Odontologia do idoso requer enfoque multidisciplinar, aponta dentista da FSP

Problemas da saúde bucal do idoso influenciam desde a nutrição e a fonética até as doenças respiratórias.

A população brasileira está envelhecendo. Em 2011, os idosos já  representavam 12,1% da população, ou seja 23,5 milhões de pessoas, segundo dados do IBGE. O crescimento da população idosa exige tanto mudanças culturais, visando respeitar e a valorizar o idoso, mas também medidas práticas: trata-se de um grupo que requer cuidados diferenciados com a saúde. Fernando Montenegro, especialista na área da odontologia especializada no atendimento aos idosos e dentista no Centro de Saúde Escola Geraldo de Paula Souza, mantido pela Faculdade de Saúde Pública (FSP) da USP, é  co-autor do livro Odontogeriatria – Uma Visão Gerontológica,  junto com Leonardo Marchini, da Universidade de Taubaté (UNITAU) pela Editora Elsevier.

Além de dentistas, a publicação contou com a colaboração de gerontólogos e psicólogos, abordando patologia, farmacologia, tratamento odontológico em casos de Alzheimer, Parkinson, câncer, doenças cardiovasculares e AVC; além do atendimento odontológico em UTI e em domicílio. Na obra, que será lançada no final do mês no I Congresso Interdisciplinar da Associação Paulista dos Cirurgiões Dentistas (APCD), o especialista defende um enfoque multidisciplinar da odontogeriatria.

Multidisciplinaridade

Uma abordagem global faz toda diferença no tratamento ao idoso. “O paciente necessita de um tratamento mais individualizado, em que seu histórico médico é levado em consideração. É importante que o dentista tenha um bom relacionamento com os demais médicos do paciente, porque nem sempre ele [o paciente] vai dizer ao seu dentista se está com o diabetes controlado, por exemplo. E essa é uma informação importante, que pode ter influência no tratamento”, explica.

O caminho inverso também é importante. O principal problema bucal que afeta os idosos, a redução do fluxo salivar, é, segundo Montenegro, efeito colateral do consumo contínuo de remédios receitados pelos demais médicos para controle de hipertensão e diabetes, doenças crônicas comuns na terceira idade. Como consequência dessa redução, ocorre maior incidência de cáries e lesões na mucosa da boca, que sustentam as próteses, levando o paciente a sentir dor.

Por causa da dor, o paciente a para de usar a prótese e, portanto, deixar  de consumir todos os alimentos importantes para uma dieta saudável. Com isso, ele fica mais suscetível às doenças. Também pode  acontecer aumento no consumo de certos nutrientes, pois a saliva é importante na limpeza das papilas gustativas, que são responsáveis pelo reconhecimento do sabor dos diferentes alimentos. Pouca saliva significa pouca limpeza nessas papilas e o resultado é que a percepção de sabores como doce ou salgado fica prejudicada e a pessoa idosa passa a temperar mais a comida, podendo exagerar no açúcar ou no sal e tendo problemas no controle de diabetes ou hipertensão.

Da nutrição ao bem estar psicológico

O odontólogo também defende, a partir de agora, uma abordagem preventiva por parte dos dentistas. “Nossa profissão só descobriu como prevenir cáries e problemas de gengiva nos ano 1950. As pessoas que hoje são idosas não tiveram contato com essas descobertas e chegavam aos 30 anos de idade já  com os dentes irremediavelmente danificados ou com dentaduras”, explica Montenegro.

O grande problema das próteses é que nem sempre os pacientes cuidam dela. Próteses muito antigas não permitem mastigação eficiente. A mastigação ineficaz impede boa absorção dos nutrientes da dieta, função muito importante para fortalecer a saúde dos idosos. “Os médicos pedem para o idoso manter uma dieta balanceada, consumir muitas fibras, mas se os dentes, ou a prótese, não estão bem, a pessoa não consegue seguir essas orientações”, diz.

Os médicos pedem para o idoso manter uma dieta balanceada, mas se os dentes ou a prótese não estão bem, a pessoa não consegue seguir essas orientações.

Além da importância fisiológica, uma boa dentição é importante para o idoso porque garante boa aparência e melhora a fonética. Dentes quebrados influem na passagem do ar, resultando em alterações na fonética e impedindo boa compreensão do que a pessoa quer dizer. Com boa aparência, e fala melhorada, o paciente recupera a auto-estima, se socializa mais, e pode até tentar se reinserir no mercado de trabalho.  Essas atividades são importantes para o idoso, que está mais sujeito à depressão, por exemplo.

Não apenas a carência nutricional contribui para as doenças. “A saliva tem propriedades antibióticas, capazes de controlar as bactérias que habitam a  boca. Essas bactérias podem alimentar os problemas de pulmão do paciente, então a boca e a língua devem estar sempre limpas. Mas nem sempre os profissionais que cuidam do idoso sabem disso. É por isso que temos que compartilhar a informação”, defende Fernando.

Atualização: O  lançamento do livro  Odontogeriatria – Uma Visão Gerontológica foi adiado para Março de 2013

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