Lara Deus / Agência USP de Notícias
O tráfico internacional de pessoas para fim de exploração sexual foi objeto de uma dissertação de mestrado da Faculdade de Direito (FD) da USP. A advogada e editora jurídica Thaís de Camargo Rodrigues concluiu que o tráfico internacional de pessoas é um “processo delitivo”, sequência que envolve mais de uma violação, e que a lei brasileira não abrange todas as suas etapas.
A pesquisa O tráfico internacional de pessoas para fim de exploração sexual e a questão do consentimento teve início em 2009, quando a advogada sentiu-se motivada ao cursar a disciplina de Direito Penal Sexual, no início da pós-graduação. “O tráfico internacional de pessoas foi um dos temas que me chamou bastante atenção por vários aspectos: pela grande violação dos direitos humanos e pelo pouco conhecimento sobre ele”, justifica a pesquisadora.
A pesquisa permitiu que Thaís entrasse em contato com outros profissionais que estudam o assunto, como a Promotora de Justiça Eliana Vendramini, a antropóloga Adriana Piscitelli e a jornalista Priscila Siqueira, além de examinar as legislações estrangeiras sobre o tema. Ela teve acesso a materiais com ajuda do Ministério da Justiça e do Núcleo de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas do Estado de São Paulo. Contudo, Thaís não teve contato com vítimas, pois o crime, segundo o estudo, “é invisível, porque as pessoas que sofrem muitas vezes não se veem como vítimas” e alguns processos correm em segredo de justiça para proteger vítimas e testemunhas.
A conclusão obtida na dissertação de mestrado é que o tráfico internacional de pessoas não é apenas um crime, como descreve o artigo 231 do Código Penal Brasileiro. “Ele engloba o aliciamento, o transporte e a exploração que tira todos os direitos de uma pessoa”, conta. Trata-se, segundo Thaís, de um processo muito mais complexo do que descreve a lei brasileira atual.
O Protocolo de Palermo
Países como Portugal, Espanha, Alemanha e Argentina adequaram sua legislação sobre o tráfico internacional de pessoas conforme o Protocolo de Palermo, tratado feito em adição à Convenção das Nações Unidas contra o crime organizado transnacional, que define o crime e traça metas comuns de combate a ele. No estudo, a pesquisadora percebeu que esse acordo tratava do tráfico de pessoas em seus diversos fins. “O Protocolo de Palermo define o tráfico para exploração sexual, para trabalho escravo e para remoção de órgãos”, esclarece e conclui “aqui no Brasil, no entanto, não há uma legislação unificada e sistematizada que abrace tudo isso”.
Não há tráfico quando a pessoa, maior e capaz, concorda em viajar ao exterior para fins de prostituição, segundo sua interpretação do Protocolo de Palermo. “No nosso código, o consentimento é completamente ignorado, demonstrando um paternalismo exagerado”, avalia Thaís. Ela ressalta, no entanto, que para se levar em conta o consentimento do maior e capaz “é necessário comprovar se esta pessoa não está sofrendo alguma agressão ou se ela é vulnerável.”
Em sua dissertação de mestrado, Thaís escolheu dar ênfase ao tráfico internacional de pessoas para fins de exploração sexual. Ela descobriu, portanto, que nem os órgãos internacionais analisados tratam a questão do consentimento com unanimidade. “Há duas organizações não governamentais (ONGs) que tratam dessa questão da prostituição. A Aliança Global Contra o Tráfico de Mulheres (GAATW) considera a prostituição como um trabalho e as pessoas podem escolher, mas a Coalizão Contra o Tráfico de Mulheres (CATW) entende que nenhuma pessoa pode escolher ser prostituta, por ser contra a dignidade humana.”
A pesquisa foi orientada pelo professor Vicente Greco Filho e defendida em maio de 2012 na FD.
Mais informações: email thais.cr@ig.com.br, com Thaís Rodrigues