Será que existem muitos refugiados vivendo no Brasil? Não só existem, como o país é conhecido pelo pioneirismo e liderança na proteção de refugiados estrangeiros. Fomos a primeira nação do Cone Sul a ratificar o Estatuto dos Refugiados, e uma das primeiras a integrar o Comitê Executivo da Agência da ONU para Refugiados (ACNUR). Até 2012, de acordo com o Ministério da Justiça, eram cerca de 4600 refugiados reconhecidos no país, originários de 70 nacionalidades diferentes.
A professora da Escola de Artes, Ciências e Humanidades (EACH) da USP, Bibiana Graeff, está desenvolvendo uma pesquisa que investiga se os direitos dos refugiados idosos que vivem no Brasil estão sendo aplicados. A faixa etária do estudo não foi escolhida ao acaso: juntamente com mulheres e crianças refugiadas, idosos fazem parte do grupo em situação de vulnerabilidade, ainda mais frágeis e que precisam ter suas necessidades especiais identificadas.
Pelo estatuto dos Refugiados no Brasil, define-se como refugiado aquele que, devido a fundados temores de perseguição por motivos de raça, religião, nacionalidade, grupo social ou opiniões políticas encontra-se fora de seu país e que não pode ou não quer se acolher à proteção de tal país. Também é considerado refugiado aquele que, devido a grave e generalizada violação de direitos humanos, é obrigado a deixar seu país para buscar refúgio em outro.
O que a pesquisadora quer saber é se os idosos estão tendo acesso não apenas aos direitos de liberdade (opinião, religião, o de “ir e vir”), mas também direito ao trabalho, acesso à saúde e à educação. A pesquisa tem natureza bibliográfica, com base em documentação jurídica e da área de Gerontologia, mas utiliza também a técnica de estudo de caso, através de entrevistas com refugiados idosos e agentes de organizações que protegem o refugiado no Brasil. A próxima etapa da pesquisa, segundo Bibiana, envolve contatos com a Cáritas de São Paulo e o Comitê Nacional para os Refugiados (Conare) para obter dados e realizar as entrevistas.
Direitos (e um pouco mais)
Como signatário do Estatuto dos Refugiados, explica Bibiana, o Brasil, assumiu obrigações jurídicas no sentido do reconhecer o status de refugiado àqueles que se enquadram nos critérios estabelecidos pela lei. Isso significa que o Estado deve reconhecer os direitos fundamentais destas pessoas, inclusive os consagrados pelo Estatuto do Idoso. De acordo com a professora, porém, a situação não é bem essa. O direito do Benefício de Prestação Continuada (BCP), por exemplo, ainda não é plenamente oferecido ao refugiado idoso como assistência social – e deveria ser. O BCP é um benefício que assegura o pagamento de um salário mínimo ao idoso e à pessoa com deficiência, de qualquer idade, que comprovem não ter como garantir o próprio sustento.
Além do acesso aos mesmos direitos dos brasileiros, a professora aponta a necessidade de integrar os refugiados, idosos ou não, à sociedade em que estão vivendo. Mas faz uma ressalva: “uma verdadeira integração não representa assimilação cultural”. Na verdade, ela começa por políticas de educação e conscientização, tanto para os refugiados quanto para o brasileiros, e deve envolver todas as esferas do Poder Público, pois é em nível municipal e estadual que as políticas públicas são implementadas.
Uma verdadeira integração não representa assimilação cultural.
Para os idosos, essa integração exige esforços maiores dos dois lados, pois o aprendizado da nova língua é um grande desafio a ser superado. “Na área do envelhecimento, por exemplo, novas profissões como o bacharel em Gerontologia, com uma formação biopsicossocial e visão holística sobre o envelhecimento e a velhice, são fundamentais para a promoção do diálogo intersetorial e interprofissional”, ressalta.
O perfil dos refugiados no Brasil
Os menos de 5 mil refugiados no Brasil hoje são, em sua maioria, homens e chegam principalmente de outros países da América do Sul, da África e da Ásia. Mesmo com a garantia de que aqui estão seguros, eles reclamam das dificuldades de inserção social e profissional.
Na opinião da pesquisadora, falta ação do Estado brasileiro para uma verdadeira política de integração. “É necessária e urgente a adoção de uma nova lei de migrações no país, que avance no sentido da implementação dos direitos fundamentais reconhecidos pela Constituição de 1988, o que o anacrônico Estatuto do Estrangeiro não pode garantir”, defende. Além disso, ela alerta para o fato de que existem muito estereótipos negativos construídos sobre os refugiados, que dificultam o processo de adaptação e que devem ser quebrados.