“O Brasil tem papel de liderança na pesquisa climática. Não deixa a desejar em nada em relação a outros países mais ricos ou desenvolvidos”. A despeito de vir de um brasileiro, o que poderia gerar suspeitas de um viés nacionalista, a avaliação acima merece todo crédito. A brilhante carreira do brasileiro em questão nesta área, por si só, já testemunha a favor da declaração.
Paulo Eduardo Artaxo Neto – uma das maiores referências mundiais em mudanças climáticas – porém, é ligeiramente evasivo quando perguntado sobre sua trajetória profissional. Sobre o trabalho na Nasa, a agência espacial americana, e o Nobel da Paz recebido pela equipe do painel de mudanças climáticas da ONU de que é membro – assim como de outros sete grupos internacionais -, passa rasante. Prefere mergulhar fundo nos assuntos que movem seu dia-a-dia, e que envolvem algo tão trivial quanto o futuro da vida no Planeta.
A especialidade de Artaxo é a Física, uma das primeiras “ciências”, no sentido moderno do termo. Mas dela, aproveita principalmente os conhecimentos que podem ser aplicados ao meio ambiente – tema que parece ser a maior preocupação atual da humanidade. Duas temáticas recebem atenção especial: a região amazônica do Brasil, pesquisando o efeito das queimadas nas chuvas, nas nuvens, no clima atmosférico e no balanço de radiação no ecossistema; e a poluição urbana e os problemas causados por ela, como ilhas de calor e efeitos no clima a longo prazo.
Nos 28 anos como docente do Instituto de Física (IF) da USP, são mais de 300 artigos científicos publicados e 6 mil citações em outros trabalhos acadêmicos. Tamanha produtividade lhe rendeu, em 2010, o prêmio USP Destaques por ser o pesquisador “da casa” que mais recebeu acessos a suas publicações. Atualmente, Paulo Artaxo mantém projetos no IF e colabora em projetos no exterior, além de orientar simultaneamente o trabalho de oito pós-graduandos da USP.
Sobre o Brasil, no Brasil
Na visão de Artaxo, para alguém que estuda mudanças climáticas no Brasil, é importante focar nas especificidades brasileiras, mas sem nunca perder a observação mundial. “Não será um alemão ou um inglês que virá estudar a fundo as peculiaridades do Brasil. O interesse tem que partir de um brasileiro, é importante dar a contribuição aqui, contribuir com o ‘nosso’ “, afirma.
É com essa motivação que o cientista faz questão de pesquisar no País, mesmo tendo passado por laboratórios mundialmente reconhecidos, como os das Universidades de Harvard (EUA), da Antuérpia (Bélgica) e de Lund (Suécia) – além da Nasa.
Apesar de todo o reconhecimento desses laboratórios, Artaxo faz questão de exaltar a relevância das parcerias. “A cooperação entre cientistas é fundamental no desenvolvimento da pesquisa” afirma. E argumenta:
“Esses laboratórios são como quaisquer outros, do ponto de vista científico. Cada um dá uma contribuição do ponto de vista global. Nós também damos a nossa no trato com a Amazônia”.
Além de ressaltar o papel de liderança do Brasil em pesquisas atmosféricas, que tem por sua vez o IF como polo mais avançado, Artaxo comemora o crescimento da área. “As pesquisas estão em franco desenvolvimento no Brasil e é uma área que tem recebido bastante investimento. Isso é importante para que as pesquisas estratégicas mostrem para onde as mudanças vão nos levar, e possa haver planejamento e adaptação do País para os próximos acontecimentos”, analisa, lembrando que o crescimento do campo de pesquisa também está atrelado ao aumento do número de pesquisadores.
Nesse sentido, o docente cita a importância das pesquisas em decorrência das últimas mudanças climáticas que aconteceram no Brasil e causaram grande prejuízo.
“Os rios da bacia amazônica tiveram cheias históricas em 2009 e em 2012. A seca castigou o nordeste em 2005, 2010 e novamente este ano. Dois importantes acontecimentos em curtos espaços de tempo. Deve significar alguma coisa, então precisamos pesquisar”.
Aeroclima
“Aeroclima – efeitos diretos e indiretos de aerossóis no clima da Amazônia e Pantanal” é o título do projeto atual de Artaxo. Nele, o pesquisador busca uma estratégia integrada para aumentar o conhecimento dos efeitos de partículas destas substâncias em nosso clima e também no ciclo do hidrogênio, focalizando a região da Floresta Amazônica e do Pantanal.
O Projeto Aeroclima está em andamento, financiado por verba da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), sendo diretamente ligado ao Departamento de Física Aplicada do IF. Os demais projetos em que Artaxo está envolvido têm financiamento da Nasa, da Universidade de Harvard (EUA) e da Comunidade Europeia.