Otavio Nadaleto / Agência USP de Notícias
Falta de pesquisa, humor e fatores culturais se mostraram os maiores problemas para a tradução dos quadrinhos de “A Turma da Mônica”. A conclusão surgiu a partir das pesquisas de Jucimara Sobreira de Campos, realizadas entre 2010 e 2013, em sua dissertação de mestrado orientada por Stella Esther Ortweiler Tagnin. O estudo foi apresentado em abril de 2013 na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP.
O ponto de partida foi o acervo de histórias do site www.monicasgang.com. Do total de 433 quadrinhos, apenas 155 foram traduzidos para o inglês. A partir disso, ela decidiu observar quais elementos foram decisivos para traduzir ou não as histórias. “Os resultados mostraram que muitas de nossas marcas culturais foram apagadas durante o processo tradutório. Há histórias riquíssimas em referências culturais brasileiras que não foram traduzidas. Em algumas, figuras folclóricas como a “mula sem cabeça”, o “curupira” e o “saci pererê” apareceram e não foi usada nem uma caixa explicativa com referência à figura folclórica conhecida em nosso País”, conta Jucimara.
Assim, dividiu-se as histórias não traduzidas em dois grupos: as que continham fatores linguísticos e as que continham marcas culturais. Dentro do primeiro, agregou-se onomatopéias, rimas, comparações, homonímias, homofonias, jogos fônicos, polissemias, inversões, incongruências, quebras de expectativa, e outros fatores, sem, contudo, separá-los em subgrupos específicos. O quadrinho “História Real”, por exemplo, entra neste grupo, pois nele criou-se diversas palavras com “rei” que criavam humor: reidículo, reisada, reispeitavam, reiqueijão, etc. No segundo, fez-se o mesmo: agregou-se componentes da cultura popular brasileira, como provérbios, crenças, lendas, mitos, etc, além de fatores ligados a algum conhecimento prévio. É o caso da história “Amigo é Coisa pra se Guardar… (e Não, para com ele Aprontar!)”, na qual, logo no título, há uma referência a uma música brasileira muito conhecida, do cantor Milton Nascimento.
Inabilidade tradutória
Após ser feita a leitura simultânea dos quadrinhos, constatou-se, então, que 51% das histórias não traduzidas foram por motivos culturais, 44,7% por questões linguísticas e 4,3% por inadequação temática. Porém, Jucimara afirma: “Houve inabilidade tradutória no processo”. Em muitos casos, os tradutores não têm experiência, pois não estudaram a tradução especificamente. “Já ouvi pessoas falarem que não pagam por serviços de tradução porque usam um tradutor online e depois ‘limpam’ os erros”, conta a pesquisadora.
Um bom número de pessoas tem tomado contato com o trabalho de Jucimara. “São, em geral, estudantes com interesse na tradução de ‘A Turma da Mônica’ que estão desenvolvendo projetos, seja para mestrado, seja para TCC. Acho isso positivo, pois mostra o interesse, no contexto geral, da transmissão de nossa cultura. Este interesse é basicamente interno do Brasil, com a finalidade de introduzir o idioma para o público infantil”, acredita. Pode-se encontrar nas bancas “A Turma da Mônica” em inglês e espanhol”. Porém, o resultado do trabalho mostrou que a cultura brasileira foi insuficientemente preservada na tradução das histórias.
Segundo a pesquisadora, a maior dificuldade foi entender o porquê da maior parte das histórias não terem recebido tradução. “As que continham marcadores culturais mais fortes foram as menos traduzidas. Num exercício de tradução, eu fiz, durante o processo, diversas sugestões que se referiam a apagamentos culturais e que dariam conta do resultado. E essas sugestões não demandaram longa pesquisa, somente experiência, principalmente com relação à tradução de humor”.
Os resultados apontam para a necessidade de se valorizar, cada vez mais, o trabalho do tradutor profissional, formado. “Muitas vezes vemos um tradutor que exerce a profissão porque fala bem outro idioma, morou por algum tempo num determinado país, mas não passou por cursos e não teve contato com o que tem sido desenvolvido sobre o assunto”, destaca, ressaltando que “há diversas técnicas para auxiliar o tradutor a obter melhores resultados, não importando qual o tema. Assim é possível solucionar os impasses muito comuns no processo tradutório”, completa Jucimara.
Mais informações: email mamarac@ymail.com