Apesar dos achados revelarem que a maioria dos adolescentes (77%) já cometeu algum ato delituoso, o que indica normalidade desse comportamento na adolescência, informação também encontrada em estudos de outros países, a amostra brasileira verificou que apenas uma pequena parcela deles (17%) é responsável pela maior quantidade dos delitos. E, ainda, que a idade do primeiro delito ocorreu entre o final da infância e início da adolescência, enquanto dados internacionais mostram esse início na segunda metade da adolescência (por volta dos 15 anos).
O estudo foi realizado pelo psicólogo André Vilela Komatsu, pesquisador do Departamento de Psicologia da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto (FFCLRP) da USP, com jovens, recrutados em escolas públicas (133) e em instituição judicial (60) da cidade de Ribeirão Preto.
Eles responderam a um questionário utilizado internacionalmente para esse tipo de pesquisa. As perguntas são baseadas na Teoria Geral da Regulação do Fenômeno Criminal, de Marc Le Blanc, que busca explicação para o surgimento e continuidade do comportamento delituoso.
O pesquisador conta ainda que utilizou o método conhecido como Delinquência Autorrevelado para questionar os jovens. Através dele, obtém-se respostas, usando formas não estigmatizadoras e garantindo o anonimato sobre o possível envolvimento em atividades infracionais. “A vantagem desse método é que ele permite a obter informações que não estão oficialmente disponíveis, como aqueles em que a vítima não registra queixa ou quando o autor do ato não é identificado”, explica Komatsu.
Comportamento antissocial x déficits
As análises mostraram que 82% dos adolescentes escolares disseram ter cometido algum ato divergente e 77%, algum delito. Já entre os submetidos a penas judiciais, todos admitiram ter praticado as duas formas de comportamento antissocial, com diversidade e volume de atos que se aproximaram do dobro do verificado pelos adolescentes escolares. Vandalismo e furto em estabelecimento comercial foram os delitos mais relatados.
Separando os jovens em cinco grupos que ia do primeiro, com nenhuma atividade delituosa, até o quinto, com alto “nível de engajamento infracional”, Komatsu verificou, após comparação das respostas, que “quanto maior o engajamento infracional, maiores os déficits/problemas experimentados pelos jovens”. Exemplos desses problemas foram: “comportamentos impulsivos, baixo desempenho acadêmico, vinculação escolar fragilizada, práticas parentais inadequadas, rotina desorganizada e afiliação a pares infratores”.
Outra informação importante, encontrada por Komatsu, é que a pequena parcela de adolescentes que é responsável pela maioria dos delitos foi encontrada tanto na amostra de adolescente em conflito com a lei quanto na de adolescentes na escola, que nunca passaram pelo sistema de justiça juvenil. Em contrapartida, diz o pesquisador, “parte dos adolescentes em conflito com a lei demonstrou um padrão de conduta que remetia a uma delinquência comum, aquela que muitos jovens experimentam durante a adolescência, e que tende a cessar sem a necessidade de intervenções”.
Caracterização da delinquência
Para Komatsu, apesar das limitações dos métodos que utilizou e da necessidade de aperfeiçoamento dessas técnicas para futuras pesquisas nessa linha de investigação, o “estudo deu início a um importante movimento quanto à caracterização da delinquência juvenil em nosso contexto”.
O trabalho que realizou ajuda a discriminar subgrupos e ajustar intervenções, “algo que já se faz, de forma consolidada, em alguns países mais desenvolvidos como Estados Unidos, Canadá, Inglaterra e Portugal”.
O pesquisador acredita que à medida que o conhecimento sobre o “fenômeno infracional aumentar, a execução de planos de prevenção e de intervenção será mais eficiente”. Para ele, é importante implementar políticas que ampliem programas de pesquisas sistemáticos para explorar os comportamentos antissociais da população juvenil brasileira.
Isso, porque “um ponto crítico na Justiça Juvenil de nosso país é a tendência em oferecer respostas indiferenciadas aos adolescentes em conflito com a Lei, sem levar em conta suas problemáticas, baseadas, na maior parte das vezes, na aferição da gravidade jurídica do ato infracional”.
Os estudos científicos na área indicam que apenas um pequeno grupo de jovens apresenta comportamento com infrações persistentes. Sabendo “distinguir corretamente esses adolescentes daqueles que cometem atos antissociais passageiros, próprios da fase do desenvolvimento, é ação crucial à orientação das políticas públicas na área”.
A pesquisa de André Vilela Komatsu foi defendida em sua dissertação de mestrado Comportamentos antissociais em adolescentes do sexo masculino: um estudo exploratório na cidade de Ribeirão Preto – SP, sob a orientação da professora Marina Rezende Bazon, Departamento de Psicologia da FFCLRP.
Rita Stella / Serviço de Comunicação Social do Campus de Ribeirão Preto
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