A fiscalização é fundamental para reduzir o número de crianças e adolescentes que trabalham no Brasil. É o que mostra pesquisa da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq) da USP, em Piracicaba, que fez uma estimativa do quanto a fiscalização pode afetar a retirada de crianças e adolescentes do trabalho infantil.
Em 2000, o aumento de 1% na inspeção do trabalho infantil, resultou em 8.658 crianças e adolescentes de 10 a 17 anos fora dessa condição. Em 2010, essa quantidade foi de 8.856. O efeito da fiscalização foi maior na faixa etária com crianças e adolescentes mais jovens, de 10 a 14 anos, isso diminui conforme essas crianças se tornam mais velhas.
“Na faixa de 16 a 17 anos, são detectados mais jovens com permissão de trabalho por meio de programas como ‘Jovem Aprendiz’, por isso o efeito da fiscalização é menor”, explica a economista Roselaine Bonfim de Almeida, autora de doutorado O efeito das fiscalizações do trabalho para a redução do trabalho infantil no Brasil, com orientação da professora Ana Lúcia Kassouf, do Departamento de Economia da Esalq. A defesa do doutorado foi em abril deste ano.
O estudo mensura, a partir de estimativas, o impacto da fiscalização do trabalho no trabalho infantil em todos os municípios brasileiros a partir de técnicas econométricas, que se utilizam da estatística e da matemática para testar determinadas hipóteses e estimar os seus resultados.
A pesquisa utiliza dados do censo demográfico de 2000 e 2010 para saber a proporção de crianças e adolescentes que trabalham de 10 a 17 anos. Além de informações sobre a inspeção do trabalho fornecida pelo Ministério do Trabalho e Emprego, como a quantidade de auditores fiscais do trabalho por estado, a localização das Gerências e Superintendências Regionais do Trabalho, número de estabelecimentos fiscalizados, a distância que o auditor tem de se deslocar de onde está lotado até o município a ser fiscalizado.
“Essas são as variáveis principais relacionadas à inspeção, mas utilizamos outras para controlar os efeitos das diferenças entre os municípios, como o Produto Interno Bruto (PIB), o Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM), presença de instituições como o Conselho Tutelar, entre outras”, explica Roselaine.
Resultados
De acordo com a pesquisadora, as análises foram realizadas por faixas etárias de 10 a 17 anos e o resultado para o ano 2000 mostra que o aumento de 1% na inspeção reduz o número de crianças e adolescentes que trabalham em 0,22%.
Considerando a divisão por faixa etária, essa redução é de 0,45% para a faixa de 10 a 14 anos, de 0,19% para aqueles com 15 anos e de 0,09% para a faixa de 16 a 17 anos.
“Estatisticamente pode parecer pouco, mas em termos absolutos, esses valores representam aproximadamente 8.658 crianças e adolescentes de 10 a 17 que deixaram o trabalho infantil. Por faixa etária são 5.140 crianças e adolescentes de 10 a 14 anos, 1.233 adolescentes de 15 anos e 1.929 adolescentes de 16 e 17 anos. Considerando que no censo demográfico de 2000 havia quase 4 milhões de crianças e adolescentes trabalhando”, afirma Roselaine.
Ano de 2010
Para o ano de 2010, os resultados mostraram que o aumento de 1% na inspeção reduz a proporção de crianças e adolescentes que trabalham em 0,26%. Nas faixas etárias, os valores são de 0,66% para a faixa de 10 a 13 anos, de 0,41% para a faixa de 14 a 15 anos e de 0,08% para a faixa de 16 a 17 anos.
Em termos absolutos, esses valores representam aproximadamente 8.856 crianças e adolescentes de 10 a 17 anos. Por faixa etária, 4.686 crianças e adolescentes de 10 a 13 anos e 3.642 adolescentes de 14 e 15 anos. Os resultados para jovens de 16 e 17 anos não foram inseridos pela pesquisadora porque não foram estatisticamente significantes. Em 2010, segundo o censo demográfico, havia mais de 3,4 milhões de crianças e adolescentes trabalhando.
“O Brasil é referência no mundo no combate ao trabalho infantil, pois tem conseguido reduzir os números de crianças e adolescentes nessa situação. No início da década de 1990, eram mais de 5 milhões, mas, de acordo com o último censo, esse valor reduziu. Vale considerar que o Ministério do Trabalho aumentou a fiscalização, no entanto, a quantidade de crianças resgatadas diminuiu porque está cada vez mais difícil encontrar essas crianças trabalhando”, analisa Roselaine.
Convênio
O estudo faz parte de um convênio entre a Esalq e a Understanding Children’s Work (UCW), uma inciativa de cooperação interagências de pesquisa envolvendo a Organização Internacional do Trabalho (OIT), a Unicef e o Banco Mundial.
“A ideia dessa iniciativa é para incentivar pesquisas sobre o tema trabalho infantil e apoiar encontros e discussões. No Brasil, somos o único grupo participante”, conta a professora Ana Lúcia.
Hérika Dias / Agência USP de Notícias