Atualização das diretrizes americanas de atendimento que serão apresentadas em evento do Incor confirma a importância da massagem cardíaca na ressuscitação da parada cardiorrespiratória
De 100 a, no máximo, 120 compressões por minuto, feitas de maneira a pressionar o osso externo do peito (que separa as costelas) em até 5 cm de profundidade (e não mais do que isso), de preferência sem interrupção – a não ser para fazer respiração boca-a-boca (uma para cada ciclo de 30 massagens) ou para o uso do desfibrilador, enquanto o socorro médico não chega. Nem mais e nem menos. Essa é a forma clássica de uma massagem cardíaca de alta qualidade, um método insuperável para manter adequadamente o sangue em circulação no organismo (até que a equipe de saúde chegue e reverta o colapso do coração).
Uma manobra simples mas precisa como essa aumenta a sobrevivência da vítima em 30% (1 pessoa a cada 3) e diminui os danos neurológicos da baixa oxigenação. E ela é totalmente passível de ser feita até mesmo por uma pessoa comum sem treinamento, contanto que ela tenha orientação de um atendente de saúde, por telefone, diz o coordenador das diretrizes americanas de ressuscitação cardiorrespiratória, Karl Kern, que está no Brasil para participar do Simpósio de Emergências Cardiovasculares e Ressuscitação – Diretrizes 2015, no Centro de Convenções Rebouças, nesta quarta e quinta-feira (18 e 19 de novembro). O evento organizado pelo Instituto do Coração (Incor) do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP (FMUSP) é voltado para a atualização de médicos e profissionais de saúde sobre o estado da arte nesse atendimento.
Segundo Kern, que também é diretor do Sarver Heart Center da University of Arizona, dos Estados Unidos, a massagem cardíaca é tão importante que, mesmo que o leigo não tenha o auxílio de um atendente de saúde e não seja treinado, ainda assim ele deve arregaçar as mangas e iniciar imediatamente as manobras com as mãos, tão logo tenha verificado a falta de pulso e de respiração na vítima.
Além das presenças internacionais, a programação do Simpósio do Incor conta ainda com a apresentação da experiência bem-sucedida do Metrô de São Paulo, um dos locais mais seguros do mundo no atendimento de parada cardiorrespiratória (saiba mais abaixo), semelhante a aeroportos americanos, do Japão e da Europa.
Serão relatadas também o que as diretrizes americanas têm a dizer de novo no atendimento de emergências em parada cardiorrespiratória dentro de hospitais. Coqueluche dos últimos anos, a hipotermia é um capítulo a parte nessas recomendações, dado seu grande potencial terapêutico na recuperação dos tecidos lesionados pela baixa oxigenação decorrente da parada cardiorrespiratória. A primeira mudança trazida pela Diretriz de 2015 é que a redução da temperatura do corpo da vítima, por meio da injeção de fluidos frios, deve ser feita somente no hospital e não mais no translado do paciente. E mesmo no hospital, o enfoque da técnica deve ser pelo manejo da temperatura na faixa de 32 °C a 36 °C, por pelo menos 24 horas.
Na manhã do segundo dia do evento (19), das 10 às 12 horas, 60 funcionários do Incor participantes da brigada de incêndio do hospital serão treinados pela equipe do Laboratório de Treinamento em Emergências Cardiovasculares do Instituto, para fazer o atendimento de parada cardiorrespiratória, de acordo com as novas diretrizes.
Ao final do Simpósio, na tarde de quinta-feira (19), pacientes sobreviventes de parada cardiorrespiratória relatarão para a plateia de médicos e profissionais da saúde suas experiências de risco de morte e como foi possível a elas retomarem as suas vidas, depois de um evento tão traumático como o da parada cardiorrespiratória.
O papel da comunicação
O papel informativo e educativo da imprensa, ampliado pelo poder de mobilização das mídias sociais e da mobilidade e rapidez da transmissão de dados das novas tecnologias da comunicação, como o celular, podem ser grandes aliados na corrente da sobrevida da parada cardiorrespiratória, segundo as atuais diretrizes americanas, diz coordenador do Simpósio do Incor e diretor do Laboratório de Treinamento em Emergências Cardiovasculares do Instituto do Coração, Dr. Sérgio Timerman.
Esse potencial, diz o especialista do Incor, deve ser melhor explorado principalmente em países como o Brasil, em que inexiste uma política pública de desfibrilação precoce que favoreça o treinamento em massa da população e a disponibilidade de desfibriladores automáticos em locais públicos de grande circulação de pessoas.
O acesso da população brasileira às noções básicas de atendimentos de parada cardiorrespiratória acontece quase exclusivamente por meio de matérias educativas na imprensa.
Por política pública, diz o Dr. Timerman, entende-se a existência de leis que regulamentem os locais que devem ter desfibrilador automático, o número de pessoas que devem ser treinadas nesses lugares e por quanto tempo, assim como uma política de fiscalização.
Mas outros usos são possíveis para a comunicação. Nas comunidades pode ser viável incorporar tecnologias de mídia social que convoquem socorristas que estejam nas proximidades de uma vítima com suspeita de parada cardiorrespiratória, pelo menos em hipótese, diz o Dr. Karl Kern, coordenador das diretrizes americanas.
Em um estudo recente realizado na Suécia, houve um aumento significativo na taxa de sucesso no primeiro atendimento da parada cardiorrespiratória iniciada por transeuntes, quando estes utilizavam um telefone celular, para obter orientação de atendentes de saúde, exemplifica o Dr. Kern. Para o especialista americano, “frente ao baixo risco e aos possíveis benefícios, bem como à onipresença dos dispositivos digitais, os municípios poderiam considerar a incorporação dessas tecnologias nos sistemas de atendimento dessas emergências”.
Dr. Timerman diz que, em outros países, há propagandas na televisão, mostrando, por exemplo, os dois passos simples para salvar uma vida: ligar para serviço de emergência e iniciar as massagens cardíacas.
Casamento perfeito
A identificação da parada cardiorrespiratória e o início imediato da massagem cardíaca numa intensidade de 100 a, no máximo, 120 compressões por minuto (durante dois a três minutos), devem ser seguidos pelo uso do desfibrilador automático, o DEA. Quanto mais cedo esse aparelho que reverte a fibrilação do ventrículo do coração for acionado, maiores as chances de sobrevida com qualidade terá a vítima da parada cardiorrespiratória.
Contudo, não basta ter o aparelho. “Mesmo nos locais que possuem o desfibrilador, muitas pessoas não sabem onde ele está localizado ou como usá-lo – não é raro elas ficarem imobilizadas pelo medo de acioná-lo incorretamente”, diz o cardiologista do Incor.
Segundo ele, é clara a diferença do atendimento quando a equipe possui um treinamento adequado e está atualizada em relação aos protocolos internacionais. O caso do Metrô de São Paulo, cuja equipe é treinada pelo Laboratório do Incor e cujas estações estão equipadas com desfibriladores automáticos, é um exemplo claro da evolução propiciada pelo treinamento.
A experiência relatada em artigo publicado em outubro último, no Journal of American Heart Association (veja aqui) cobre dados de ocorrência de parada cardiorrespiratória nas estações do Metrô, entre 2006 a 2012. Nesse período, 53% dos passageiros que tiveram fibrilação ventricular (a mais mortal delas) nos trens conseguiram chegar vivas ao hospital. Esse índice de socorro bem-sucedido no Metrô paulista é semelhante ao de aeroportos americanos, do Japão e da Europa.
Ao final, 37% das vítimas acometidas nas estações sobreviveram e tiveram alta hospitalar, com avaliação neurológica satisfatória. “Isso é fruto de longo tempo de treinamento prático de todos os funcionários do Metrô, com a implementação e manutenção de um programa de desfibrilação local”, explica Timerman.
Desde 2005, profissionais do Incor orientam funcionários do Metrô sobre a utilização do desfibrilador e sobre os procedimentos para a massagem cardíaca. Todos os agentes de segurança e de estação passam pelo treinamento e pela reciclagem, feita anualmente.
Da Assessoria de Imprensa e Mídias Jornalísticas Institucionais do Incor