativos para contabilizar indicadores alternativos de visibilidade, “isso significa que o Portal está se munindo de tecnologia para contabilizar a citação dos artigos de sua coleção nas redes sociais, quer sejam blogs,Facebook, Twitter, etc”.
O Portal da USP é hoje o maior dentre as universidades brasileiras. Ele fortalece a opção feita pelas revistas de acesso aberto e por mais transparência sobre os investimentos públicos na área científica. “A universidade pública tem o dever de devolver à sociedade os resultados dos investimentos feitos por meio dos impostos. O movimento de acesso aberto é uma reivindicação da comunidade científica pela democratização do acesso a informação científica produzida principalmente com esses recursos públicos”, afirma o Adalberto Pessoa Junior. O retorno social desse investimento também é defendido por Sueli Ferreira: “É comprovado que, no Brasil, cerca de 90% das revistas científicas estão vinculadas a instituições de ensino e pesquisa e que praticamente 100% do financiamento delas é feita com recursos públicos, sem contar que a própria pesquisa dos seus autores também advém, em sua maioria, de projetos desenvolvidos com recursos da mesma natureza”.
Em relação às propostas futuras do Portal, André Serradas, chefe técnico da Seção de Apoio ao Credenciamento de Revistas do SIBi-USP e coordenador do Portal de Revistas, delineia que serão mantidas as políticas de acesso aberto e discutidas com a comunidade uspiana estratégias de aprimoramento dos serviços oferecidos aos editores e à comunidade em geral.