Cientistas acabam de descobrir quais são as mutações genéticas e modificações epigenéticas que caracterizam um dos tipos mais comuns de tumor cerebral, o glioma de baixo grau. Os resultados dessa pesquisa foram publicados na edição do dia 10 de junho da revista norte-americana New England Journal of Medicine e envolveu mais de 300 pesquisadores de todo o mundo, seis deles da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da USP.
Esses pesquisadores participam de um consórcio internacional para pesquisas genômicas em câncer, conhecido como “The Cancer Genome Atlas” ou TCGA, e analisaram um total de 293 casos de gliomas de baixo grau em adultos. Segundo o professor Houtan Noushmehr, do Departamento de Genética da FMRP, um dos pesquisadores do TCGA, na verdade foram estudados dois tipos de câncer cerebral: o glioma de alto grau e o glioma de baixo grau. “Trata-se de um subtipo distinto de câncer cerebral definido como difuso e pode ser caracterizado pela maior sobrevida e melhor resposta a tratamentos quando comparado ao glioma de alto grau”, adianta Noushmehr.
Nos Estados Unidos, a cada ano cerca de 23 mil pessoas adultas desenvolvem tumor cerebral e 10 mil delas apresentam gliomas. No Brasil, os gliomas representam aproximadamente 42% de todos os tipos de tumores cerebrais, malignos ou benignos. Esses tumores afetam as células gliais, responsáveis pela proteção, nutrição e suporte dos neurônios.
Noushmehr diz que “o câncer cerebral de alto grau é uma das formas mais agressivas de câncer, com uma sobrevida média global de 15 meses”. Já nos de baixo grau, a sobrevida dos pacientes é de dois a cinco anos. Entretanto, lembra, esses gliomas de baixo grau “tendem a recidivar após o tratamento e, em alguns casos, podem progredir para graus mais elevados de malignidade”.
Diagnóstico
Os achados nas análises genômicas desses tumores devem abrir novas oportunidades para melhorar as formas de tratamento. Os cientistas reclassificaram os gliomas de baixo grau em três tipos diferentes, baseados em alterações moleculares que definem diferentes padrões de sobrevida. Um dos tipos, o mais fatal, é chamado glioblastoma. Nesses casos, o paciente vive, em média, pouco mais de um ano. No caso dos pacientes do segundo tipo, a sobrevida pode passar de seis anos, e no dos com o terceiro tipo, oito anos após o diagnóstico.
Até o momento, o diagnóstico dessas doenças é feito por patologistas em análises de tecidos dos tumores em microscópio. Agora, com a “análise molecular e integração com os dados clínicos, nós podemos auxiliar os clínicos a reclassificar os indivíduos com câncer cerebral, que pode levar ao melhor diagnóstico e abrir novas oportunidades para melhorar os protocolos de tratamento”, conta o professor.
Ainda, segundo ele, esses dados moleculares ajudam os médicos a distinguir o caso específico de seu paciente e indicar uma forma mais adequada de tratamento ou então evitar terapias desnecessárias. “Nossa expectativa é que as mutações somáticas identificadas possam complementar o diagnóstico tradicional baseado apenas em critérios histopatológicos, levando a um diagnóstico e tratamento mais precisos”, revela.
O grupo de pesquisadores da FMRP foi responsável por analisar dados epigenéticos (mecanismos regulatórios da expressão gênica que não envolvem mudanças na sequência do DNA), envolvendo todos os 932 casos estudados até hoje.
O resultado, informam os pesquisadores da FMRP, alcançou “novos conhecimentos acerca das alterações epigenéticas associadas aos gliomas”. Ofereceram dados “capazes de contribuir com o diagnóstico diferencial e também protocolos de tratamento diferenciais para pacientes que apresentam uma ou mais características moleculares”.
Além do professor Noushmehr, participaram das análises no Núcleo de Apoio à Pesquisa (NAP) Centro de Biologia Sistêmica Integrativa (Cisbi) da FMRP Simon G. Coetzee – que trabalhou no laboratório de Noushmehr, mas hoje é pesquisador na Cedars-Sinai Medical School, da Universidade da Califórnia, nos Estados Unidos – e Thais Sabedot, aluna de pós-graduação do Departamento de Genética da FMRP. Além desses, outros três professores da FMRP contribuíram para essas pesquisas: Carlos Gilberto Carlotti Jr, Daniela Tirapelli e Luciano Neder Serafini.
Rita Stella / Assessoria de Comunicação da USP em Ribeirão Preto