Usuários de metrô em cidades populosas, como São Paulo, sabem a dificuldade de andar pelos corredores do sistema de transporte sem trombar uns nos outros. A colocação de placas e as barreiras físicas tentam ordenar o fluxo de pessoas, o que nem sempre funciona. Alterar o formato das paredes do corredor para ziguezague pode ajudar com que os pedestres se mantenham à direita e à esquerda automaticamente. É o que mostra um estudo teórico publicado na revista científica Physical Review X e que tem entre os autores o professor André Vieira, do Instituto de Física (IF) da USP e do Núcleo de Apoio à Pesquisa (NAP) de Fluidos Complexos (FCx).
Para descobrir o formato ideal do corredor, os pesquisadores realizaram simulações computacionais e cálculos matemáticos. “No corredor reto, as pessoas tendem a se organizar em filas que se alternam, ao invés de se separarem inteiramente, com mão e contramão. Se a geometria das paredes estiver em ziguezague, nosso trabalho sugere que as pessoas são induzidas a se separarem automaticamente”, explica Vieira.
Essa separação seria induzida pelos desvios que os pedestres realizam para evitar choques uns com os outros e com as paredes. A principal hipótese do trabalho é de que a forma desses desvios satisfaz em média uma regra determinada, o que já foi experimentalmente testado com sucesso em outros contextos.
A separação espontânea das pessoas também necessita de algumas outras condições, segundo os pesquisadores. “Esse efeito depende de que os pedestres não andem nem muito rápido, nem muito devagar, e de que a densidade de pedestres não seja nem muito alta, nem muito baixa; esses intervalos ideais de velocidade e densidade dependem da geometria precisa do corredor”, conta Vieira.
Apesar de o modelo ser teórico, o pesquisador acredita que ele possa ser empregado na prática. “As hipóteses que sustentam o modelo já se mostraram válidas em outros casos, o que sugere que se realizássemos um teste experimental observaríamos esse tipo de organização do fluxo de pedestres”.
A utilização do modelo não se restringe ao fluxo de pessoas. Há também aplicações possíveis aos sistemas microfluídicos. A microfluídica é um ramo da ciência que estuda a propagação de fluidos dentro de canais com dimensões de micrômetros, mesma escala da espessura de um fio de cabelo.
De acordo com Vieira, os estudos de microfluídica têm interesse, por exemplo, para a indústria farmacêutica.
“Existem alguns tipos de fluidos complexos (com a estrutura mais complicada que fluidos homogêneos como a água), chamados coloides carregados, que são compostos de partículas eletricamente carregadas, partículas com carga elétrica positiva e partículas com carga elétrica negativa. Essas partículas estão imersas nesse fluido e podemos transportá-las, por exemplo, para controlar uma reação química. Se aplicarmos um campo elétrico ao longo de um canal, as partículas com carga positiva vão querer se mover num determinado sentido e as partículas com carga negativa, no sentido oposto. É o mesmo tipo de movimento dos pedestres no metrô. Logo, o efeito combinado da dinâmica das partículas e das paredes em ziguezague do canal é separar completamente o fluxo das partículas”.
Os fluidos complexos são foco dos estudos do NAP-FCx que investiga propriedades físico-químicas, modelagem e aplicações de fluidos complexos em biologia e medicina.
O estudo completo Keep-Left Behavior Induced by Asymmetrically Profiled Walls, pode ser conferido no site da revista Physical Review X.
Hérika Dias / Agência USP de Notícias
Mais informações: email apvieira@if.usp.br