Estereótipo dos que relatam avistar óvnis é equivocado, revela estudo do IP

O Brasil é conhecido como um dos países em que há mais relatos de experiências com óvnis. Segundo Martins, isso pode se dever à abertura cultural maior existente sobre o tema, fruto do sincretismo cultural e religioso. Além disso, as narrativas costumam ser mais exóticas que as dos estrangeiros.

Thiago Minami / Agência USP de Notícias

O relato de contatos com alienígenas pode levar alguém a ser tachado de “louco”, “problemático” e “doente”. Um estudo feito por Leonardo Breno Martins, do Instituto de Psicologia (IP) da USP, mostra que a rotulação é, na maior parte dos casos, injustificada. Em sua pesquisa de mestrado, orientada pelo professor Wellington Zangari, traçou o perfil de uma amostra de 46 voluntários que contam experiências do tipo e concluiu que a maioria não sofre de transtornos psicológicos e psiquiátricos que poderiam causar alucinações ou tendências a fantasiar a realidade.

“Não se trata de confirmar ou negar os relatos e, sim, de mostrar que certos estereótipos não são verdadeiros”, diz Martins, que se interessa pelo assunto há 14 anos. Outro preconceito quebrado é o de que apenas aqueles com baixo nível de instrução acreditariam em contato com extraterrestes. Para participar da pesquisa, era necessário ter pelo menos o ensino médio completo, sendo que a maioria tinha concluído o ensino superior e aproxidamente um terço possuia pós-graduação.

O Brasil é conhecido como um dos países em que há mais relatos de experiências com óvnis. Segundo Martins, isso pode se dever à abertura cultural maior existente sobre o tema, fruto do sincretismo cultural e religioso. Além disso, as narrativas costumam ser mais exóticas que as dos estrangeiros. “São repletas de alegadas perseguições em locais isolados, confrontos físicos intensos e diretos com pretensos alienígenas”, escreve o pesquisador, na dissertação intitulada ’Contatos imediatos’: investigando personalidade, transtornos mentais e atribuição de causalidade em experiências subjetivas com óvnis e alienígenas. Por consequência, as supostas vítimas podem desenvolver quadros de ansiedade excessiva, por medo de passar novamente por fatos semelhantes ou de estar sendo sempre observados.

Os voluntários foram divididos em dois grupos. Enquanto as 35 pessoas do primeiro grupo relataram ter mantido uma aproximação visual, os 11 integrantes do segundo apontaram experiências mais próximas, como abdução e contato espiritualmente significativo. Desses, a maior parte – 82,9% do primeiro grupo e 90,9% do segundo – chegou à convicção absoluta sobre o que passaram. Isso só ocorreu, no entanto, após a busca por explicações triviais, como fenômenos naturais, e a dificuldade de aceitar a situação. E mesmo diante da certeza, os participantes costumam manter a postura crítica diante da explicação para o fenômeno e das experiências dos outros.

Reações

A maioria relatou sofrer reações negativas ao contar para pessoas próximas sobre o suposto ocorrido. Matins afirma que mesmo os profissionais da saúde estão despreparados para lidar com os casos. “As experiências anômalas em geral e as referentes a óvnis são parte importante da vida de muitos”, escreve. Em psicologia, o termo “anômalo” descreve experiências que fogem do usual ou do consenso cultural ou científico sobre a realidade, sem estarem relacionadas necessariamente a doenças. A falta de amparo abre brechas, por exemplo, para a ação de charlatães.

Não se trata de julgar se é verdade ou mentira e, sim, de pensar sobre os relatos. A investigação, que utilizou questionários, entrevistas e um teste psicológico, mostrou que boa parte deles fogem às narrativas construídas pela ficção. Existem pontos comuns nas descrições dos alienígenas, que normalmente têm formato semelhante ao dos seres humanos, e das naves, apontadas como “pontos de luz distantes e objetos próximos predominantemente esféricos, discóides e cilíndricos”.

A análise dos questionários revelou que a maior parte não demonstrava transtornos mentais ou tendências de personalidade, como propensões à fantasia, dificuldades em lidar com o cotidiano e busca por excitação. No entanto, muitos tinham gosto pela variação e pelo questionamento das convenções, o que poderia sugerir uma tendência ao deslumbramento ou comoção diante de temas e experiências “anormais”. Não se sabe se tais características surgiram antes ou depois da suposta experiência com óvnis.

Durante o Doutorado, Martins pretende participar de retiros organizados para promover o encontro com alienígenas. Também quer aprofundar a análise sobre as influências do contexto brasileiro nos relatos colhidos aqui.

Mais informações: email leobremartins@usp.br, com Leonardo Breno Martins 

Scroll to top