A produção de combustíveis a partir da biomassa, ou seja, das sobras do material utilizado para a obtenção de etanol, faz com que estes resíduos, que têm valor comercial mínimo, sejam aproveitados para geração de energia menos poluente e mais barata.
Hoje, a combustão do bagaço de cana já é utilizada por muitas usinas para geração de sua própria energia. Mas se em vez de diretamente queimado, este bagaço for utilizado para produzir um biocombustível – o etanol celulósico -, é possível obter maior produtividade e oferecer maior liberdade de escolha para as usinas.
É neste contexto que um grupo de pesquisa do Instituto de Física de São Carlos (IFSC) da USP trabalha, desenvolvendo aplicações práticas em biotecnologia e originando novas fontes de biocombustível.
Coordenado pelos professores Igor Polikarpov e Leandro Martínez, do IFSC, o Grupo de Biotecnologia Molecular conta com cerca de 30 pesquisadores, entre docentes, alunos de iniciação científica, doutorado e pós-doutorado. No Brasil, recebe a colaboração de diversas unidades da USP, como a Escola de Engenharia de São Carlos (EESC), o Instituto de Química (IQ) e a Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq); de outras universidades, como a Unicamp e a Unesp; e de órgãos federais, como a Embrapa. As colaborações estrangeiras incluem centros de pesquisa europeus; as universidades de York, Sheffield e Cambridge, da Inglaterra; e o Instituto Nacional de Pesquisa em Agronomia (INRA), da França.
Enzimas
Um das principais metas dos estudos é compreender melhor o funcionamento das enzimas – tipo de proteína que auxilia na reação de “quebra” de outras móleculas, saindo do processo da mesma forma como entrou. Entre elas, estão a celulase, que decompõe a celulose (açúcar presente na parede celular das plantas); e outras hidrolases de glicosídeos, como são chamadas.
De acordo com o professor Polikarpov, o entendimento da ação molecular destas enzimas é fundamental para a criação do chamado etanol celulósico, ou de segunda produção, através da manipulação de biomassa, como o bagaço de cana-de-açúcar e a casca de eucalipto. “É necessário compreender o processo a nível molecular”, diz.
Para realizar análises, o grupo estudou as modificações de morfologia e a composição química do bagaço de cana e, atualmente, analisa as modificações da casca de eucalipto no processo de pré-tratamento. Também foram construídas estruturas tridimensionais de proteínas, usando difração de raios-X, para estudo da ação das enzimas.
A partir destes modelos, o grupo busca identificar o funcionamento das macromoléculas e produzir enzimas mais avançadas e eficientes, que dão origem a um etanol de segunda produção com melhor rendimento.
“Nós já descobrimos que o pré-tratamento da biomassa melhora o rendimento da hidrólise. Porém, se esse tratamento for muito agressivo, o rendimento cai”, explica o docente.
A equipe também busca realizar a produção de cada componente enzimático separadamente, para decifrar a relação que existe entre o açúcar (celulose) e a enzima (celulase). “Existe uma sinergia entre componentes do preparado enzimático que é preciso compreender”, revela.
Microorganismos
A busca de novos microorganismos na biodiversidade brasileira para realização da hidrólise de biomassas é, segundo Polikarpov, um dos objetivos mais recentes do grupo. Isso porque a identificacão de novas enzimas é tímida em solo nacional – e o número de enzimas passíveis de utilização, restrito.
Buscando aumentar a conexão das pesquisas na área com os recursos dos ecossistemas nacionais, o grupo coordenado pelo docente iniciou um projeto de colaboração com a Universidade de York, na Inglaterra, financiado pela Fapesp e pelo Biotechnology and Biological Sciences Research Council (BBSRC), da Inglaterra.
Alunos e pesquisadores ingleses virão para a USP trabalhar conjuntamente com o grupo. Do mesmo modo, estdantes e cientistas brasileiros irão atuar nos laboratórios britânicos. “Essa integração deve possibilitar que desenvolvamos um trabalho ainda mais completo sobre enzimas e degradação de biomassa”, espera o docente.